Especial São Luís

Por que São Luís é a Ilha Rebelde?

As origens e fatos que caracterizam a natureza política rebelde da capital maranhense

José Linhares Jr

Atualizada em 01/09/2023 às 12h29
No aniversário de 410 anos da capital maranhense, o Imirante resgata as origens da rebeldia política da capital maranhense
No aniversário de 410 anos da capital maranhense, o Imirante resgata as origens da rebeldia política da capital maranhense (Biblioteca do IBGE)

SÃO LUÍS - Entre os tantos apelidos, alcunhas e epítetos que São Luís recebeu ao longo destes 410 anos estão: Atenas Maranhenses, Ilha do Amor, Cidade dos Azulejos, Ilha Magnética e Jamaica Brasileira. Todas estas denominações derivadas de características culturais, geográficas e arquitetônicas. Entre todos estes codinomes, apenas um resulta de características políticas, a Ilha Rebelde.

REBELDIA OFICIAL

Oficialmente, segundo o jornalista e historiador Benedito Buzar, o título de Ilha Rebelde fora definido em 1951, quando a capital maranhense completara 349 anos de fundação.
O título fazia referência à famosa Greve de 1950, quando o povo da capital resistiu contra a posse do governador Eugênio Barros. Líderes políticos da capital apontara uma fraude nas eleições que contava com anuência da Justiça na época.

Por cerca de seis meses a população da capital maranhense se levantou contra a fraude eleitoral e resistiu. O movimento foi definido por Buzar em seu livro, A Greve de 51; os trinta e quatro dias que abalaram São Luís, como fabuloso.

Do fim dos anos 1940 até meados da década de 1960, o Maranhão vivia sob a hegemonia política do funcionário público e político Vitorino Freire. O momento ficou conhecido como “vitorinismo”, do qual Barros era membro.

A eleição de Barros se deu no auge do poder do vitorinismo, que já dominava com mão-de-ferro Executivo, Legislativo e Judiciário. Eram poucas as instituições que fugiam da influência do grupo liderado por Vitorino Freire.

Foi então quer a capital maranhense foi transformada em uma trincheira política contra o vitorinismo. São Luís já era conhecida como o cemitério eleitoral dos candidatos governistas. O domínio político comum no interior do estado era completamente inexistente na capital. 

OUTRAS REBELDIAS

Apesar do registro histórico caber a Benedito Buzar, fatos anteriores e posteriores a 1950 reforçam a tese de que o DNA político da capital maranhense forjado na resistência transcende a revolta de 1950.

Duzentos e sessenta e seis anos antes, a capital foi o ponto de partida da lendária Revolta de Beckman, ocorrida em 1684. Insatisfeitos com a administração colonial, principalmente com a questão da escravização dos indígenas e do monopólio comercial realizado pela Companhia de Comércio do Maranhão, moradores de São Luís desencadearam o levante. A revolta conseguiu dominar a cidade e instaurar um novo governo por mais de um ano. 

Entretanto, a rebeldia de São Luís em oposição à Coroa Portuguesa não fora acompanhada pelas demais cidades da província. Em 1685, uma esquadra portuguesa foi enviada a São Luís e restabeleceu o domínio da cidade. Apesar da duração da revolta, as baixas entre militares e civis foram poucas. As mortes mais emblemáticas foram as execuções de três líderes do movimento: Manuel Beckman, Jorge de Sampaio e Francisco Dias Deiró.

Em 1889, São Luís viveu o mais violento levante político de resistência de sua história. Pesquisas recentes mostram que, possivelmente, as sementes do que se tornaria as Ilha Rebelde já haviam sido plantadas no dia 17 de Novembro.

Após o anúncio da Proclamação da República, milhares de pessoas saíra pelas ruas da cidade manifestando sua indignação contra o que chamaram de golpe. Documentos da época descrevem os revoltos que defendiam a manutenção da família real como “libertos”, “homens de cor”, “cidadãos do 13 de maio” e “ex-escravos”.

Os revoltosos tinham a sede do jornal O Globo, que defendia abertamente o fim da monarquia no Brasil, como alvo. Um grupo de militares do exército foi destacado para fazer a segurança do local. E naquele dia São Luís testemunhou o seu maior e mais covarde massacre. O pelotão fuzilou a multidão e deixou dezenas de mortos.

Na década de 1930, durante o golpe de estado que entrou para a história como Revolução de 1930, a população de São Luís também resistiu à deposição do presidente Washington Luís. Registros dão conta de troca de tiros na Praça Deodoro e de conflitos entre civis e militares.

Na ocasião, o principal quartel de São Luís era localizado no terreno que hoje abriga a Biblioteca Benedito Leite. Um grupo de militares saiu de lá em direção ao Palácio dos Leões para depor o governador José Pires VI. No caminho, ainda na Praça Deodoro, os militares trocaram tiros com ludovicenses que resistiram. O fato foi narrado pelo historiador Diogo Gualhardo Neves e em conversa com o ex-presidente José Sarney durante a produção da matéria. Apesar de não ter o caráter violento de 1889 e nem a mobilização de 1950, o movimento de 1930 é encarado pelos dois como mais um tijolo na construção da alcunha de Ilha Rebelde.

O último grande ato de resistência na Ilha Rebelde foi a chamada Greve da Meia Passagem, em 1979. Naquele ano milhares de estudantes realizaram uma manifestação violenta no centro da cidade que obrigou o governo a realizar forte repressão policial. A greve aconteceu após três aumentos de passagem no mesmo ano autorizados pelo prefeito Mauro Fecury. Estudantes declararam greve, saíram em passeata pelo centro da cidade e o conflito estourou. 

Um ato público na Praça Deodoro reuniu 15 mil pessoas no dia 17 de setembro e foi brutalmente reprimido por forças policiais. A greve só teve fim quando o governador João Castelo interveio, negociou a libertação de presos e concedeu o estádio Nhozinho Santos para a realização de uma assembleia de estudantes. Os enfretamentos foram diminuindo até que cessaram no dia 22. No dia 28 foi sancionada a leia da meia passagem, que entrou em vigor poucos dias depois. 

Por essas e outras tantas razões que no dia 08 de setembro de 2022 comemora-se 410 anos de muitas qualidades da capital do estado. No entanto, cabe ao povo de São Luís lembra-se que junto do legado cultural, artístico, natural e arquitetônico, também pulsa forte o espírito de uma história talhada pela resistência política.

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