Saúde

Novas diretrizes sobre câncer de mama geram polêmica

G1

Atualizada em 27/03/2022 às 13h04

SÃO PAULO - Karen Young-Levi realizava mamografias desde que completara 40 anos. Ela não faltava ao procedimento mais do que faltaria às aulas de spinning na academia ou deixaria de usar o cinto de segurança. "É meu porto seguro", disse Young-Levi, de 43 anos, de Medford, Nova Jersey.

Assim, Young-Levi ficou confusa e nervosa na semana passada, quando surgiram notícias sobre novas recomendações federais para reduzir a rotina dos exames de câncer de mama. Como muitas mulheres, ela reagiu com choque e descrença ao fato de que o único exame em que ela confiava tinha sido questionado.

"Se alguém realizasse uma análise de computador determinando que o uso do cinto de segurança não o protegeria da morte em um acidente, você deixaria de usar o cinto?", perguntou Young-Levi. "Meu grande medo é que a cobertura seja diminuída e que uma ferramenta muito valiosa para detectar algo em estágio inicial possa ser tirada de mim".

Durante anos, organizações como a Breastcancer , onde Young-Levi trabalha, promoveram os exames regulares e uma ambígua mensagem de que a detecção prematura salva vidas.

Assim, embora algumas mulheres saudáveis tenham ficado aliviadas ao ouvir que podem começar a faltar às mamografias de consciência limpa, muitas pessoas rejeitaram as novas recomendações. Alguns médicos disseram que iriam ignorá-las e continuariam aconselhando pacientes a realizar exames com frequência e desde cedo.

"Estou irritada; este é um gigantesco passo para trás e um terrível engano", disse a fundadora da Breastcancer, Marisa Weiss, oncologista do Hospital Lankenau, em Wynnewood, Pensilvânia.

"Sabemos que a mamografia tem melhor desempenho e encontra coisas que nunca serão ameaças à vida, e sabemos que tem desempenho inferior em algumas mulheres. Mas ela não tem chance de ter qualquer desempenho em mulheres que não a fizerem".

As novas diretrizes para exames, divulgadas na segunda-feira (16) pela Força-Tarefa de Serviços Preventivos do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA, recomendaram a não-realização da mamografia de rotina em mulheres entre 40 e 49 anos. E elas reduziriam o período de exames para mulheres entre 50 e 74 anos, de anualmente para uma vez a cada dois anos.

As recomendações questionam a utilidade da mamografia para mulheres acima dos 75 anos. Além disso, não aconselham ensinar mulheres a realizar auto-exames nos seios e questionam a utilidade de exames clínicos nos seios.

Elas sugeriram que esforços nacionais para conter custos na saúde deviam estar por trás das recomendações, embora o painel de especialistas as tenham baseado numa rigorosa revisão de evidências médicas.

"Começaremos a perder muitas mulheres", disse Sylvia Moritz, 54, de Manhattan, que descobriu ter câncer de mama aos 48 anos após realizar uma mamografia anual. "Tenho duas amigas na casa dos 40 que acabaram de ser diagnosticadas com câncer de mama. Uma delas acabou de completar 41 anos. Se tivessem esperado até ela completar 50 para fazer uma mamografia de rotina, eles não teriam que se incomodar da parte dela – ela estaria morta".

Desconforto

Porém, as mamografias, como as limpezas dentais, podem ser extremamente desconfortáveis, e algumas mulheres dizem ter ficado maravilhadas com as novidades.

"Pessoalmente, fico muito feliz de ouvir isso", disse Jane Kettlewell, de 49 anos, de Forest Hills, no Queens. "Coincidentemente, acabei de tirar um ano de folga das mamografias obrigatórias. Eu absolutamente as odeio".

"Há muitas coisas às quais você está sujeita que são algumas vezes desnecessárias e mais perigosas do que se você não fizesse uma mamografia", disse Sarah Tannehill, de 60 anos, de São Francisco, que realizou apenas duas vezes o exame. "E sinto como se nós provavelmente temos cânceres que aparecem em nossos corpos em diversos momentos, e nós os combatemos nós mesmos se não estivermos num estado comprometido".

Organizações de câncer de mama dizem temer que as novas diretrizes somente encorajem as mulheres a evitar os exames. "Mamografias não são divertidas, e as pessoas buscam desculpas para não fazê-las", disse Heather Gilbert, de 64 anos, sobrevivente do câncer de mama que fundou a Breast Cancer Solutions, uma organização sem fins lucrativos em Orange County, na Califórnia.

Entre outras coisas, a organização ajuda mulheres abaixo dos 40 anos a pagar por procedimentos diagnósticos não cobertos pelas seguradoras. "Anúncios como esse estimularão muitas mulheres a não realizar mamografias, falhas como elas são", disse Gilbert.

As reações dos médicos foram as mais variadas, mas todos concordaram que seriam inundados de ligações nos próximos dias.

Christine Hodyl, diretora de cirurgia mamária do Hospital Comunitário South Nassau, em Oceanside, Nova York, disse que não mudaria suas recomendações sobre os exames prematuros. "Não posso lhe dizer quantas vezes encontramos um câncer numa mulher jovem que chega para uma mamografia de base antes dos 40 anos", disse Hodyl, acrescentando que estava "extremamente" preocupada com as ramificações das diretrizes mais relaxadas.

"Estamos aqui nas trincheiras, vemos tantas pacientes lidando com esse diagnóstico, e ficamos sempre felizes por aquelas que vêm cedo", contou Hodyl. "Sinto como se a vida delas fosse alterada para o bem".

No entanto, os médicos também veem os pontos negativos do exame prematuro: os falso-positivos, as biópsias, os repetidos exames de diagnóstico e a luta com tratamentos exageradamente agressivos, incluindo imenso estresse psicológico.

"Algumas mulheres ficam constantemente sendo chamadas de volta", disse a médica Suzanne Trupin, que atua em Champagne, Illinois. "É como uma porta giratória, dentro e fora, a cada três ou seis meses, entra ano e sai ano. Isso é loucura, e no fim acaba não sendo nada".

Médicos também disseram saber que, mesmo se gastassem tempo explicando o motivo para as novas diretrizes, algumas mulheres ficariam alertas. "Ainda teremos muitas mulheres que, apesar da mais clara das explicações, irá dizer, 'Mas eu quero minha mamografia'", disse Christine Pellegrino, diretora da clínica de câncer de mama do Montefiore-Einstein Center.

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