Artigo

O amor à vida

José Jorge Leite Soares, Ex-deputado estadual, membro da Academia Pinheirense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão

Atualizada em 11/10/2022 às 12h20

É nas adversidades que se observam as oportunidades e que ocorrem as grandes transformações. Estamos atravessando um período de grandes incertezas ao lidarmos com um inimigo desconhecido.

Ao longo da história, epidemias surgiram, afetaram o funcionamento da sociedade, dizimaram parte da população, porem o ser humano sempre soube dar a volta por cima, se reinventar e sair vitorioso adequando-se ao pós-pandemia.

O período de confinamento, uma medida utilizada até os dias de hoje no enfrentamento das grandes epidemias, faz com que a espécie humana evite grandes aglomerações e se proteja.

No século XIV, em Florença, a peste negra chegou a dizimar quase metade da população. Nessa época, enquanto a cidade explodia em degradação física e moral, um dos grandes escritores italianos, Giovanni Boccaccio inspirou-se na pandemia para produzir um dos grandes clássicos da literatura mundial - Decameron.

É dele, a descrição do quadro de calamidade que assolava a cidade, até então uma das mais prósperas e efervescentes da Itália. “... Maior era o espetáculo da miséria da gente miúda e, talvez, em grande parte da mediana; pois essas pessoas, retidas em casa pela esperança, ou pela pobreza, permaneciam na vizinhança, adoeciam aos milhares... [...] várias expiravam na via pública, de dia e de noite...”

Diante desse cenário ameaçador, dez jovens se encontram, dentre eles três rapazes e sete moças, e decidem fugir da pestilência buscando retiro em uma propriedade na área rural, recriando um ambiente propício ao exercício literário. Boccaccio relata o dia a dia desses jovens, que se protegem da Peste, ao ocupar suas mentes fazendo narrativas que abordavam temas como a sorte, a morte, o poder, a riqueza, e, é lógico, o amor. Durante dez dias, diariamente, cada um dos jovens contava uma história abordando um tema diferente.

Quase seis séculos depois, Gabriel Garcia Marques registra em seu primoroso romance, O Amor nos tempos do Cólera, uma belíssima história de amor vivenciada no final do século XIX, nos tempos de Cólera.

A paixão de Florentino, um humilde telégrafo, por Fermina, sobrevive durante mais de 50 anos. Uma longa espera que só termina com a morte de Juvenal com quem havia casado cinco décadas atrás. Dr Juvenal Urbino havia retornado da Europa, como médico especialista, e dedicou-se com fervor à tarefa de combater o Cólera. Foi vitorioso, contribuiu para o extermínio da pandemia e tornou-se homem de grande reputação em toda a Colombia.

Mas, a morte está sempre à nossa espreita. Na vida, a morte é a única certeza. E o dr. Juvenal veio a falecer em decorrência de uma queda. Subiu no telhado para pegar um papagaio e de lá caiu para encontrar seu inevitável destino. Meio século após tamanha espera, Florentino toma Fermina em seus braços e realiza o grande sonho de sua vida.

Aqui em São Luís, o dr. Douglas Martins acatou a denúncia do Ministério Público e foi ao encontro dos desejos do governador Flavio Dino sentenciando a implantação do lockdown na Ilha do Amor. Todos confinados em casa. Uma ou outra saída, apenas de for em caso de extrema necessidade e muito bem justificadas.

E não é que recebi, durante esta semana, por parte do presidente da Academia Maranhense de Letras, um chamado para comparecer à uma reunião presencial, lá na Casa de Antônio Lobo, no Centro histórico da cidade, para tratarmos da finalização de um livro de depoimentos que estamos organizando em homenagem aos 90 anos do presidente José Sarney!

Tenho mais medo do Corona vírus do que das Curacangas que me assustavam nos meus tempos de infância em Pinheiro...

Agradeci ao convite, ao explicar que tenho muito medo da morte e justificar que eles, sim, podem fazer essas reuniões. Afinal, são todos imortais.

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