Judiciário

Toffoli adia aplicação do juiz de garantias por 180 dias

Medida foi aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em dezembro. Ações no STF questionam, entre outros pontos, o prazo de implementação da nova regra

Atualizada em 11/10/2022 às 12h21
Ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo,  adia implantação do juiz de garantias por seis meses
Ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo, adia implantação do juiz de garantias por seis meses (Divulgação)

BRASÍLIA - O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, suspendeu ontem,15, a aplicação do chamado juiz de garantias por 180 dias. Toffoli concedeu uma decisão liminar (provisória) em ações que questionam a medida, atendendo parcialmente aos pedidos. O STF ainda vai julgar, no plenário, o mérito das ações.

A criação da figura do juiz de garantias foi incluída pelos parlamentares no pacote anticrime aprovado pelo Congresso Nacional no fim do ano passado. Com a determinação de Toffoli, as regras para o juiz de garantias não serão aplicadas a partir de 23 de janeiro, quando outros pontos da nova legislação entram em vigor.

Essas regras valem até que o tema seja analisado em plenário – os ministros podem manter ou derrubar cada ponto. Toffoli afirmou nesta quarta que o tema será pautado assim que as ações forem liberadas pelo relator original, ministro Luiz Fux, que está em recesso.

Ao anunciar a decisão, Toffoli disse que identificou urgência para decidir sobre as três ações, já que a lei entrará em vigor antes do retorno do recesso do Judiciário. Segundo Toffoli, o juiz de garantias veio para "reforçar a garantia da imparcialidade" e, na visão dele, "não demanda criação de novos cargos."

O presidente do STF concordou, no entanto, com o argumento de que o prazo de 30 dias para implementar as mudanças seria insuficiente. Com base nisso, suspendeu a aplicação do juiz de garantias por 180 dias – o prazo começa a contar quando a decisão for publicada oficialmente.

"A implementação do juiz de garantias demanda organização que deve ser implementada de maneira consciente em todo o território nacional, respeitando-se a autonomia e as especificidades de cada tribunal", disse Toffoli.

"Impõe-se a fixação de um regime de transição mais adequado e razoável, que viabilize, inclusive, sua adoção de forma progressiva e programada pelos Tribunais", declarou.

A decisão provisória de Toffoli também estabelece que a lei é prospectiva, e não retroativa. Isso significa que, nos processos em andamento, não será preciso redistribuir os documentos a novos juízes.

Quando o prazo de 180 dias acabar, segundo a decisão, as ações penais que já tiverem sido instauradas seguirão nas mãos do juízo competente. "O fato de o juiz da causa ter atuado na fase investigativa não implicará seu automático impedimento", diz a decisão.

Já para as investigações em curso, Toffoli definiu que "o juiz da investigação tornar-se-á o juiz das garantias do caso específico". Ou seja, também não será necessário designar um novo juiz de garantias para assumir o caso.

Com a decisão, o grupo de trabalho criado no CNJ também foi prorrogado e terá até o dia 29 de fevereiro para encaminhar uma proposta para deliberação do conselho.

A prorrogação do debate no CNJ já tinha sido antecipada pelo blog do Matheus Leitão, na semana passada. Até esta quarta, o colegiado já tinha recebido 111 sugestões.

Juiz de garantias

Na prática, o juiz de garantias vai atuar na fase de investigação de crimes, quando forem necessárias decisões judiciais em relação a pedidos de quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico; mandados de busca e apreensão; prisão temporária, preventiva ou medida cautelar.

A atuação do juiz de garantias abrange todas as infrações penais, exceto crimes de menor potencial ofensivo (com penas de até dois anos) e contravenções penais. E é encerrada com o recebimento da proposta de ação penal (denúncia ou queixa). Outro magistrado vai tratar do processo após a ação penal, até a sentença.

Assim que a nova lei foi publicada no "Diário Oficial da União" em 24 de dezembro de 2019, associações de magistrados e juízes, como a Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) e a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), indicaram as dificuldades operacionais de implementar a criação do juiz de garantias em um prazo de 30 dias.

As duas associações, juntas, apresentaram ao STF uma ação direta de inconstitucionalidade contestando a proposta. Outras duas ações também foram apresentadas: uma pelos partidos Podemos e Cidadania; e outra pelo PSL (veja abaixo os argumentos apresentados nas três ações).

Dias depois da publicação da nova legislação, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou um grupo de trabalho para analisar formas de implementar a figura do juiz de garantias e abriu consulta pública para receber sugestões sobre o tema.

Na primeira reunião do grupo, no começo do mês, o presidente do CNJ e do STF, ministro Dias Toffoli declarou que a criação do juiz de garantias visa maior imparcialidade nos processos do país e não gerará aumento de custos e trabalho ao Judiciário.

"O juiz vai julgar com maior imparcialidade. Não é juiz a favor do investigado", afirmou o ministro na ocasião.

A Procuradoria Geral da República (PGR) sugeriu ao grupo de trabalho que a implantação da medida seja feita por etapas, e que o mecanismo não seja utilizado em processos penais no STF e Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O MPF também defendeu que não haja juiz de garantias em processos no tribunal do júri (que julga crimes dolosos contra a vida) e em processos relacionados à Lei Maria da Penha.

Ações no STF

Veja abaixo os argumentos apresentados ao STF nas três ações que questionam a figura do juiz de garantias.

Ação da AMB e Ajufe – as associações de juízes e magistrados pediram que o STF declare a medida inconstitucional, as entidades solicitam a suspensão da criação do juiz das garantias.

Ação do Podemos e do Cidadania – os partidos apresentaram ação no STF no dia 28 de dezembro. Segundo as siglas, o Judiciário é quem deve disciplinar alterações em sua estrutura e organização. Além disso, dizem que não houve estudos sobre os recursos necessários à implantação da mudança.

Ação do PSL – o partido considera que a criação do juiz de garantias viola o pacto federativo e a autonomia administrativa e financeira do Judiciário, por impor aos tribunais e aos estados obrigações orçamentárias novas sem consulta prévia.

Mais

Conforme a decisão de Toffoli:

- a aplicação do juiz de garantias fica suspensa por 180 dias;
- o juiz não será aplicado em processos que já estejam em curso, ao fim desse prazo;
- o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) prorrogará os debates sobre o tema até 29 de fevereiro.

O juiz de garantias não valerá para:

- processos de competência originária dos tribunais superiores (como STJ e STF) e tribunais de Estados e do Distrito Federal;
- processos de competência do Tribunal do Júri, em que a decisão já é colegiada;
- casos de violência doméstica e familiar – que, segundo a decisão, demandam um "procedimento mais dinâmico";
- processos criminais de competência da Justiça Eleitoral.

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