Nordeste: a história de um voo
Crônica DESTAQUE na antologia Nordestes, organizada pela editora Selo Off Flip (Paraty – RJ), em 2023.
Há um antigo mistério que sobrevoa os céus, acerca do qual, no entanto, a ciência moderna já oferece melhor compreensão. Quem nunca se encantou, ao mesmo tempo em que se questionou, ao contemplar um bando de aves, rasgando o azul do firmamento, num orquestrado e simétrico voo em “v”?
As aves migratórias, em busca de melhores condições de vida, para si e seu bando, costumam deixar para trás ambientes que se tornaram insuficientes para garantir suas necessidades, partindo, então, em busca de novos territórios, onde possam encontrar áreas quentes, com fartura de alimentos e o conforto de dias mais longos.
Essas migrações, no entanto, estão longe de serem fáceis. As viagens costumam ser longas, cansativas e perigosas, demandando, então, muito planejamento e apurada inteligência para lograrem bom êxito. A beleza do voo em “v”, que tanto nos encanta e que contemplamos apenas à distância, daqui de baixo, portanto, na verdade, trata-se de refinada estratégia, não apenas para a sobrevivência, mas, sobretudo, para o alcance de um objetivo em comum da revoada.
A ave que voa à frente do bando quebra a resistência do ar, proporcionando, assim, menor gasto de energia aos seus pares que voam logo atrás, num bater de asas ajustado em perfeita sintonia. Tão sofisticado é esse mecanismo que um sistema de rotatividade garante que algumas aves revezem o papel de assumir a frente do bando, recebendo, então, sobre si, maior impacto e, consequentemente, maior desgaste, ocasionado pelos fortes ventos, enquanto a ave que estava à frente agora descansa para, assim, recuperar as energias.
Nós, nordestinos, ao longo de uma história marcada por contradições, temos sido guiados por pessoas que, assim como as aves, têm se mostrado fortes e perspicazes. Nesse sentido, nosso “bando” tem sido conduzido em uma jornada para sair de um lugar aquém de nossas potencialidades, em áreas como artes, ciências, política, etc., e, assim, ir em direção a novos territórios, onde os sonhos possam encontrar solo propício para que se tornem reais.
Estamos em meio a uma longa viagem e, daqui de cima, podemos ver pessoas contemplando nosso “voo em v”, se encantando e questionando como isso é possível. Voar juntos é a única maneira de não sucumbirmos aos ventos que antecedem glórias.
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