A violência contra a mulher e contra LGBTs é uma triste realidade brasileira. Um caso chamou a atenção de muitos maranhenses nesta semana, quando uma professora da UFMA, do campus de Grajaú, expôs nas redes sociais que vem sofrendo ameaças e assédios via aplicativo de mensagens. Mulher e lésbica assumida, a professora, que preferiu não ter identidade divulgada por questões judiciais, já registrou ocorrência na Delegacia de Grajaú, mas o processo se mantém andando em passos lentos.
“Tenho recebido mensagens de ódio, fotos de genitálias masculinas […]. Tenho temido pela minha vida. Se eu for estuprada ou assassinada, já estou deixando meu desabafo”, diz a publicação. O Estado conversou com a professora, que contou que tudo começou após as eleições. Ela se manifestava a favor do candidato concorrente do atual presidente e a favor das minorias, principalmente os LGBTs.
“Dei início ao processo e identificaram um número, que pertencia a uma mulher que ia ao mesmo grupo de orações que eu frequentava. A mulher foi chamada para depor e foi com um advogado, falando que roubaram os dados do CPF dela pra cadastrar o chip”, conta.
Hoje eu ando em pânico. O processo está rolando, mas outros números continuam me enviando mensagens em tom de assédio e ameaças e fotos de órgãos masculinos”Vítima de assédio, professora da UFMA em GrajaúA professora diz, ainda, que no início das mensagens o criminoso utilizava a foto de uma mulher desconhecida. Após pesquisas no Google, a professora descobriu que a jovem da foto foi assassinada pelo ex-marido em dezembro de 2016, na cidade de Niquelândia, em Goiás. “Hoje eu ando em pânico. O processo está rolando, mas outros números continuam me enviando mensagens em tom de assédio e ameaças e fotos de órgãos masculinos”, frisa.
Um agravante da situação foi o diagnóstico de quadro de depressão e transtorno de ansiedade generalizada na professora. “Depois desses episódios, desenvolvi automutilação. Já procurei ajuda psicológica, mas a situação ainda é difícil”, finaliza.
Solidariedade
Nas redes sociais, a professora vem recebendo mensagens de apoio de pessoas de todo o estado. “Repudio qualquer forma de agressão e cerceamento da liberdade da pessoa expressar sua orientação sexual da forma que for. Vivemos em uma sociedade em que o ódio e a violência são estimulados, inclusive sobre o aval de ideologias de instituições que deveriam ser inclusivas, mas onde algumas pessoas não seguem uma cultura de paz para com o diverso”, diz uma das publicações.
“É preciso dar um basta nisso! Não podemos deixar que casos assim sejam naturalizados, que sejam invisíveis diante órgãos públicos, que calem nossa voz e que nenhuma mulher seja violentada, seja por sua orientação sexual ou pelo simples fato de ser mulher”, diz outra mensagem, publicada pelo coletivo Juntas.
Caso de polícia
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O Estado conversou com Susan Lucena, diretora da Casa da Mulher Brasileira. A advogada explica que o caso específico da professora de Grajaú pode passar despercebido pelo fato da região não ter nenhuma delegacia ou órgão atuante aos direitos da mulher ou LGBTs. “A delegacia em que a professora prestou ocorrência deve ser a responsável primária em cima do caso, mas isso não impede que nós, junto à Defensoria, entremos com medidas que acelerem e ajudem no processo judicial”, diz. Por se tratar de uma lei única, os juízes e promotores da delegacia de Grajaú têm a competência de atuar nesses casos.
Depois desses episódios, desenvolvi automutilação. Já procurei ajuda psicológica mas a situação ainda é difícil”Vítima de assédio, professora da UFMA em GrajaúA Casa da Mulher Brasileira possui um Núcleo de Defesa da Mulher e da População LGBT, que tem à sua frente a defensora pública Lindevanea Martins. Ela explica que o caso da professora pode ser tratado como crime contra mulher e, em breve, como crime homofóbico. “Nós temos mensagens de cunho lesbofóbico sendo enviadas para a professora, assim como temos mensagens de cunho machista, que insinuam que ela é lésbica porque nunca teve uma relação sexual de verdade. Isso nós chamamos de estupro corretivo e é um dos crimes mais comuns no Brasil em que vivemos”, explica a defensora.
Lindevanea Martins esclarece que mesmo com o procedimento criminal em andamento, buscando demais envolvidos no envio das mensagens de ódio, a professora já pode iniciar uma ação cível contra uma suspeita identificada pela polícia. “O processo contra essa pessoa, pelos danos materiais e morais advindos dessa violência psicológica, deve ser feito”, elucida. O Ministério Público e a delegacia de Grajaú foram acionados pela diretora da Casa da Mulher Maranhense, com o objetivo de acelerar o processo.
Atendimentos no Maranhão
A Casa da Mulher Brasileira registrou, em pouco mais de um ano de existência, quase 30 mil atendimentos iniciais. A unidade, localizada no Jaracati, reúne diversos órgãos e entidades de referência do Município, Estado, Justiça e Sociedade Civil Organizada. A casa funciona todos os dias, 24 horas.
O espaço atende casos de violência doméstica familiar e de estupro e faz encaminhamento aos órgãos de referência. Promove, ainda, ações de geração de emprego e renda, a partir dos serviços do Sine Mulher. Em média, 20 atendimentos na Delegacia da Mulher da capital são registrados diariamente. A maior parte dos casos ocorre nos fins de semana, principalmente aos domingos, sendo os autores, geralmente, homens próximos à mulher – pai, tio, irmão e companheiros ou ex-companheiros.
SAIBA MAIS
Violência contra LGBTs e contra a mulher
A cruel realidade da violência homofóbica e feminina no Brasil pode ser datada em números. No nosso país, a cada 19 horas uma pessoa LGBT morre, além de ser o país que mais mata travestis e trans em todo o mundo. De 130 homicídios em 2000, saltou para 260 em 2010 e para 445 em 2017.
Sobre o feminicídio, o Brasil está em 5º lugar no ranking mundial, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas pra os Direitos Humanos (ACNUDH). O país só perde para El Salvador, Colômbia, Guatemala e Rússia em número de casos de assassinato de mulheres. Em comparação com países desenvolvidos, aqui se mata 48 vezes mais mulheres que o Reino Unido, 24 vezes mais que a Dinamarca e 16 vezes mais que o Japão ou Escócia.
O Mapa da Violência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra que o número de mulheres assassinadas aumentou no Brasil. Entre 2003 e 2013, passou de 3.937 casos para 4.762 mortes. Em 2016, uma mulher foi assassinada a cada duas horas no país.
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