Roubando Vidas

Mais de 110 minicracolândias reúnem dependentes na Grande São Luís

Homens, mulheres e adolescentes se aglomeram em calçadas, becos e áreas abandonadas para consumirem drogas em plena luz do dia; trabalho de recuperação dos usuários é um desafio

Ismael Araújo / O Estado do MA

Atualizada em 11/10/2022 às 12h24
Usuários reunidos durante o dia na área do Mercado Central
Usuários reunidos durante o dia na área do Mercado Central

SÃO LUÍS - “Sinto a necessidade de queimar todos os dias essa maldita pedra e também não consigo deixar de frequentar esse local”, desabafou um dos frequentadores da cracolândia do Mercado Central de São Luís e usuário de entorpecente. Uma pesquisa realizada recentemente pela Universidade Federal de São Paulo apontou que no Brasil há um grande número de consumidores de crack. Na Grande Ilha, o consumo de entorpecente também é um problema agravante. Dados da Rede Maranhense de Diálogos Sobre Drogas (Remadd) revelaram que existem mais de 110 minicracolândias na Região Metropolitana de São Luís. Em 90% dos bairros há “bocas de fumo”.

Usuário consome droga na cracolândia da feira do João Paulo
Usuário consome droga na cracolândia da feira do João Paulo

No Mercado Central, na área do centro da capital maranhense, é possível observar vários dependentes químicos. São homens, mulheres e adolescentes. Em plena luz do dia, eles se aglomeram pelas calçadas ou cantos para usarem drogas. Sem nenhum tipo de pudor, eles fazem o cigarro de maconha ou acedem o cachimbo de crack. A droga é passada de mão em mão. Muitos dos usuários não se intimidam em consumirem ou venderem o entorpecente mesmo com a presença da polícia fazendo rondas no local.

Usuário já drogado usa espaço da Fonte das Pedras para dormir
Usuário já drogado usa espaço da Fonte das Pedras para dormir

Uma das comerciantes da área, declarou que a presença dos dependentes químicos é antiga, mas aumentou um pouco mais nos últimos anos. Isso não deixa de afetar o comércio local, já que a presença deles intimida os clientes. “Os clientes ficam com receio de frequentarem o mercado e com isso, as vendas acabam caindo de uma certa forma”, disse a vendedora.

Encontro de usuários durante o dia na cracolândia do Desterro
Encontro de usuários durante o dia na cracolândia do Desterro
“Sinto a necessidade de queimar todos os dias essa maldita pedra e também não consigo deixar de frequentar esse local”Usuário de droga não identificado
Cracolândia maranhense

O cenário também é o mesmo na Avenida Projetada, nas proximidades da feira do bairro do João Paulo. Este local ficou denominado como “cracolândia maranhense”. A qualquer hora do dia é possível ver pessoas consumindo entorpecente. Muita delas com roupas rasgadas e sujas, fazem a própria comida no local, usando resto de concreto e pedaços de madeira na preparação do fogo.

Alguns dos dependentes químicos utilizam pedaços de papelão e se esconderem quando estão usando a droga, para não serem abordados pelas guarnições da Polícia Militar. Um dos vendedores de fruta, não identificado, disse que quando as viaturas da polícia circulam pelo local os usuários de droga correm ou se esconderam entre os caminhões estacionados na área.

Área turística

Até mesmo na área turística de São Luís existem pontos de uso de entorpecente. Nas proximidades do Convento das Mercês, no Desterro, os dependentes, além de usarem droga em plena luz do dia, também fazem as suas necessidades fisiológicas nesse local. Muitos até mesmo dormem em cima de papelão.

Na praça dos Pescadores, no mesmo bairro, é outro local conhecido por reunir usuários da droga. Em 2015, esse ponto da cidade passou por uma reforma e foi revitalizado. Na Fonte das Pedras e nas proximidades da igreja Santo Antônio, no centro, também há concentração dos dependentes.

