Robôs líquidos
Falamos um pouco sobre os diversos tipos de robôs.
Nagoya é uma cidade única. Como Osaka, Tokyo ou Hiroshima, ela tem características interessantes, como o seu sotaque local ou a sopa de misô, que é clara, ao contrário da capital, que é escura. Mas o que agora explode em minha memória é o laboratório que meu orientador criou: imitar o que existe na natureza. “Biomimético” – é o que consigo traduzir, dentro de minhas limitações. Em outras palavras, seria a tentativa de imitar ou “mimicar”, na Ciência, o que a Natureza nos ensina.
Eu o encontrei em 1992 quando aportei, ainda jovem, no Japão e nem tinha ideia que nossos caminhos se cruzariam três anos depois e que seriam longos, ele me orientando para meu PhD na Universidade de Nagoya e depois me convidando para uma posição de pós doutorado no RIKEN. Noboru Ohnishi carregava, nos mesmos feixes do seu “kubi bukuro” tanto a sabedoria milenar daquele povo lutador, quanto a Ciência - isso tudo somado ao cuidado e à delicadeza no trato com o outro. Depois, com a convivência, vi que ele também acrescentava disciplina e dedicação à família.
O interesse de nosso laboratório era em robôs humanoides. Só lembrando: há 30 anos não tínhamos essa exuberância que temos hoje, desde celulares que reconhecem faces quando vamos tirar fotos, tradutores automáticos de uma língua para outra ou o ChatGPT, que está encantando meio mundo de gente! Era o início da inteligência artificial e trabalhávamos em computadores muito lentos quando comparados à velocidade de um celular que você usa hoje. Aquele grupo ajudava a criar, no Japão, o que hoje chamamos de “aprendizado de máquinas”.
O termo “robô” tem sido usado de uma forma bem ampla ultimamente. Ele não tem mais a forma humana dos desenhos animados. No fundo, quando você recebe e-mails, WhatsApp e telefonemas em massa, se diz que tem um robô disparando essas mensagens. Claro, a política os utilizou largamente nas eleições, tanto nos EUA quanto no Brasil ou no Brexit, do Reino Unido.
Nos casos mais elaborados, os “bots” utilizam inteligência artificial em computadores e celulares para “conversar” com as pessoas em grupos de WhatsApp ou Telegram, por exemplo. São muito elaborados e aprendem a nos responder a partir análises neurocientíficas de nossos comportamentos: eles tentam nos manipular para um propósito específico. Você tem opinião A? Ele vai argumentar de tal forma para lhe convencer a aderir à plataforma B que pagou sua criação. Se a sua opinião coincide com a dele, você será inundado com informações que reforçarão sua opinião. Ou seja, como dizem em inglês, não existe almoço grátis.
Alguns mais simples estão disponíveis no Facebook, Twitter ou Instagram. Por exemplo, há aqueles com propósitos comerciais: você lembra que começou a visualizar propaganda de bolsas depois que buscou o mesmo item? Ou apareceram propagandas de agências de viagens e companhias aéreas depois de procurar um voo?
“Não é possível que eu esteja sendo manipulado por algoritmos de inteligência artificial” – você pode certamente reclamar e não acreditar. Sugiro dar uma olhada no ChatGPT. Peça para ele falar sobre as obras de Shakespeare ou as equações de Newton. Ah, ou solicitar uma opinião sobre o processo político do Brasil no começo do século 20. O que você lerá vai fazer muito sentido, afinal os textos dele são elaborados a partir de bases de dados gigantescas e as sentenças são construídas de tal forma que é difícil para um leigo distinguir o homem da máquina.
Mas ninguém desistiu dos humanoides. Os robôs mais interessantes, em minha opinião, são controlados magneticamente. A maioria dos que conhecemos são feitos de materiais sólidos, que não podem, por exemplo, passar por espaços mais estreitos como janelas ou grades. Em um estudo divulgado recentemente, pesquisadores se inspiraram na natureza. Os pepinos-do-mar, por exemplo, conseguem alterar sua rigidez de forma muito rápida. O desafio era imitar isso usando materiais maleáveis.
A equipe, da Universidade de Carnegie Mellon liderada por Carmel Majidi, se voltou para o gálio, um metal que derrete a cerca de 30° Celsius – portanto à temperatura ambiente. Em vez de conectar um aquecedor a um pedaço de metal para mudar seu estado, os pesquisadores o expõem a um campo magnético que muda rapidamente para liquefazê-lo. Dessa forma, uma corrente elétrica é gerada dentro do material, fazendo com que ele aqueça e derreta. Ele solidifica novamente quando deixado para esfriar.
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A aplicação é interessantíssima e mostro no vídeo acima, com dois exemplos. O primeiro lembra o filme O Exterminador do Futuro, em que o vilão se derrete e se regenera durante a ação. O outro é uma simulação de uma aplicação prática para colher material no estômago.
Por último, sobre o pepino do mar: além de inspiração para trabalhos científicos, ele vive no fundo do oceano e é uma iguaria na Ásia, inclusive no Japão.
* Allan Kardec Duailibe Barros Filho, PhD pela Universidade de Nagoya, Japão, professor titular da UFMA, ex-diretor da ANP, membro da AMC, presidente da Gasmar.
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