SÃO LUÍS - Em entrevista ao programa Atualidades desta sexta-feira (23), a influenciadora digital, bacharel em Direito e pós-graduanda em Ciências Humanas, Aila, e o advogado especialista em Tributação e Negócios, Fernando Linhares, comentaram as principais discussões sobre a regulamentação da atividade de influenciadores digitais na divulgação de jogos da sorte, tema que voltou ao centro das discussões nos últimos dias.
“Eu penso que estamos vivendo uma nova era. Existe a vida real e existe a vida digital, e a legislação precisa acompanhar isso. Principalmente a profissão de influenciador digital, que já não é tão nova, precisa de uma regulamentação além do que já existe, porque há uma responsabilidade muito grande. E acho que, às vezes, é importante, sim, vilanizar, porque, por muito tempo, isso foi normalizado — principalmente pelo histórico que o Brasil tem com o jogo do bicho. E acredito que vai além da escolha. A psicologia já estuda isso e considera uma doença, um vício equivalente às drogas”, destacou Aila.
A crescente preocupação com práticas de publicidade abusiva, capazes de estimular comportamentos de risco, levou à criação de medidas restritivas e à formulação de projetos de lei para limitar a exposição do público a esse tipo de conteúdo. Em 2024, o Ministério da Fazenda publicou a Portaria SPA/MF nº 1.231, que estabelece diretrizes para ações de marketing no setor. A partir dessa regulamentação, as operadoras passaram a ser responsabilizadas por eventuais abusos publicitários.
“A divulgação pode ser feita, mas precisa seguir determinados critérios. Por exemplo, a publicidade não pode ser enganosa. De uns tempos para cá, os influenciadores vêm colocando um aviso indicando que se trata de publicidade. Mas o grande problema hoje é justamente essa publicidade enganosa e abusiva”, alertou Fernando Linhares.
Assista
O advogado Fernando Linhares também é autor de um artigo que analisa a CPI das Bets e aborda a relação entre os jogos de sorte e os interesses econômicos por trás da divulgação.
Confira na íntegra.
CPI das Bets: Entre o Jogo da Sorte e o Jogo de Interesses
A instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Bets pelo Senado Federal em novembro de 2024 marcou um ponto de inflexão no debate sobre a regulamentação das apostas esportivas no Brasil. Composta por 11 senadores titulares e 7 suplentes, a CPI foi criada com o objetivo de investigar a crescente influência das plataformas de apostas online sobre o orçamento das famílias brasileiras, suas possíveis conexões com organizações criminosas e, ainda, o papel desempenhado por influenciadores digitais na promoção dessas atividades. Nesse contexto, é importante destacar que a legalização das apostas esportivas de quota fixa no país remonta à promulgação da Lei nº 13.756/2018, a qual autorizou essa modalidade lotérica e estabeleceu que os apostadores poderiam conhecer previamente os valores a serem recebidos em caso de acerto. No entanto, apenas em 2023 foi sancionada a Lei nº 14.790, que efetivamente regulamentou a operação dessas apostas no Brasil. Essa norma atribuiu ao Ministério da Fazenda a competência para fiscalizar o setor, o que resultou, em 2024, na criação da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA-MF), órgão responsável por estabelecer critérios técnicos e de compliance para as empresas atuantes nesse mercado.
Convém, a essa altura, distinguir juridicamente as apostas esportivas dos jogos de azar tradicionais. Enquanto as primeiras pressupõem um grau mínimo de análise e conhecimento sobre eventos esportivos – tratando-se, portanto, de previsões baseadas em estatísticas e informações disponíveis ao público – os jogos de azar, como bingos, roletas e caça-níqueis, dependem exclusivamente da sorte, sendo considerados ilegais no ordenamento jurídico brasileiro. Essa diferenciação é relevante não apenas do ponto de vista normativo, mas também para a formulação de políticas públicas voltadas ao controle e à fiscalização dessas práticas.
Além dos aspectos legais, a CPI também chamou atenção para os crescentes indícios de manipulação de resultados esportivos. De acordo com dados divulgados ao longo das investigações2 , em 2024 foram identificadas 57 partidas suspeitas de fraude, número que, embora represente uma redução de quase 50% em relação ao ano anterior, continua a suscitar preocupações quanto à integridade das competições. Tais casos revelam a urgência da implementação de mecanismos preventivos mais eficazes, inclusive com cooperação internacional, dada a atuação transnacional de muitas plataformas de apostas.
Paralelamente, a atuação de influenciadores digitais na promoção desses sites também vem sendo objeto de escrutínio. Durante os trabalhos da CPI, figuras públicas com grande alcance nas redes sociais, como a influenciadora Virgínia Fonseca, prestaram depoimento sobre sua relação com as plataformas. Apesar de suas alegações de desconhecimento quanto ao impacto das apostas nos seguidores, o conteúdo publicitário veiculado nas redes sociais sugere uma exposição significativa de públicos vulneráveis, incluindo adolescentes, ao risco de dependência e prejuízo financeiro.
Por conseguinte, torna-se imprescindível discutir a responsabilidade civil desses influenciadores à luz do Código de Defesa do Consumidor. Considerando que muitos deles atuam como verdadeiros intermediários comerciais ao promover serviços e plataformas de apostas, é razoável defender que suas condutas se enquadram nas práticas reguladas pelo CDC, sobretudo no que tange à publicidade enganosa ou abusiva. Isso reforça a necessidade de que esses agentes tenham ciência das obrigações legais decorrentes de sua atuação no ambiente digital.
Ademais, deve-se observar a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) no contexto das apostas esportivas online. As operadoras que coletam, tratam e armazenam dados pessoais dos usuários – incluindo informações bancárias e hábitos de consumo – devem cumprir rigorosamente os princípios de finalidade, necessidade, transparência e segurança. A omissão nesse cumprimento pode configurar infração administrativa, com sanções previstas na própria legislação.
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