SÃO LUÍS - Médicos das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), insatisfeitos com salários atrasados há pelo menos três meses, decidiram dar uma resposta ao poder público e promoveram durante todo o dia de ontem,13, uma “operação tartaruga” (lentidão proposital no atendimento”) que causou demora na assistência a centenas de pacientes. O Estado apurou que problema ocorreu em pelo menos duas unidades (no Vinhais e no Itaqui-Bacanga). A crise na saúde também se estende ao interior do estado. De acordo com o Conselho Regional de Medicina (CRM), cerca de 1.000 médicos estão sem receber. Procurada, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) negou qualquer alteração no atendimento e informou que os serviços seguem “regulares”.

Devido à demora proposital no atendimento, pacientes e acompanhantes precisaram esperar por horas. Em alguns casos, cidadãos tiveram que aguardar por mais de cinco horas. Sem qualquer tipo de informação, muitos deles apelavam para as redes sociais. O Estado recebeu, via WhatsApp, fotos de pacientes esperando por atendimento médico em cadeiras improvisadas e/ou sem medicação. Um paciente não-identificado, por exemplo, com suspeita de fratura na bacia, aguardava por quatro horas para ser atendido na UPA do Itaqui-Bacanga, na tarde de ontem (13).

A manicure Rosilene Everton estava desesperada. Ela clamava por apoio médico ao irmão dela, Aldeli Everton, que chegou às 13h de ontem à UPA Itaqui-Bacanga com sintomas de febre alta e dores fortes de cabeça. Até às 16h30 de ontem, o paciente ainda não havia sido avaliado. Ela disse que funcionários da unidade perceberam a lentidão intencional dos médicos para atendimento. “Um dos funcionários me disse que não poderia fazer nada, mas, que de fato, eles [ médicos] estavam atendendo mais lentamente”, contou. A acompanhante informou ainda que outros pacientes estavam na mesma situação, ou seja, sem saber quando seriam atendidos.

O caso do aposentado José Antônio Ferreira, de 62 anos, foi ainda mais desesperador. Ele e a esposa (com suspeita de fratura no quadril) chegaram à UPA do Vinhais ontem ao meio-dia. Cinco horas depois e cansados de esperar, decidiram ir até a Unidade Mista do Bequimão, onde a paciente recebeu cuidados médicos. “Para nós, somente disseram para esperar. Mas a gente conversa com um e com outro e percebe que tem alguma coisa errada. Aí eu logo confirmei que os médicos estavam fazendo operação tartaruga só por causa de salário atrasado”, afirmou.

Sentado na calçada da UPA do Vinhais, no fim da tarde de ontem, o autônomo Rogério Silva respirava aliviado após o sufoco passado horas antes. Ele chegou com seu filho – Bryan de Oliveira Fonseca - com suspeita de infecção urinária às 15h. Sem saber se o filho seria atendido, Rogério pediu com a voz alta assistência para funcionários. “Cheguei a dizer para um funcionário que mão queria ver meu filho morrer em plena porta de hospital com tanta dor. Foi aí que a direção da unidade de saúde começou a se mexer para ver ao menos uma cama para meu filho”, relatou.

Até o fim da tarde de ontem, os exames que apontariam para a gravidade da infecção de Bryan de Oliveira ainda não estavam prontos. O Estado apurou que o problema envolvendo os médicos também ocorreu em outras unidades de pronto atendimento da capital maranhense. A SES não confirmou a informação.

Vinculada

Governo confirma à CRM atrasos nos salários de médicos

O Governo do Estado, em reunião realizada ontem entre representantes da Secretaria Estadual de Saúde (SES) e do Conselho Regional de Medicina (CRM) e com a participação de outras entidades de defesa, confirmou o atraso nos salários dos médicos de São Luís e do interior do Maranhão. Segundo a pasta, “o pagamento dos honorários médicos ocorrerá a partir desta semana”.

A O Estado, o presidente do CRM, Abdon Murad, disse que a demora no repasse dos valores aos médicos ocorre desde agosto. Os vencimentos do oitavo mês do ano, segundo ele, somente entraram na conta dos médicos no último dia 30. De acordo com o CRM, a promessa do estado é quitar todas as pendências até o dia 25 de dezembro. “Esta demora, além de prejudicar o dia-a-dia dos profissionais, é uma desvalorização clara dos médicos que são essenciais na rede pública”, disse. Segundo o presidente, caso os atrasos persistam, uma assembleia entre os filiados será convocada. “Vamos aguardar o parecer do secretário Carlos Lula para saber qual medida tomaremos”, afirmou Murad..

A crise na saúde do estado causou, de acordo com entidades médicas, suspensão das atividades destes profissionais no interior. Segundo o que apurou O Estado, o fato ocorreu em pelo menos cinco cidades: Coroatá, Matões do Norte, Pinheiro, Peritoró e Caxias. Questionado, o governo não se manifestou sobre o fato.

Além no atraso dos salários, outro motivo de insatisfação dos profissionais médicos é a recente Portaria número 144, de 30 de outubro deste ano, que determina a redução “de 10% sobre os valores atualmente pactuados” nos plantões. Na prática, os plantões dos profissionais médicos nas áreas de ginecologia, cirurgia geral, anestesiologia, pediatria e ortopedia sofreriam uma redução que deve variar entre R$ 200 e R$ 300.

Ainda de acordo com a publicação no Diário Oficial do Estado, a Portaria número 144 “deverá produzir efeitos a partir do dia 1o de novembro de 2018”. Segundo o texto, “alterações contratuais necessárias ao efetivo cumprimento desta Portaria deverão ser ajustadas no prazo de 60 dias”.

Frase

“Esta demora, além de prejudicar o dia-a-dia dos profissionais, é uma desvalorização clara dos médicos que são essenciais na rede pública"

Abdon Murad

Presidente do Conselho Regional de Medicina

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