Nossa Língua Portuguesa
Nossa Língua & outras encrencas (2023), de Ana Elisa Ribeiro, reúne 63 crônicas sobre a Língua Portuguesa, seus mitos e mistérios.
O que seria do mundo sem as palavras? Faladas ou escritas, elas são parte essencial do nosso mundo. Apesar de termos o Português como língua materna no Brasil, quantos de nós refletem sobre ela? Apenas os estudantes e professores de Letras e áreas afins, tais como o Jornalismo? Por que insistem em considerar a Língua Portuguesa como uma das mais difíceis? Essas e outras questões são levantadas e discutidas no livro de crônicas Nossa Língua & outras encrencas (2023), de Ana Elisa Ribeiro.
Ana Elisa Ribeiro nasceu em Belo Horizonte (MG), em 1975. É autora de livros de poesia, conto e crônica, infantis e juvenis, tendo estreado com um volume de poemas em 1997. É bacharel e licenciada em Letras pela UFMG, com mestrado e doutorado em Estudos Linguísticos. Em 2022, celebrou os 25 anos de suas publicações em livros. Algumas de suas obras foram premiadas, tais como o poemário Álbum (Relicário, 2018), que obteve o prêmio nacional Manaus e seu juvenil Romieta e Julieu (RHJ, 2021), que ganhou o Prêmio Jabuti de 2022. A autora já foi citada em uma questão do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).
A produção infantojuvenil de Ana Elisa Ribeiro segue no PNLD, e é reconhecida pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. Além disso, ela também é editora, dirigindo coleções de poesia e prosa. Teve colunas fixas em algumas revistas desde 2003 e publicou quatro livros de crônicas reunidas: Chicletes, Lambidinha & outras crônicas (Escribas, 2012), Meus segredos com Capitu (Escribas, 2013, semifinalista Portugal Telecom), Doida pra escrever (Moinhos, 2021) e Nossa língua & outras encrencas (Parábola, 2023). Atualmente, é professora da rede federal de ensino e pesquisadora das Mulheres na Edição.
Nossa Língua & outras encrencas (2023), de Ana Elisa Ribeiro, reúne 63 crônicas sobre a Língua Portuguesa, seus mitos e mistérios. O livro é dividido em duas partes - “Escrever, falar” e “Ler, revisar”. Logo no início da obra, a autora deixa uma ressalva: por ser linguista, seu papel não é o de prescrever ou dar dicas de português “correto”, mas sim o de argumentar sobre os usos da língua e das linguagens. Assim, são abordados temas como o Novo Acordo Ortográfico, preconceito linguístico, pontuação, revisão, dentre outros.
É perceptível a diferença entre a língua oral e a escrita. Na oralidade, temos mais liberdade, nos adequamos ao contexto. Normalmente, na escrita, há mais formalidade, existem vários critérios a serem seguidos, pois ela é guiada pelas Gramáticas (isso mesmo, no plural, pois existem várias, além da normativa). Ao escrever, um dos critérios que devemos seguir é o Novo Acordo Ortográfico, que tem gerado muitas dúvidas. Por isso, a autora indaga: “Mas quem decidiu isso? Um conselho de donos da língua? Mais ou menos. Certamente não foram as pessoas que usam a língua normalmente, ao rés do chão. Nunca somos nós que decidimos essas regras que terminam por nos afetar” (Ribeiro, 2023, p. 21).
Por outro lado, atualmente, muito tem se discutido sobre o preconceito nas mais diversas esferas e o seu efeito nocivo para a sociedade. Isso é algo positivo, porém, ainda precisamos retirar esses discursos do papel e aplicá-los no cotidiano. Uma forma de violência muito corriqueira, mas subestimada, é o preconceito linguístico. Ele faz com que alguns sotaques e expressões sejam considerados “errados”, feios e estigmatizados (sobretudo no Nordeste. Quem nunca ouviu falar do “sotaque nordestino”? Como se existisse apenas um); enquanto outros falares são tidos como “corretos”, bonitos e prestigiados. No entanto, não “está correto porque é o correto, intrinsecamente, mas porque é a prática de certo grupo, normalmente o hegemônico. [...] E mais grave: qual seria a língua certa? Já imaginaram quem colonizaria os outros? Eu tenho cá minhas suspeitas, já que tudo está ligado a poder e disputas simbólicas, quando não, financeiras” (Ribeiro, 2023, p. 23-25).
Não existe uma fala superior a outra, “melhor” ou mais “correta”. Assim como o povo brasileiro, miscigenado por natureza, nossa Língua Portuguesa é diversa. “Somos, afinal, glossários ambulantes, dicionários vivos, tradutores compulsórios” (Ribeiro, 2023, p. 87). Outro ponto amplamente debatido no referido livro é a importância das palavras e sua onipresença no mundo. Conforme Ana Elisa Ribeiro: “Palavra não é qualquer coisa. Palavra não é definitiva. Palavra diz, desdiz e desvia. Palavra engana. Palavra desmente. Palavra pode ser incisiva e pode disfarçar. [...] Escolher palavras é importante” (2023, p. 33). Uma simples palavra pode mudar tudo, por isso, precisamos aprender a pensar sobre a nossa língua materna.
Talvez um falante nativo não consiga perceber a dimensão da Língua Portuguesa em sua vida. É com esse idioma que pensamos, concordamos, amamos, odiamos, negamos, falamos e escrevemos. Somos bombardeados pela escrita todos os dias: ela está nos letreiros, nos jornais e revistas, nas bulas de remédio, nas placas, nos produtos do mercado; é necessária para tirar a habilitação, etc. Quem não é alfabetizado, infelizmente, acaba ficando à margem de tudo isso, enfrenta várias dificuldades. A escrita “atravessa tudo, fixa ou materializa tudo, avança sobre os discursos, manipula e estipula, muita coisa. Quanta coisa ela é e ela faz” (Ribeiro, 2023, p. 121).
Segundo Mariana Ianelli (2023), essa forma de encarar a língua como algo intrínseco a nós é uma forma de transgressão: “Transgredir também é coisa que se aprende. Transgredir pela inteligência do coração, ter olhos para a margem de mistério que as línguas guardam, avidez (ou febre) de ler, falar ou escrever com o movimento da vida, a pele salgada e doce da vida, essa vida irrequieta que manuais e cartilhas costumam encurralar. A prescrição, portanto, aqui, não é normativa, mas poética: leiam Ana Elisa Ribeiro, que o coração se afina com a língua e os ouvidos se apuram na delícia de quanto podem as palavras” (p. 13). Nossa Língua & outras encrencas (2023), de Ana Elisa Ribeiro, é um livro leve, divertido e enriquecedor. Portanto, é uma leitura fundamental não somente para os estudantes e professores de Letras e áreas afins, mas também para todo e qualquer falante da nossa querida Língua Portuguesa.
REFERÊNCIA:
RIBEIRO, Ana Elisa. Nossa Língua & outras encrencas: crônicas. 1. ed. São Paulo: Parábola, 2023.
Nossa Língua & outras encrencas está disponível para venda no site da Parábola Editorial: https://www.google.com/amp/s/www.parabolaeditorial.com.br/nossa-lingua-e-outras-encrencas%3fuseamp=1
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