Jovens relatam agressões praticadas por dupla durante ensaio de dança em Monção; entidades de defesa apontam racismo e LGBTfobia
Homens agrediram fisicamente três integrantes de grupo cultural. Vítimas também apontam negligência de hospital e da polícia local.
MONÇÃO – Três jovens integrantes de um grupo cultural relataram que sofreram agressões físicas, como socos e ‘voadora’, no município de Monção na última segunda-feira (31). Após a repercussão nas redes sociais, entidades de direitos humanos pedem medidas para responsabilização dos autores e investigação por suposto racismo, LGBTfobia, ameaça e lesão corporal.
O caso aconteceu no Ginásio Municipal de Monção, durante um ensaio do grupo de dança indígena. Um homem e o filho dele chegaram exigindo a liberação do espaço para jogarem, segundo relato das vítimas.
Os jovens estavam deixando a quadra quando começaram as agressões. “Quando eu estava saindo da quadra, ele me empurra com a mão nos meus peitos. E isso eu revido a ele. Quando eu revido, eles tornam me dar um soco no meu rosto. E quanto eles tão me soltando, o filho dele vem e acerta uma voadora nos meus peitos”, relata uma das vítimas em entrevista à TV Mirante.
Dois amigos tentaram impedir e também contam que foram agredidos. “Tentou me agredir. Inseriu dois socos nos meus peitos. Esse soco deslocou o meu braço esquerdo”, disse um dos amigos. “Tentei intervir, tive fraturas no rosto, na boca e tive os cabelos puxados, me derrubaram no chão, tive os joelhos muito ralados”, contou outro jovem à reportagem.
Ao buscar atendimento médico no município, os jovens relataram também que houve negligência por parte da equipe plantonista. Na delegacia, onde também estavam os agressores, teria havido novamente um descaso, segundo relatos. “Nós chegamos primeiro do que eles, já estávamos na vez e eles chegaram, simplesmente, entraram e passaram metade da tarde. Simplesmente, quando eles saíram, alegaram que o sistema estava fora do ar”, afirmou uma das vítimas.
O grupo Guerreiros de Kamacaoca, do qual as vítimas fazem parte, se manifestou sobre o caso, pedindo justiça.
Em São Luís, os jovens receberam apoio da Defensoria Pública Estadual e registraram o caso na Delegacia de Combate a Crimes Raciais. Eles também fizeram exame de corpo de delito. Diante da situação, o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB) divulgou uma nota de repúdio, classificando como um “ato de violência racista e homofóbica”.
“A omissão no atendimento médico e o constrangimento vivido na delegacia, onde os agressores foram priorizados, agravam ainda mais a violação de direitos que estas vítimas vêm enfrentando”, diz um trecho da nota do MIQCB. Leia na íntegra:
“O Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB) vem a público manifestar seu mais profundo repúdio ao ato de violência racista e homofóbica cometido contra três jovens no município de Monção (MA), na última segunda-feira, 31 de março de 2025. As agressões ocorreram no Ginásio Municipal da cidade, durante um ensaio do grupo de dança do qual os jovens fazem parte, e foram praticadas por um grupo de homens que, além de insultos de cunho discriminatório, partiram para a violência física de forma brutal e covarde.
É inaceitável que em pleno século XXI, jovens — alguns pertencentes a comunidades tradicionais quilombolas e quebradeiras de coco — ainda sejam alvo de ódio racial, homofobia e violência institucional, sendo agredidos por ocuparem um espaço público destinado à cultura, ao lazer e à livre expressão de suas identidades. Reforçamos que manifestações artísticas e culturais são formas legítimas de resistência, identidade e pertencimento, e devem ser protegidas e incentivadas, especialmente entre a juventude negra e periférica.
Denunciamos, ainda, a negligência das instituições locais de saúde e segurança pública, que falharam em acolher adequadamente os jovens após o ocorrido. A omissão no atendimento médico e o constrangimento vivido na delegacia, onde os agressores foram priorizados, agravam ainda mais a violação de direitos que estas vítimas vêm enfrentando.
O MIQCB reafirma seu compromisso com a luta contra o racismo, a LGBTfobia, a violência institucional e toda forma de opressão que atinge nossos jovens, nossos territórios e nossas comunidades. Exigimos das autoridades competentes a imediata responsabilização dos agressores, bem como medidas de proteção e reparação às vítimas”.
No Maranhão, as denúncias relacionadas a crimes raciais subiram de 19 no ano de 2023 para 76 em 2024, segundo dados do Disque 100.
No caso de Monção, a Polícia Civil está ouvindo vítimas, testemunhas e suspeitos. Leia a nota completa enviada pela Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular (Sedihpop):
"A Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular (Sedihpop) esclarece que recebeu a denúncia de racismo e LGBTfobia registrada em Monção e tem acompanhado a demanda, desde a última terça-feira (1). Foi realizada reunião ampliada na Defensoria Pública do Estado (DPE), que contou com as equipes da Sedihpop - a Central Estadual de Apoio às Vítimas (CEAV), a Ouvidoria dos Direitos Humanos, Igualdade Racial e Juventude, Secretaria Adjunta dos Povos e Comunidades Tradicionais e a Coordenação de Políticas para as Pessoas LGBTQIA+, bem como a participação do Conselho Estadual de Políticas LGBTI+ e do Conselho Estadual da Igualdade Racial.
O objetivo da reunião foi ouvir as vítimas e realizar acompanhamento para o registro do Boletim de Ocorrência na Delegacia de Crimes Agrários e Delitos de Intolerância, resultando nos seguintes encaminhamentos:
* Sedihpop e DPE acionaram a Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP) para conhecimento do caso e solicitação de apoio na quadra de esportes para acompanhar as próximas atividades;
* O CEAV está em contato com as vítimas para garantir o apoio psicológico e realizar a triagem para possível acompanhamento pelo Programa de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas (PROVITA);
* A DPE vai direcionar um defensor público à Monção para acompanhar e representar o caso, solicitar o hospital o prontuário das vítimas e verificar a possibilidade de realizar uma ação coletiva;
* Solicitação de pedido de acompanhamento por assistente social para a Secretaria Municipal de Assistência Social; buscar possíveis testemunhas ou outras vítimas; e solicitar esclarecimentos das ações da Prefeitura de Monção sobre o caso e as informações das políticas que o município vem desenvolvendo junto a comunidade LGBTQIA+.
Informa, também, que as denúncias de casos racistas, LGBTfóbicos ou quaisquer violações de direitos podem ser denunciadas na Ouvidoria dos Direitos Humanos, Igualdade Racial e Juventude no WhatsApp (98) 99104-4558.
Por sua vez, a Polícia Civil informa que foram registrados boletins em Monção e na Delegacia de Crimes Raciais, em São Luís.
Informa que as vítimas compareceram à Delegacia de Monção terça-feira (1), dia seguinte ao fato. Por se tratar de um grupo grande de pessoas, alguns foram ouvidos pela manhã e o restante, por conta da demanda, foi necessário agendar para a tarde.
A Polícia Civil informa que segue ouvindo vítimas e testemunhas, além dos suspeitos, e que adotou as providências legais".
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