BRASÍLIA - A amizade pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e os compromissos passados do PT com medidas de restrição ao plantio e comercialização de produtos transgênicos não foram suficientes diante dos argumentos econômicos, invocando resultados da balança comercial, apresentados pelo ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, para a decisão do governo de permitir o plantio de sementes geneticamente modificadas. O assunto divide o PT e um grupo de mais de 20 deputados federais promete votar contra a medida provisória assinada pelo presidente em exercício José Alencar.
- Tem gente aqui que nem no pau de arara vota essa medida provisória se ela liberar o plantio de sementes transgênicas. E eu sou um deles - disse o deputado João Alfredo (PT-CE), do núcleo ambientalista do partido.
Se esta decisão surpreendeu os integrantes dos núcleos agrário e ambientalista do PT, não deveria ter causado espanto à ministra. Desde que ela tomou posse no Ministério do Meio Ambiente, suas propostas vêm sendo rejeitadas pelo governo. A primeira derrota aconteceu quando o governo permitiu a importação de pneus usados, o que era duramente criticado pelos ambientalistas.
- Nem o governo Fernando Henrique foi capaz de fazer isso. O governo passado optou por empurrar o assunto com a barriga - diz um deputado do PT.
E até mesmo uma relação de projetos de interesse dos ambientalistas que ela propôs ao governo ficou fora da pauta de matérias de interesse do Palácio do Planalto no Congresso. Entre os assuntos, a votação do projeto que tramita na Câmara há 11 anos sobre a preservação da Mata Atlântica.
- A guinada conservadora do nosso governo é assustadora - comentou outro deputado, observando que o caso dos transgênicos coloca o governo Lula contra antigos aliados, como o MST, a Contag, a Comissão Pastoral da Terra, entidades de defesa do consumidor e com ambientalistas. Este deputado disse esperar que a negativa repercussão internacional da medida faça o governo Lula recuar em relação aos transgênicos.
O racha no governo quando o assunto são os produtos transgênicos ficou evidente no dia em que Marina Silva e Roberto Rodrigues foram indicados para os postos que ocupam. Rodrigues defende os transgênicos e Marina só demonstrou restrições. Mas o governo, em março, editou uma medida provisória liberando a safra de 2003, que incluía produtos geneticamente modificados. Marina tentou convencer o governo a liberar a safra apenas para exportação. Mas o ministro Roberto Rodrigues argumentou que não havia mercado externo para toda aquela produção e nem condições para o escoamento. A produção, então, foi comercializada internamente, apesar dos protestos da ministra.
Nesta ocasião, o grupo ambientalista já notava que o governo Lula havia abandonado o compromisso firmado na campanha eleitoral de impor restrições aos transgênicos. Na cartilha do programa de governo do PT está escrito que o governo petista iria "assegurar a realização de uma avaliação ambiental estratégica, além dos estudos de impacto ambiental, aferindo os impactos do eventual ingresso do Brasil no grupo de nações que praticam cultivos com sementes transgênicas, bem como a intensificação da pesquisa científica, em especial quanto a avaliações exaustivas sobre impactos toxicológicos e socioeconômicos".
- Desde as primeiras discussões, o Dirceu (ministro-chefe da Casa Civil) já recorria aos argumentos econômicos do ministro Roberto Rodrigues - lamentou o petista.
Em agosto deste ano, representantes dos núcleos agrário e ambientalista do PT procuraram o ministro Roberto Rodrigues para falar da lei de biotecnologia, e dele ouviu a defesa dos transgênicos e também o compromisso de o governo fazer uma campanha junto aos agricultores para que eles evitassem o uso de sementes transgênicas. Ao mesmo tempo, o governo se comprometeria a fornecer a semente convencional aos interessados no plantio. Isso não aconteceu e chegou o tempo do plantio, o que exigiu esta medida provisória do governo.
Para os ambientalistas do PT, além dos argumentos econômicos apresentados pelo ministro Roberto Rodrigues, pode ter colaborado para que o governo Lula aprovasse o uso de transgênicos uma questão política: ganhar o apoio da chamada bancada ruralista na votação das reformas. Eles argumentam que a bancada gaúcha, por exemplo, votou maciçamente contra a reforma da Previdência. Mas, depois de iniciadas as conversas sobre os transgênicos, a bancada votou a favor da reforma tributária.
Para os ambientalistas, foi a reação da bancada ruralista que impediu que o projeto sobre preservação da Mata Atlântica fosse incluído na pauta da convocação extraordinária do Congresso, em julho. Afinal, a prioridade do governo era votar as reformas e, para isso, os votos dos ruralistas eram fundamentais.
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