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COLUNA
Curtas e Grossas
José Ewerton Neto é poeta, escritor e membro da Academia Maranhense de letras.
Curtas e Grossas

O pistoleiro, ou Os brutos também amam

Empatia poética com um clássico do western

José Ewerton Neto

 
 

Um dos melhores filmes que vi, não assisti em uma tela, mas li em uma revista de histórias em quadrinhos. Na verdade, fotos em quadrinhos, reproduzidas dos filmes.

Em quadrinhos chamava-se O homem dos vales perdidos. No cinema se chamou (na ótima versão brasileira do título original Shane, Os brutos também amam). Foi premiado com um Oscar teve direção de George Stevens e protagonismo de Alan Ladd.

Fiquei tão fascinado pelo que li repetidas vezes na minha adolescência em fotos P&B que jamais quis ver o filme na tela ou na tevê para não perder o encanto. 

Dias atrás estava relendo a exegese do filme no mais-que-perfeito livro de Paulo Perdigão intitulado Western Clássico, quando constatei que muitas passagens de sua preciosa análise tinham correspondência na poesia intitulada O pistoleiro, publicada em meu livro Cidade Aritmética, que ganhou um concurso de poesia na década de 90. 

Teria sido minha inspiração para o poema, anos após, vindo do filme? Vejamos a extraordinária empatia estabelecida entre a análise feita por Paulo Perdigão e o poema, exibida a seguir, em estrofes da sequência do poema, em paralelo com os recortes da referida análise. 



 

1.PAULO PERDIGÃO: (...) A solidão, a melancolia o princípio do heroísmo como atitude militar da alma, a masculinidade charmosa, o passado enigmático, esses os traços do aventureiro americano por excelência. Com eles se apresenta Shane (o pistoleiro) , um personagem de tragédia, acabrunhado e cansado de mortes, vindo do horizonte , portador de uma aura de mistério que seduz... 

O PISTOLEIRO (poema): De repente ele chegou: Vestido de preto/ Feliz de altura/Gasto de sorrisos/Marcado de ira/ Remendado de coragem/Roubado de medo...Montado num corcel branco e relinchando pelo cano de sua pistola de prata/ Saboreando tantas vidas mortas no fumo preto do seu charuto grosso.

2.PAULO PERDIGÃO: Shane é, antes de tudo, um trágico. Ele conduz a solidão, estatuto universal do herói. A solidão lhe dá grandeza e mistério Partindo sem destino para fugir à solidão, o aventureiro sempre a encontra em cada momento de sua jornada. Sozinho, ao chegar, Shane continuará só, entre amigos eventuais e adversários que o provocam.

O PISTOLEIRO (poema): (...) E , enquanto seu olhar de cobra/ feria o espaço e maltratava o infinito/O sol se escondia, covarde! / atrás de uma nuvenzinha qualquer. O fio que separa a vida da morte encurtou / até tornar-se um ponto/, maior, por um instante ainda/ que o ponto final / E a morte abriu sua imensa boca

3.PAULO PERDIGÃO: Ao terminar o duelo, Shane percorre o saloom com os olhos. Uma expressão de tristeza pelo que acabou de fazer. Então, a mesma violência que produziu sua vida, paradoxalmente o conduzirá cedo ou tarde, à morte. 

O PISTOLEIRO (poema): Saiu do Saloom/Desnecessário seria perguntar-lhe pelas balas/ ou o porquê de sua tristeza depois delas/ A verdade dos cadáveres valia-lhe um pouco mais/ Tanto mais agora que o sol da tarde de ira se punha no seu sorriso. /Mas não chorou, contudo, por seu destino tragicômico/ De pistoleiro cruel morto por um THE END.

Que notável semelhança, na abordagem do mito do pistoleiro, intrínseco aos temas, não é mesmo, caro leitor? Caso apreciem cinema, como eu, sugiro que assistam ao filme e leiam o livro, uma edição da L&PM. E, se tiverem curiosidade vejam o poema no livro Cidade Aritmética que está na livraria AMEI, em seus últimos exemplares.

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