Economia

Economistas concordam sobre necessidade da reforma orçamentária

José Paulo Tupynambá/Agência Senado

Atualizada em 27/03/2022 às 12h04

BRASÍLIA - A necessidade de uma reforma orçamentária foi a principal conclusão da audiência pública da Subcomissão Permanente para tratar dos Temas Estruturais e de Longo Prazo da Economia Brasileira, vinculada à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Para o ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e professor da Fundação Getúlio Vargas, Fernando Antonio Rezende Silva, o orçamento federal “sofre de forte miopia” e, em vez de olhar para a frente, “olha pra trás”.

Para Fernando Rezende, o orçamento federal, nos termos em que atualmente é elaborado, sofre com rigidez na alocação de verbas e desequilíbrios nas diversas demandas por recursos. Essa rigidez e esses desequilíbrios, na opinião do economista, não deixam espaço para investimentos ou para que a execução orçamentária se adapte a mudanças necessárias.

- O orçamento tem de ter flexibilidade. É preciso rever periodicamente as escolhas – afirmou o ex-presidente do Ipea.

Para Fernando Rezende, a forma de se elaborar o orçamento brasileiro colocou o país em “uma armadilha de baixo crescimento”. De acordo com o especialista, 91% dos recursos já têm sua alocação previamente decidida, restando aos Congressistas deliberarem sobre os 9% restantes, o que inviabiliza a alocação de novos investimentos. Além disso, o governo, para administrar a escassez, represa as despesas, que se acumula nos chamados “restos a pagar”: a despesa é empenhada, mas seu pagamento não é liberado naquele ano.

- Mas como, se o gasto é obrigatório? Simples: no orçamento, o que vale é o que foi empenhado, não o que foi pago – explicou o economista.

Pendurados

Já o ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento, economista Raul Velloso, afirmou que 73,6% do orçamento federal equivalem a “uma grande folha de pagamento”, uma vez que são despesas pagas a pessoas, desde salários de ativos e inativos até a bolsa-família. Como 8,2% se referem a despesas com saúde, cabe ao Congresso deliberar sobre os restantes 18,2% do orçamento federal.

De acordo com o economista, são 49,2 milhões de pessoas “penduradas no orçamento da União”. Esses pagamentos a pessoas foram criados pela Constituição de 1988, que, por exemplo, concedeu a aposentadoria para os trabalhadores rurais. Em 1987, a “grande folha de pagamento” consumia 39% do orçamento, passando a 77% em 2009 e caindo para 76,3% no ano passado.

De acordo com Raul Velloso, caso não sejam feitas reformas como idade mínima de 60 anos para a aposentadoria no Regime Geral de Previdência; redução no pagamento de pensão por morte; e limitações no aumento dos gastos dos três poderes, as despesas com a “grande folha” poderão passar de 14,1% do Produto Interno Bruto (PIB), no ano passado, para 29,2% do PIB, em 2040.

O presidente da subcomissão, senador Cristovam Buarque (PDT-DF), elogiou a frase de Fernando Rezende, de que o orçamento “olha pra trás”. Cristovam disse que o orçamento serve para pagar aquilo que já foi feito, como aposentadorias e outros, mas se esquece de garantir uma vida melhor para as crianças, que são o futuro.

Penúltimo lugar

O diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea, Cláudio Hamilton Matos dos Santos, afirmou que o Brasil gasta um percentual do PIB com saúde e educação semelhante a de outros países que integram a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Mas, se forem computados os gastos per capita nesses setores, o país ocupa a penúltima posição em ambos os casos, entre os 34 países integrantes da Organização.

Cláudio Hamilton sugeriu a adoção de orçamentos plurianuais, como na Inglaterra, para evitar os restos a pagar. Outra recomendação do economista foi retirar da meta de superávit primário os investimentos públicos, que são indutores do desenvolvimento.

Raul Velloso alertou ainda para o que chamou de “grande chaga da infraestrutura”. Citou dados do Fórum Econômico Mundial segundo os quais, entre 144 países, o Brasil está em 135º lugar em relação à qualidade dos portos; 134º lugar na qualidade do transporte aéreo; 123º lugar na qualidade das estradas; e 100º lugar em relação às ferrovias. Como consequência da péssima infraestrutura brasileira, citou o preço do frete por tonelada entre o Mato Grosso e o porto de Santos: passou de R$ 195 no ano passado para R$ 320 este ano.

Cristovam Buarque afirmou que somente uma vez participou da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO). Ao ver os limites da Comissão, não quis mais participar, preferindo apresentar um requerimento para a criação da subcomissão. Para o senador, o país caminha para a inviabilidade fiscal e financeira.

O vice-presidente da Subcomissão, senador Eduardo Suplicy (PT-SP), relatou a história da renda mínima paga aos cidadãos do estado americano do Alaska, o que resultou no menor índice de desigualdade entre todos os estados americanos. Suplicy indagou aos participantes sobre a necessidade do orçamento impositivo. Fernando Rezende e Raul Velloso responderam que o orçamento já é tão amarrado que a obrigatoriedade de sua aplicação é positiva, uma vez que irá forjar a discussão sobre o que a sociedade quer do orçamento e de seu processo de elaboração. Os três depoentes também alertaram sobre a necessidade de se tornar a transparência da execução orçamentária acessível à população, traduzindo o que os números apresentados nos sites dos governos federal, estaduais e municipais significam.

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