Alerta

Infância na balança

Em alusão ao dia 3 de junho, Dia da Conscientização contra a Obesidade Mórbida Infantil, o DOM faz um alerta: excesso de peso não é um problema só de adultos. O número de crianças que estão se tornando obesas tem crescido

Paula Boueri / Editora do DOM

Atualizada em 11/10/2022 às 12h58
 Obesidade infantil chegou a níveis epidêmicos/ Foto: Divulgação
Obesidade infantil chegou a níveis epidêmicos/ Foto: Divulgação

Nos últimos 30 anos, o Brasil tem agido no enfrentamento da desnutrição infantil, alcançando resultados bastante significativos. Pesquisas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entretanto, constataram que agora o problema compete com um totalmente oposto: a obesidade infantil. Para se ter ideia da gravidade da questão, desde 1974, o excesso de peso entre as crianças passou de 9,7% para 33,5% - mais que triplicou, atingindo índices de epidemia.

“Houve uma mudança significativa nos hábitos dos brasileiros, que passaram a consumir mais industrializados e fast foods, e isso teve um impacto na qualidade de vida da família. Antes era preciso comprar a fruta e produzir o suco, hoje é mais ‘prático’ tomar refrigerante. Faz-se macarrão instantâneo no lugar do macarrão tradicional; enlatados no lugar da comida. Tudo isso, mais o sedentarismo, tem levado a esse quadro de obesidade”, explica o nutrólogo Klevison Araújo, membro efetivo da Associação Brasileira para Estudo da Obesidade (Abeso).

Segundo o médico, a constatação extrapola as questões relacionadas exclusivamente à criança e também não distingue classe social. “É um problema do estilo de vida atual. Todo o conjunto familiar sofre com isso. Filhos adquirem os maus hábitos com os pais. Ela não nasce sabendo o gosto do chocolate, isso foi apresentado pelos pais. E ela não sabe distinguir”, frisa. “É também injusto que em uma casa se queira que apenas aquela pessoa seja o perfeitinho, o que vai ter bons hábitos”, completa.

Além da alimentação, colabora para aumentar obesidade infantil a diminuição do gasto de energia. “Em todas as classes têm aumentado a oferta calórica e o consumo de alimentos com mais gordura e mais açúcar. As crianças também não podem mais brincar livremente, seja pela violência crescente, seja porque estão presas a videogames e redes sociais”, diz o endocrinologista Clivaldo Agra, especialista em Endocrinologia geral pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia e com certificado de atuação em endocrinologia pediátrica pela Associação Médica Brasileira (AMB).

“Não gosto” – Patrícia Sousa, cuja filha de 8 anos já pesa 33 kg, sabe que precisa ser espelho para ela, ainda assim acredita que a aversão da filha a frutas e legumes se deve a gosto pessoal. “Quando ela era bebê, comia, mas foi crescendo e hoje separa quando coloco no prato. Quando mando o lanche de casa para a escola até consigo controlar algumas coisas, mas quando ela está longe não consigo controlar”, conta, relatando que costuma mandar pão quente e suco, mas quando a menina lancha na cantina faz a opção por pizzas, refrigerantes e salgadinhos.

A criança sempre foi considerada “gordinha”, mas há algum tempo começou a ganhar mais peso. “A situação se agravou depois que eu me separei. Levei ao psicólogo e descobrimos que ela sofre de ansiedade. Tudo ela desconta na comida, se está alegre, triste, angustiada. Já estou percebendo que ela diminuiu a porção de almoço, contando com o que ela vai comer de besteira depois. Por enquanto, as taxas dela estão normais, mas ela está crescendo”, relata a mãe, que diz ainda que a menina não se incomoda quando alguém faz brincadeira com o seu peso. “Ela leva na esportiva”.

Aos 13 anos, o adolescente Matheus Soares já não está mais nas estatísticas, mas nem sempre foi assim. Ele foi uma criança que praticava esportes, mas com excesso de peso, e precisou mudar os hábitos após descobrir intolerância à lactose. “Eu comia muita besteira e não me incomodava quando alguém me chamava de gordo. Depois do diagnóstico, precisei cortar muita coisa e fui perdendo peso”, comenta.

No novo cardápio, entraram algumas frutas, principalmente na forma de suco, porém ele ainda não se “aventura” nas verduras e legumes. “A minha mãe come tudo, meu pai já não gosta. Então, exemplo eu tenho. O que posso dizer é que já aceito algumas coisas, suco de acerola, por exemplo, eu não bebia, achava que era ruim, mas descobri que é bom. Vamos ver o que vem depois”, diz o jovem.

Obesidade não é sinônimo de saúde - Além dos hábitos alimentares que têm mudado, médicos e especialistas se deparam também com a cultura popular que ainda acredita que criança gordinha é sinônimo de saúde. Mas médicos e especialistas enfatizam: crianças e adolescentes obesos terão mais probabilidade de continuarem obesos na fase adulta.

“É crescente o número de crianças que chegam aos consultórios com excesso de peso, algumas já com colesterol e triglicérides alterados, com resistência insulínica. São crianças que possuem um risco maior de desenvolver doenças cada vez mais jovens, do que em relação às gerações anteriores”, comenta Clivaldo Agra.

“Um grande agravante é que são crianças obesas, mas, de certa forma, desnutridas, uma vez que os alimentos consumidos em excesso por elas não possuem qualquer qualidade nutricional. Então, são crianças com excesso de peso com sérias carências nutricionais”, alerta o nutrólogo Klevison Araújo.

De acordo com Clivaldo Agra e Klevison Araújo, o acompanhamento de casos de obesidade infantil precisa ser multidisciplinar. “Em alguns casos raros, a obesidade pode ser sinal de disfunção hormonal, Síndrome de Prader-Willi, hipotireoidismo, síndromes genéticas. Mas esses casos são minoria. Tudo é investigado, antes de se começar qualquer tratamento”, explica Clivaldo Agra.

O tratamento passa primeiramente pela mudança de hábitos alimentares. Medicação e cirurgias são as últimas alternativas. “É preciso ter paciência. É um trabalho de dia a dia, de ensinar. Mas reforço: é um trabalho que precisa ser de toda a família. Toda ela precisa se reeducar. Os pais podem negociar, irem fazendo pequenas trocas com a criança. Também oferecer variedade. Um prato colorido chama a atenção”, ressalta Klevison Araújo.

Fonte: IBGE
Fonte: IBGE

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