Celebração

Imprensa maranhense: 200 anos de história

Em 15 de abril de 1821, foi impresso o primeiro jornal maranhense, O Conciliador do Maranhão, considerado um marco inicial da imprensa do estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h16
Edição de O Conciliador do Maranhão
Edição de O Conciliador do Maranhão

São Luís - Em 2021, celebram-se 200 anos da imprensa no Maranhão, marco que impressiona pela longevidade, superando até mesmo os dois séculos de Independência do Brasil, que só serão completados em 2022. Em 15 de abril de 1821, foi impresso o primeiro jornal maranhense, O Conciliador do Maranhão, idealizado pelo então governador Pinto da Fonseca, que nomeou como redatores seu oficial de Secretaria de Governo, Antônio Marques da Costa Soares, e o padre José Antônio Ferreira da Cruz Tezinho, que tinha boa circulação no meio político.

O periódico recebeu esse nome não à toa, pois os seus criadores, portugueses de nascença, apoiavam a Revolução Liberal do Porto de 1820, em Portugal. Em 6 de abril de 1821, o Maranhão aderiu à Revolução por meio do governador Pinto da Fonseca, que, rapidamente, lançou O Conciliador do Maranhão. “Qual é o formato da adesão? Não há ainda uma regulamentação, é um momento revolucionário. No caso do Maranhão, a adesão se dá em 6 de abril, e, quinze dias depois, tem um jornal circulando, uma ideia de Pinto da Fonseca para tentar ter o controle dos acontecimentos, para deter a palavra”, afirma Marcelo Cheche, professor da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA) e coordenador do Núcleo de Estudos do Maranhão Oitocentista (Nemo).

A ideia inicial do jornal era explanar aos leitores maranhenses sobre as até então desconhecidas ideias constitucionais da revolução portuguesa. “A partir daí, quando se tem a ideia de revolução, abre-se a caixa de Pandora. As primeiras edições são muito pedagógicas, explicando o que é constituição e o que é democracia. Nos jornais, circulavam notícias sobre revoluções que ocorriam em outros estados brasileiros, para dizer que o Maranhão tinha paz, e isso servia para manter a ordem no estado”, acrescentou Cheche.

As primeiras 34 tiragens do jornal foram produzidas, primeiramente, por meio de uma técnica chamada tipo caligrafia, em cópias rudimentares de uma versão manuscrita que era feita pela dupla de redatores. A ampliação da quantidade de cópias só foi possível a partir da chegada da tipografia em novembro de 1821, uma máquina que permitia aos usuários produzir vários exemplares prensando letras no papel, utilizada também na produção de livros.

Curiosamente, com o novo aparelho, os redatores imprimiram as edições de 1 a 8 primeiramente, mas, devido a diversas reclamações dos assinantes — sim, eles já tinham criado um sistema de assinaturas bem organizado, mesmo antes da chegada da tipografia ao Maranhão — resolveram prosseguir com o número 35 do jornal após a impressão da edição de número 8.

Com a Revolução do Porto de 1820 e a Independência do Brasil começando a ser desenhada, a panela política brasileira começou a ferver, e é claro que a oposição ao constitucionalismo queria ter voz por meio da impressão de jornais também. O problema é que a Tipografia Nacional Maranhense, localizada na Rua do Norte, em São Luís, era administrada pelo Governo, por meio de Costa Soares e do padre Tezinho.
Em fevereiro de 1822, o médico Manoel Rodrigues de Oliveira tentou publicar um jornal opositor, o Gazeta da Verdade, porém a publicação foi dificultada, mas, em seguida, ele propôs a Folha Medicinal do Maranhão, que circulou de março a maio daquele ano. Na mesma época, também surgiu A Palmatória Semanal, que seria publicada dentro de O Conciliador para rebater as críticas publicadas na Folha Medicinal.

O jornal nasceu como O Conciliador do Maranhão, mas ficou com o nome reduzido para O Conciliador a partir da edição 77; o periódico tinha uma lista bem organizada de assinantes, com nome, profissão e localização da residência do cliente; contabilizou mais de 600 assinaturas em seus registros e era distribuído apenas para os assinantes, mas, após o início do uso da tipografia, passou a ter vendas avulsas ao preço de 100 réis, o que era um valor bem acessível, segundo Cheche; foi publicado por pouco mais de dois anos; e chegou a ter circulação no Pará e até um assinante de Liverpool, na Inglaterra.

