Das 13 faixas do disco É tempo de amar, de Zé Renato, 11 têm a palavra “você”. A constatação foi feita após o cantor falar do recado direto, na veia, contido nas canções da Jovem Guarda, alvo de sua pesquisa musical. Morando há dois anos em São Paulo, ele diz que a estranheza que pode causar o fato de um cantor reconhecidamente sofisticado se dedicar a um gênero popular, tachado, desde a sua origem, de subproduto, não é novidade em sua vida.
“A estranheza se dá por não ligarem este repertório à minha pessoa. Quando gravei Sílvio Caldas e Zé Kéti, o sentimento foi parecido. Eu vinha do Boca Livre, e pouca gente fazia essa conexão. Mas tudo isso faz parte do meu pacote. As serestas, os sambas, a coisa mineira do Clube da Esquina que se manifestou no Boca... A Jovem Guarda também está na minha vida”, conta.
A idéia do projeto surgiu por acaso. Uma tarde, Zé Renato e a atriz Patrícia Pillar foram à casa do jornalista, produtor e escritor Nelson Motta mostrar uma versão de um clássico da Jovem Guarda, O tempo vai apagar, de Paulo Cezar Barros e Getúlio Cortes, que seria o tema da vilã Flora, vivida por Patrícia em A favorita. Motta achou a música linda, “sofisticada e simples ao mesmo tempo”. O cantor disse que estava pensando em fazer um novo disco e pediu sugestões. O produtor disse que Zé Renato deveria fazer um disco inteiro, com o tratamento instrumental e vocal que lhe é peculiar, dedicado a canções do movimento.
“O Nelson falou muito sobre a Jovem Guarda e foi decisivo. Mas a idéia já vinha me rondando há algum tempo. Há quatro anos, eu participei de um projeto, no antigo Sesc Pinheiros, em São Paulo, em que cada artista fazia um show sobre seu estado natal. Eu, capixaba, cantei várias do Roberto Carlos. No início deste ano, participei de um outro projeto sobre Roberto”, lembra.
MEMÓRIAS
Mas a raiz está mesmo em suas memórias adolescentes. “Ouvia o início das músicas e já me lembrava do resto. Tinha uma intimidade com o repertório maior do que eu imaginava. Baixou em mim o período de férias no Espírito Santo, as reuniões com os amigos de prédio em Copacabana...”
O violão, hoje bem mais papo-firme do que em seus tempos de iê-iê-iê, foi decisivo no encontro com o produtor Dé Palmeira. “Eu conhecia o Dé do Barão Vermelho, da parceria com Cazuza e Bebel Gilberto, do trabalho com a Adriana (Calcanhotto). Mas, por conta de um amigo comum, o jornalista Hugo Sukman, nos encontramos na arquibancada do Maracanã em uns jogos do Botafogo”, conta.
“Quando veio essa história do disco, pensei nele, já que queria misturar as minhas referências com o universo pop. No primeiro encontro, quando mostrei algumas coisas, ele disse: ‘O disco tem que ser baseado no seu violão’. Era o que eu queria ouvir”. Com o produtor, vieram os músicos e os convidados especiais do disco. “Tudo o que eu tinha imaginado para o CD aconteceu. Ele me sugeriu músicos novos como (o guitarrista) Ricardo Palmeira, seu Dé, o tecladista Roberto Pollo...”
O Marcos Valle foi um encontro especial, além da Nina Becker, da Orquestra Imperial, que cantou “Eu não sabia que você existia”: “Ela foi uma gracinha, tem um jeito suave de cantar. Meio contido, mas com timbre, personalidade. O arranjo de Jaques Morelenbaum também é lindo. Quis prestar uma homenagem a Leno e Lílian, que têm várias canções maravilhosas”.
Quando a Garota de Ipanema caiu no iê-iê-iê Certa vez, em 1967, convidado por Leon Hirszman para fazer uma música no estilo das da Jovem Guarda para o filme Garota de Ipanema, Vinicius de Moraes, que gostava de um desafio, não titubeou. Cantada por Ronnie Von em meio a uma roda de bossa nova, ela era, ao mesmo tempo, uma música típica do movimento e um deboche com a turma de Roberto Carlos, Erasmo, Renato e Seus Blue Caps e companhia. Na letra, um punhado de expressões da época, como “pra frente”, “barra limpa” e “papo firme”.
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