BUENOS AIRES — O antigo tribunal do Santo Ofício censurou o último livro do teólogo espanhol Marciano Vidal por seu olhar compreensivo a respeito da homossexualidade. A agora chamada Congregação para a Doutrina da Fé já havia repreendido o sacerdote redentorista em 2001 devido a diversas partes de sua obra em que supostamente justificava a homossexualidade, a masturbação, a contracepção, a inseminação artificial e a liberação judicial do aborto. O último livro de Vidal foi editado no Brasil e na Argentina, mas, até o momento, foi proibido apenas na Argentina — de onde partiu a denúncia ao Vaticano. Vidal sustenta que a doutrina da Igreja sobre a homossexualidade mudou ao longo do tempo e que não é um dogma.
Em novembro de 2011, o cardeal americano William Levada — sucessor do alemão Joseph Ratzinger no cargo de prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé — escreveu uma carta ao superior geral da Sociedade São Paulo, uma das principais editoras católicas do mundo. Na mensagem, ele pedia que a filial argentina retirasse das livrarias “Sexualidade e condição homossexual na moral cristã”, de Vidal, assim como outro livro intitulado “Casais e sexualidade na comunidade de Corinto”, do pastor argentino Pablo Manuel Ferrer. Ambos foram editados em 2010. Levada somente usou o argumento de que os considerava “contrários à doutrina da Igreja sobre a sexualidade”. Também pediu que os retirassem do catálogo de publicações e que deixassem de fazer sua publicidade.
Vidal, nascido em León no ano de 1937, vive em Madri e leciona no Instituto Superior de Ciências Morais dos Redentoristas e na Pontíficia Universidade de Comillas. O jornal “El País” entrou em contato, mas o sacerdote se limitou a recomendar uma consulta à editora.
— Eu tenho que acatar a decisão (de Levada), tenho que apoiá-la — disse o diretor editorial de São Paulo, na Argentina, o sacerdote Aderico Dolzani. — Fica-se perplexo com estas decisões.
Dolzani não sabe qual conteúdo do livro o Vaticano considerou contrário à doutrina da Igreja sobre sexualidade.
— Outras vezes dizem quais partes não estão corretas, mas não neste caso. O argumento é genérico, nada preciso. Não sei quem vai me apresentar o motivo da decisão, mas estou aguardando — explicou o diretor editorial. — Não encontrei pontos estridentes. É uma análise de documentos da Igreja sobre a sexualidade. Não é um livro de texto sem interpretação e aplicado à atualidade. Mostra que há dissonâncias entre esses textos, que vão mudando com o tempo, mas isso é normal em toda a pesquisa sobre uma sociedade que se transforma. O livro cumpria todos os requisitos, e já circula no Brasil há três anos. Marciano Vidal é conhecido em todo o mundo, seus textos são usados em todas as faculdades e seminários.
Diferente do que aconteceu na Argentina, a editora brasileira Santuário, dos redentoristas, não recebeu nenhuma ordem de Roma de censurar "Sexualidade e condição homossexual na moral cristã". Seu diretor, Marcelo Araújo, disse que não tem a intenção de retirá-lo das prateleiras.
Na Argentina, os livros de Vidal e Ferrer foram anunciados entre abril e maio em um jornal dominical distribuído nas missas em todo o país. A partir daí, alguém denunciou as obras ao Vaticano.
— O incômodo não foi sobre o que o livro dizia, mas o tema em si. Aqui, certas pessoas de determinado tipo de pensamento ficaram incomodadas — avalia Dolzani.
Vidal já tinha sido repreendido por Ratzinger em 2001 por diversas obras de sua autoria. Naqueles textos, o sacerdote espanhol dizia que, diante da homossexualidade “irreversível”, a atitude cristã “não passa necessariamente pela única saída de uma moral rígida da heterossexualidade para a abstinência total”. Dolzani admite que essa posição “pode ser desprendida” do último livro censurado. O homem que depois se tornaria o atual Papa Bento XVI ordenou, há 11 anos, que deixassem de formar sacerdotes com os livros da cura redentorista e sugeriu que Vidal reeditasse um de seus principais livros, “Moral de atitudes”, mas sob a tutela da Confederação Episcopal Espanhola. O autor aceitou em silêncio o castigo, mas não reescreveu a obra.
O outro livro censurado, do pastor Ferrer, fazia parte de uma coleção ecumênica, em que escreviam teólogos de outras igrejas cristãs. Na obra, Ferrer era favorável a aceitação de diversos modelos de família.
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