Brasília - Os ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), votaram ontem a favor do direito de transexuais usarem banheiros conforme sua “identidade de gênero”, ou seja, como se percebem (homem ou mulher), independentemente do sexo a que pertencem.
O julgamento, porém, foi interrompido por um pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) do ministro Luiz Fux. Faltam ainda os votos de outros nove ministros para uma decisão final, ainda sem data para ocorrer.
Relator do caso de uma transexual barrada no banheiro feminino de um shopping em Santa Catarina, Luís Roberto Barroso também votou favoravelmente a restabelecer uma indenização de R$ 15 mil por danos morais sofridos na ocasião. Fachin também votou pela indenização, mas por um valor maior (R$ 50 mil).
No caso levado à Corte, a transexual argumentou que, após ter sido impedida de entrar no banheiro feminino, não conseguiu evitar e defecou nas próprias vestes, tendo depois de voltar para casa em transporte público.
A decisão do STF, sobre o direito de transexuais serem tratados socialmente de acordo com sus identidade de gênero, deverá orientar ao menos outros 778 processos semelhantes parados na Justiça.
Debate - Durante o julgamento nesta quinta, a advogada da transexual, Ama Fialho, defendeu o direito de ela “ser o que é e ser reconhecida pelo que é”.
“Quando se discute se uma transexual pode ou não fazer uso do banheiro feminino, ou seja, do banheiro pertencente ao gênero com o qual se identifica está se discutindo ainda seu direito à identidade e à autodeterminação sexual, à honra, à intimidade e à privacidade. Está se discutindo se essa mulher e tantas outras e outros na mesma situação têm ou não o direito de viver sem marginalização invisibilidade social”, disse a advogada Isabela Gonçalves da Silva.
Defesa - Representando a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros (ABLGT), o advogado Paulo Roberto Iotti Vecchiatti defendeu a transexual em atenção ao princípio da “dignidade da pessoa humana”, sobretudo em relação a minorias.
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“O princípio da dignidade humana garante o direito à autonomia moral para viverem suas vidas como bem entenderem, desde que não prejudiquem terceiros. É um direito de liberdade. Não prejudica ninguém a pessoa se identificar ou viver como LGBT, como lésbica, gay, bissexual, travesti ou transexual. As identidades trans não prejudicam ninguém”, afirmou.
Relator do caso, Luís Roberto Barroso afirmou que dignidade é um valor “intrínseco” a toda e qualquer pessoa, sendo dever do Estado garantir sua efetividade conforme as escolhas de cada um.
“Nenhuma pessoa é um meio, todas as pessoas são um fim em si mesmas, ninguém neste mundo é um meio para satisfação de metas coletivas ou para satisfação das convicções ou dos interesses dos outros”, disse o ministro, parafraseando o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804).
Constrangimento - Ao analisar o caso concreto, ponderou que o “suposto constrangimento” causado às demais mulheres num banheiro feminino pela presença de uma transexual “não é comparável ao mal estar” suportado por ela se tivesse que usar o banheiro masculino.
“Imagine-se o desconforto que teria uma pessoa como a Roberta Close ou uma pessoa como a Rogéria se forem obrigadas a frequentarem um banheiro masculino, que seria uma agressão à natureza dessas pessoas, uma agressão à identidade dessas pessoas, ao modo como elas se percebem, ao modo como elas vivem as suas vidas”, exemplificou.
Ao pedir vista do processo, o ministro Luiz Fux justificou que, na análise de temas com “desacordo moral tão expressivo” que dividem a sociedade, é preciso mais tempo para uma decisão definitiva do Supremo, citando “indagações populares” sobre a questão.
“Imagine como ficará o pai mais conservador que tem uma filha, sabendo que ela está numa escola e qualquer pessoa com gênero idêntico ao dela vai poder frequentar o mesmo banheiro que a filha”, afirmou, acrescentando existirem pessoas que se vestem de mulher para praticar pedofilia ou abuso sexual, por exemplo.
Presidente da Corte, o ministro Ricardo Lewandowski, sem manifestar sua posição, também se disse “preocupado” com a decisão. “Eu fiquei um pouco preocupado também com a proteção da intimidade e da privacidade de mulheres e crianças do sexo feminino que estão numa situação de extrema vulnerabilidade tanto do ponto de vista quanto psicológico quando estão no banheiro”, afirmou.
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