Outros pontos

Em São Luís há pontos de consumo de crack nos bairros da Cohab, Forquilha, Liberdade, Caratatiua, Bairro de Fátima, Camboa, entre outros. Na cidade de São José de Ribamar, é possível encontrar consumidores na Vila Santa Terezinha, Residencial Nestor, Jardim Tropical, Novo Horizonte, Turiúba e Panaquatira. Em Paço do Lumiar foram identificados pontos no Maiobão, Paranã, Manaíra, Sítio Natureza, Pirâmide, Tapera, Guaíba e Mocajituba. Também existem cracolândias na Raposa, nos bairros conhecidos como Favela, Vila Bom Viver, Vila Talita e Farol do Araçagi.

Combate

Um dos maiores desafios do poder público, no momento, é o combate ao tráfico de entorpecente e assistência aos usuários. Desde 2011, o delegado da Polícia Civil, Joviano Furtado, com apoio do Centro de Atendimento Psicossocial – Álcool e Drogas (Caps AD) do Monte Castelo e demais órgãos públicos realizam um trabalho na Ilha que tem como foco os dependentes químicos.

O delegado informou que graças a essas ações, muitos usuários já foram tirados da situação de vulnerabilidade social. Somente neste ano, oito ações já foram realizados, seis delas no Mercado Central, uma no João Paulo e outra na Praça Deodoro. No último trabalho no mercado, 35 dependentes químicos foram acolhidos e realizados mais de 530 atendimentos.

Joviano Furtado informou, também, que no ano passado ocorreram 14 ações na Grande Ilha e a média de atendimento foi de 500 pessoas. “Anteriormente, os usuários eram levados para um determinado local para serem atendidos, no momento, os serviços como aferição de pressão, teste de glicemia, aids, entre outros, são realizados onde estão ocorrendo a ação”, explicou o delegado.

Número

90%

dos bairros da Região Metropolitana de São Luís, que engloba os municípios de São Luís, São José de Ribamar, Paço do Lumiar e Raposas, possuem cracolândia.

Entenda

Raio X do entorpecente na Ilha

Quantidade de minicracolândia: 110 pontos de consumo de droga na Ilha.

Combate: Ações desenvolvidas pelo delegado Joviano Furtado com apoio de demais órgãos públicos e tem como foco os dependentes químicos;

Atendimento: em cada ação desenvolvida uma média de 500 pessoas são atendidas;

Rede Maranhense de Diálogos Sobre Drogas (Remadd): uma associação civil sem fins lucrativos, sem finalidade política ou religiosa, com o objetivo de planejar e realizar programas e projetos institucionais pertinentes a objetivos comuns das Políticas Públicas Sobre Drogas;

Dependência química: considerado um transtorno mental e um problema social pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Ela é tida como doença crônica, que comumente atinge indivíduos que fazem o uso constante de determinadas drogas;

CAPS AD: pontos de atenção estratégicos da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Unidades que prestam serviços de saúde de caráter aberto e comunitário, constituído por equipe multiprofissional que atua sobre a ótica interdisciplinar e realiza atendimento às pessoas com sofrimento ou transtorno mental, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, seja em situações de crise ou nos processos de reabilitação.

Boca de fumo: ponto de drogas, refere-se ao local, geralmente um barraco ou botequim, onde é feita a venda de drogas ilícitas, tais como maconha, cocaína, loló, e crack.

Cracolândia: espaço onde várias pessoas se reúnem para consumir crack. Em São Luís, as cracolândias costumam reunir de 5 a 20 pessoas, diariamente.

Saiba mais

Crack: vira pedra quando a mistura inicial de pasta de cocaína e bicarbonato de sódio é somada a outros elementos, como gasolina, querosene e até água de bateria. O nome da droga vem justamente do estalo produzido com a queima. Absorvida pelo pulmão, a fumaça inalada leva 10 segundos para alcançar o cérebro, com tempo de efeito estimado entre cinco e
10 minutos.

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