Seguindo o rastro de Mário Quintana
Referenciei-me em algumas de suas intervenções plenas de arguta lógica e sabedoria para concatenar esta crônica.
Gosto de entrevistas. Quando se trata de escritores consagrados quase sempre se extraem boas reflexões sobre o ofício de escrever, de fazer arte e, principalmente, de viver.
No livro Viver&Escrever de Edla Van Steen, que acabei de ler, entre tantos escritores entrevistados privilegiei as respostas do saudoso poeta Mário Quintana. E é no rastro de algumas de suas intervenções plenas de arguta lógica e sabedoria que me referenciei para concatenar esta crônica.
1.Você se lembra de quando e onde descobriu que queria e podia escrever versos?
Ser poeta não é uma maneira de escrever. É uma maneira de ser. O leitor de poesia é também um poeta. Para mim o poeta não é essa espécie saltitante que chamam de relações públicas. O poeta é Relações Íntimas. Dele com o leitor. E não é o leitor que descobre o poeta, mas o poeta que descobre o leitor. Que o revela a si mesmo (...)
De fato, na época dessas entrevistas, o poeta com notável premonição já antecipava o que está acontecendo hoje, em larga escala , nas redes sociais.
Alguém duvida de que estas inauguraram um novo tipo de poeta: aquele que se tornou mais que poeta, um verdadeiro Relações Públicas de si mesmo?
2.Tentou alguma vez escrever conto ou romance?
(...) Depois de algumas tentativas reconheci que os meus contos só tinham um personagem: eu mesmo. Desisti.
Como seria bom para a literatura se todos aqueles que, carentes de ideias para suportar um romance, escolhem a si mesmo como foco e desatam páginas e mais páginas falando de suas elucubrações, tendo o próprio ego como centro de gravidade, percebessem isso! Como seria bom – diria- se tivessem a notável honestidade de um Quintana e desistissem de escrever romances.
3.Gostaria de comentar algo sobre a poesia de cunho social e político?
A poesia engajada? Eis aí uma questão com que, em certas épocas, costumam serem assaltados os poetas. Impossível não leva-la em conta quando se pensa no que fez pela abolição um poeta como Castro Alves. Mas querer obrigar todos a ser Castro Alves é forte. E, convenhamos, uma boa causa jamais salvou um mau poeta. Essa gente poderia fazer muito mais pelo povo candidatando-se a vereador.
Lembro que, na época em que viveram poetas como Castro Alves e Maiacóvski, estes detinham, por força do alcance da literatura, muito maior poder de alavancar multidões em torno de uma ideia. Então não havia a concorrência da imagem, disseminada pela chegada da televisão. Hoje me parece haver certo desperdício no engajamento absoluto de certos poetas, guardando a ilusão de que irão modificar o mundo a partir de seus escritos.
Quando são bons poemas, evidentemente, a boa poesia resiste a qualquer enquadramento, mas quando não são, acho que vale a lição de Mário Quintana:
Uma boa causa jamais salvou um mau poeta!.
Etc etc etc. Com o perdão de Quintana, sugiro que o leiam sempre. Esta é de uma edição de 1981, Coleção LP&M Pocket.
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