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COLUNA
Allan Kardec
É professor universitário, engenheiro elétrico com doutorado em Information Engineering pela Universidade de Nagoya e pós-doutorado pelo RIKEN (The Institute of Physics and Chemistry).
Coluna do Kardec

O poder da informação

Breves notas sobre o avanço extraordinário da informação nos últimos anos.

Allan Kardec

Atualizada em 02/05/2023 às 23h38
 
 

Não existe política sem fuxico. A informação e a desinformação são a base para a construção de narrativas – e é o que estamos presenciando em nosso país no auge do jogo democrático da campanha política. Twitter, Instagram, Facebook, Whatsapp e tantas outras plataformas estão abarrotadas de informação para nosso cérebro degustar – ou não.

Nós temos falado muito de transição energética. Mas também vivemos uma transição conceitual. Me explico. Vamos ao cenário. A Uber, a maior empresa de táxis do mundo, não possui sequer um veículo. O Facebook, o proprietário de mídia popular do mundo, não cria nenhum conteúdo. Alibaba, o varejista mais valioso, não possui estoques. E o Airbnb, o maior provedor de hospedagem do mundo, não possui sequer um imóvel.

Em 2011, as maiores empresas do mundo eram ExonMobil, PetroChina, Shell, ICBC e Apple. As quatro primeiras, de petróleo e gás, a última, de tecnologia da informação (TI). Elas valiam US$ 1.5 trilhões de dólares. Hoje as maiores empresas são Microsoft, Apple, Amazon, Alphabet e Facebook, com total de US$ 4.3 trilhões de dólares! Absolutamente todas são empresas de TI!

Ou seja, o valor das maiores empresas triplicou! O que causou isso? Aliás, qual a pergunta subjacente que sustenta essa valorização das empresas? O conjunto de quatro das cinco primeiras têm petróleo, gás, diesel, redes de gasodutos, petroleiros ou campos de petróleo. E as cinco recentes? O que justifica? Que mundo estamos vivendo? 

Eu tenho dito que vivemos uma transição de um mundo concreto para um mundo abstrato. Como assim? Como vimos, até 10 anos atrás, o nosso bem mais valorizado era energia. Sim, fisicamente nós vivemos em um mundo de ondas de calor ou de raios de sol ou da lua. O que faz o motor do carro girar ou o ferro aquecer ou mesmo nossa panela ferver é a quantidade de energia, enfim, são as pequenas ondas que somos capazes de trocar. Esse mundo da energia é baseado em uma partícula que foi identificada há mais de um século, ainda no nascedouro da Mecânica Quântica: o fóton. Ele move o mundo!

Mas hoje vivemos claramente o mundo da informação! Existe alguma partícula que a identifique, como o fóton identifica a energia? Não! A resposta é não! Sinto que minha mão queima com o calor de uma vela que arde, mas o que me faz sentir a informação? Bem, vamos lá.

Uma grande mente do século passado resolveu se fazer essa pergunta. Era a época do nascimento das telecomunicações e o famoso Bell Labs precisava fazer os sinais de rádio e de televisão chegarem às nossas casas – com o máximo de qualidade e, claro, de mínimo custo para a empresa. Eles possuíam em seu grupo uma cabeça extraordinária chamada Claude Shannon.

Ele inventou então uma forma de medir a informação. Abre parêntesis: ele estava fazendo doutorado – bom que se enfatize que pesquisa e pós graduação é que geram conhecimento em um país. Fecha parêntesis. Shannon então definiu de uma forma única o que chamamos de “informação”. Por exemplo, se eu lhe disser qual é seu nome, não há novidade para você, mas há quando eu anuncio a próxima carta do baralho. Informação é uma medida de surpresa!

Sabe o “bit” do computador que você usa? Shannon inventou um jeito de transmitir esses bits de forma eficiente. Ou melhor, deu os limites do envelope que carrega a informação. O mais assombroso foi que ele deu uma solução matemática para medir esses bits. Não vou falar mais sobre isso porque posso perder um leitor deste artigo, mas o que ele criou, ele deu nome de entropia – que é uma medida do tamanho da desinformação – ou desconhecimento – de uma mensagem. Entropia está para informação como o fóton está para energia. Prometo que paro por aqui a matemática.

Quando eu trabalhava em meu Pós Doutorado no Brain Science Institute, em Tokyo, Japão, estudamos a comunicação neuronal. Nossa tarefa era responder a uma pergunta que tem consequências para áreas como a comunicação cérebro–máquina ou cérebro–cérebro: qual a estratégia que um neurônio usa para transmitir informação para os outros neurônios? 

No fundo, essa pergunta já vinha sendo feita desde a década de 40 do século passado. As propostas sempre giraram em torno de a transmissão ocorrer para garantir a maior eficiência energética. Não era! No final, encontramos que a comunicação neuronal partia do princípio de transmitir a maior quantidade de informação. Sabe a entropia que falei acima e disse que não falaria? Pois é, voltei: a entropia é uma medida de “bagunça” ou “confusão”. E o que os neurônios fazem é justamente minimizar a entropia! Qual a base do estudo? A ideia extraordinária de Claude Shannon! 

É nesse novo mundo que estamos assentados! Embora as cinco empresas sejam quase todas diferentes, os países que controlam essas empresas são os mesmos: China ou Estados Unidos. “Não há almoço grátis” - a frase do século 19 imortalizada por Milton Friedman. Países que investem em tecnologia ou se planejam a longo prazo são recompensados em suas estratégias. Nada diferente de uma casa que se organiza. 

Dar aqui uma pequena pausa pra perguntar: o Brasil é protagonista da era da informação ou mero usuário? Ou seja, qual o futuro que construímos hoje para o Brasil de amanhã? Temos caminhos? Estratégias? 

Bem, vejo as apostas das universidades brasileiras sendo corretamente feitas em inteligência artificial ou aprendizado de máquinas, que nada mais são do que processamento, síntese e organização da informação. Também entendo como estratégicos os investimentos do Brasil em biotecnologia. Porque um DNA ou uma proteína são uma coleção de “bits” de informação que nos garante soberania sobre babaçu, mastruz, erva cidreira, casca de caju, própolis e muitos e muitos outros! Em tempo: um grupo de professores teve a iniciativa, há mais de uma década, de fundar um doutorado chamado de Rede Nordeste de Biotecnologia e, como consequência, as universidades do Arco Norte já formaram quase mil doutores nesse ínterim!

Energia é algo que qualquer ser vivente necessita. Planta precisa do sol para fotossíntese, animais da nossa velha glicose e nós de gás para aquecer a comida. A informação é diferente: ela surpreende, informa, entristece ou regozija. Uma carta saudosa, uma poesia de Fernando Pessoa ou uma composição de Mozart, embebidas de sublimidade saciam e iluminam nosso corpo, como uma árvore de Natal que acende todos os nossos músculos! Por isso nos encantamos quando uma gota aquecida pela lembrança cai no coração para amenizar a saudade infinita. Talvez por isso pagamos tão caro! Informação é vida, é o que nos faz humanos!

*Allan Kardec Duailibe Barros Filho, PhD pela Universidade de Nagoya, Japão, professor titular da UFMA, ex-diretor da ANP, membro da AMC, presidente da Gasmar.


 

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