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José Sarney é ex-presidente da República.
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Bicentenários

Temos uma tendência a pensar que os anos são bons ou maus, mas, parafraseando Ortega y Gasset, podemos dizer que os anos são os anos e suas circunstâncias.

José Sarney

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Temos uma tendência a pensar que os anos são bons ou maus, mas, parafraseando Ortega y Gasset, podemos dizer que os anos são os anos e suas circunstâncias. Falei nas últimas semanas de dois bicentenários de nascimento, o do Parlamento brasileiro e o de Gonçalves Dias. 

Ali mesmo na velha cidade de Caxias, no Alto Itapicuru, onde nasceu a 10 de agosto o filho de Dona Vicência que seria o maior poeta brasileiro, havia poucos dias — no dia 31 de julho — tinham se rendido as tropas portuguesas comandadas pelo Major Fidié, selando a adesão do Maranhão à Independência. Na verdade, o mercenário Cochrane declarara a adesão feita no dia 28, já que o saque ao patrimônio da cidade, seu real objetivo, era coisa resolvida e não soubesse qual era a situação no interior. Coisa feia para uma coisa tão bonita como o congraçamento dos maranhenses em torno da Independência. Mas mesmo essa paz se arrastaria por mais um bom tempo, pois os portugueses, aqui no Maranhão como em todo o Brasil, eram a plutocracia que, de fato, governava. 

Foi o que fez, em abril deste ano de 1823, Cipriano Barata, meio expulso das Cortes de Lisboa — onde era deputado pela Bahia — por seu nativismo e de uma Salvador ainda ocupada pelas tropas de Madeira, passou a publicar, em Recife, a Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco. Pernambuco estava numa transição entre a Revolução Pernambucana, de 1817, e a Confederação do Equador, de 1824. O Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, que fora preso em 1817 pelo Conde dos Arcos como capitão de guerrilhas sob o comando do Coronel Suassuna, e fora solto em 1821, fazia oposição aos governos do Imperador D. Pedro, embora tivesse celebrado missa de ação de graças pela sua aclamação ao título, em dezembro do ano anterior. A 17 de março de 1823 escrevera uma carta subversiva no Correio do Rio de Janeiro de João Soares Lisboa e a 25 de dezembro começará a escrever a Typhis Pernambucana, folha central na explosão nativista do ano seguinte — quando Recife será bombardeada pelo mesmo mercenário escocês, enquanto o batalhão de José Joaquim de Lima e Silva, com seu sobrinho Luís Alves como ajudante e sob o comando de seu irmão Francisco de Lima e Silva, avança por terra. O tio manda enforcar Frei Caneca — e, como todos se negassem a executar a pena bárbara, o faz arcabuzar.

O futuro Duque estreara no Batalhão do Imperador lutando a 28 de março de 1823. Seu tio traiu logo o comandante mercenário francês Labatut e, no dia 2 de julho, concretizara a adesão da Bahia à Independência, com a expulsão do General Madeira. 

Nessa coisa da Independência meu tataravô Manuel de Sousa Martins fora um precursor, proclamando no dia 24 de janeiro de 1823, em Oeiras, a capital do Piauí, a adesão da Província. De lá marchara para Campo Maior — adesão a 2 de fevereiro — onde pouco depois, no dia 13 de março, se travou a grande Batalha do Jenipapo, que o Fidié ganhou e onde perdeu a guerra. 

Feio foi o que aconteceu em Belém do Pará. Cochrane foi vitorioso a 15 de agosto. No dia 16 de outubro houve uma revolta contra os portugueses, que continuavam mandando na cidade. Um Grenfell, assecla do escocês, mandou trancar os brasileiros no porão do brigue São José Diligente, onde, aglomerados e sem ar, foram ainda por cima arcabuzados e cobertos de cal viva. No dia 22 eram 252 os mortos sufocados, marcados pelas faces embranquecidas e os olhos e lábios arroxeados como “com cara de palhaços”, nome que passou a denominar o brigue fúnebre. 

Mas concluo essas notas de bicentenário lembrando o de uma heroína, Maria Leopoldina, nascida Leopoldina Carolina Josefa de Habsburgo-Lorena, nossa Imperatriz, que no dia 17 de fevereiro deu à luz a princesa Paula do Brasil e em novembro ficou grávida da princesa Francisca do Brasil. Educada com esmero, se interessava sobretudo por botânica e mineralogia — seu amigo José Bonifácio de Andrada e Silva era grande mineralogista e grande botânico. Ela trouxe de Viena uma comitiva de sábios, entre eles Spix e Martius, autores de registros fundamentais de nossas fauna e flora, inclusive o Flora Brasiliensis, que catalogou mais de 22 mil espécimes de mais de dois mil gêneros. 

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