Representação dos costumes ludovicenses da época
Representação dos costumes ludovicenses da época

O legado
O Conciliador e os jornais seguintes do século XIX tinham uma característica em comum: falavam 100% de política, segundo o professor Roni Araújo, do Curso de Licenciatura em Ciências Humanas do Câmpus de Grajaú da Universidade Federal do Maranhão e também membro do Nemo.

Ele citou que até a religião defendia o posicionamento político, um exemplo é o padre Tezinho, apontado pelas pesquisas como um dos redatores do veículo, possuía um posicionamento claro no jornal O Conciliador, pois algumas vezes o periódico publicou seus sermões proferidos nas missas— até de fora do estado — que mantinham e defendiam os laços com Portugal. O clérigo foi até mesmo eleito deputado estadual no Maranhão, mas retornou a Portugal, e o jornal ficou sob a responsabilidade apenas de Costa Soares.

“Os clérigos exerciam uma influência dentro da estrutura social. Temos, inclusive, estudo sobre a atuação dos clérigos nas movimentações, revoluções. O Conciliador mencionava e defendia alguns padres. O jornalismo tinha função combatente e pedagógica, os padres tinham caráter de professores”, afirmou Araújo, mencionando a importante atuação pedagógica do Padre Tezinho nos primórdios de O Conciliador do Maranhão.

Com a ebulição da política brasileira em 1822, surgiram dois jornais na sequência, nos anos seguintes: Argos da Lei, primeiro jornal escrito por um nascido no Maranhão, Odorico Mendes, impresso pela Tipografia Nacional do Maranhão; e O Sensor, que realizava oposição e defendia os ideais constitucionais da Revolução do Porto e era publicado na Tipografia Melandiana, um novo local de impressão na capital maranhense.

“Os jornais tinham uma influência muito forte. A partir de 1820, começou o posicionamento político no Brasil, e os jornais traziam as discussões de caráter privado para a praça pública. As pessoas passaram ter acesso a discussões que não passavam de modo algum por eles, pensar sobre constituição e democracia, mesmo que falando mal, temas que a imprensa ‘pedagógica’ fazia chegar ao povo. As pessoas puderam ter acesso a essas discussões”, acrescenta o docente.

Desenvolvimento
Em estudos feitos pela professora Roseane Pinheiro, do curso de Jornalismo do Câmpus Imperatriz da UFMA, a docente percebeu que, em vários momentos, o desenvolvimento estrutural e econômico do estado era acompanhado pela evolução técnica e tecnológica dos jornais que foram produzidos a partir do final do século XIX e início do século XX. Fotografias, charges e até a inserção de cores começaram a aparecer nos jornais maranhenses nessa época.

Já no início dos anos de 1900, novas segmentações surgiam como mais jornais não apenas de cunho político, mas também de sindicatos, de igrejas e de outros grupos sociais. Assuntos do cotidiano passaram a ter cada vez mais espaço, ao lado dos cadernos de política. O jornalismo tinha na época um espaço bastante relevante na sociedade, conforme destaca a professora: “Se a cidade cresce, mais grupos querem ter voz, e isso é pela imprensa. Mais vozes querem participar dos debates”, acrescentou.

A docente também enfatiza que o surgimento do rádio no Maranhão, em 1919, e da TV, nos anos de 1950, proporcionaram mudanças nas técnicas de escrita e reprodução dos textos mutuamente, junto com os jornais. Ela pontua que, ao longo do tempo, os impressos também acompanharam o avanço social, político e econômico nas diversas outras regiões do estado, com criação de novos jornais: O Alavanca, de Viana, datado de 1876; e O Telégrafo, de Caxias, com registros de números em 1848, por exemplo.
Roseane Pinheiro também realçou a importância dos jornais para a conservação da história e dos fatos do Maranhão: “No jornalismo, o que é lido hoje fica para o futuro. Quando vemos hoje os documentários, vemos que não há limite para o tempo da notícia. As mídias são lugares de memória”. l

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