COLUNA

Ruy Palhano
Ruy Palhano é médico psiquiatra.
Ruy Palhano

Ódio, o veneno da alma

O ódio é um sentimento ameaçador, assustador, repentino e devastador. É designado como uma aversão intensa, fúria, raiva, rancor ou ira.

Ruy Palhano

Atualizada em 02/05/2023 às 23h50
Ruy Palhano é médico psiquiatra (Ipolítica)

O ódio é um sentimento ameaçador, assustador, repentino e devastador. É designado como uma aversão intensa, fúria, raiva, rancor ou ira. Etimologicamente, se origina no latim “odium” e significa uma profunda aversão, quiçá perversão. O ódio, é um sentimento explosivo, por isso mesmo cega, imobiliza, cerceia e aprisiona quem o sente. As pessoas submetidas ao ódio, por mais fugaz e passageiro que seja, torna-se obnubilada (estreitamento da consciência), ofuscada e passa a perceber as fatos e circunstâncias de forma alterada. Ocorre, em geral de forma repentina e inesperada, alterando a percepção cognitiva, emocional e racional da pessoa. Suas atitudes, submetidas ao ódio, se tornam subordinadas a essa reação. 

É um sentimento devastador e uma das mais repudiadas reações humanas, por isso mesmo, condenado e rejeitado por todos. O ódio, causa repulsa, aversão e medo. Do ponto de vista psicológico, moral e social é um sentimento profundamente abominado. Está intrinsecamente inserido no amplo repertório das reações afetivas humanas, e entre as mais antigas, em nosso desenvolvimento filo e ontológico. Percebe-se sua presença, em todas as etapas do desenvolvimento humano, ele quando se manifesta é sempre da mesma forma, variando apenas a intensidade, os motivos que podem desencadeá-lo e os aspectos socioculturais onde ele ocorra.

O ódio pode explicar a violência social, os graves conflitos interpessoais que ocorrem na família, no trabalho, na política, nas relações internacionais e ser motivo de muitos desentendimentos domésticos, os quais podem resultar em crimes. Com reação emocional e humana o ódio pode estar presente em muitos contextos. Com fenômeno comportamental se baseia em destruir algo ou alguém por motivos, raramente justificável.

As manifestações de ódio, ocorrem através de insultos, agressões físicas, ofensas verbais, discursos de ódio, descriminações, intolerâncias, antipatia, repugnância e através de muitas outras formas de comportamentos. Muitos dos desfeixes originários dessas reações de ódio, são impulsivas, automáticas e irreflexivas. 

Hoje em dia, não é raro vermos nas mídias sociais, os noticiosos, as TVs, jornais, revistas e em outros meios de comunicação, anunciarem manifestações de ódio disseminadas na vida comunitária e social. A violência, se banalizou, e nunca se cometeu tantos crimes quanto se comete hoje e, sobretudo por motivos banais, brutais, inexplicáveis. A revolta, o medo, a desesperança, a crueldade, a passionalidade se unem revelando o total fracasso da conquista do bem-estar psicológico, social cultural. A revolta e a indiferença afetiva se disseminam, construindo a designada “banalização do crime” e isso torna a vida das pessoas insegura, insípida e inóspita. 

São múltiplas as causas desse sentimento: frustração pessoal ou social, irrealização pessoal, fracasso econômico, doenças mentais, perdas profundas, problemas psíquicos e emocionais, frustrações amorosas e existenciais, doenças neurológicas, uso de álcool e outras drogas, etc. Há, ainda, um aspecto motivacional importante sobre o ódio que é a genética, onde fatores endógenos e hereditários podem predispor algumas pessoas a reagirem de forma furiosa, às vezes, por motivo torpe e inexplicável. 

O ódio, do ponto de vista comportamental e fenomenológico, é um sentimento de repulsa primitivo e se origina das partes ancestrais do desenvolvimento do cérebro humano, isto é, das estruturas antigas do nosso desenvolvimento filo e ontogenético, por isso mesmo, tais manifestações de raiva e fúria, contrastam-se com os comportamentos racionais, originários das partes mais recentes do desenvolvimento do cérebro humano, os quais refletem o legado da civilização contemporânea.

As bases fisiológicas ou fisiopatológicas, do ódio são explicadas pela neurociência, que, embora não se tenha o pleno conhecimento sobre essas bases, há muitos estudos que demonstram, que é em cérebro a base neuroanatômicda e neurofuncional dessa vivência. Há um circuito cerebral subcorticdal denominado de “circuito do ódio” dentro do qual, uma série de estruturas nervosas se interarticulam para expressar emocional e comportamentalmente esse sentimento. 

Estruturas neuro funcionais do cérebro, tais como: giro frontal medial, o putâmen direito, o córtex pré-motor, córtex frontal e ínsula medial, em conjunto, exercem papeis relevantes na expressão afetiva, emocional e comportamental do ódio. Cada uma dessas estruturas se encarrega de intermediar reações específicas observadas nesses comportamentos. 

Outro aspecto importante, relativo às vivências enfurecidas é o mal-estar geral e difuso que a pessoa apresenta, tanto física quanto psiquicamente, em razão da explosão desse afeto. Nessa ocasião, todo o organismo entra em ebulição, se prepara inteiramente para a agressão e para a defesa. Há uma mobilização de mecanismos fisiológicos, bioquímicos, neuroquímicos e endócrinos, simultaneamente, para expressarem essa condição.

O corpo todo se prepara para tal situação. Há um total descontrole emocional, afetivo, cognitivo e da própria consciência, de forma imediata e transitória. Isto é, os efeitos máximos da expressão do ódio estão no interior do próprio sujeito que a experimenta. Portando, a primeira repercussão que se verifica na expressão desse sentimento explosivo, é na própria pessoa, isto é, as consequências diretas ocorrem no corpo e na mente de quem o sente. 

Portanto, quem odeia sente no corpo e na alma, toda as transformações psicofisiológicas e comportamentais devido à explosão desse sentimento. O organismo, se mobiliza, para enfrentar e destruir aquilo que supostamente lhe ameaça. O coração, os pulmões, as glândulas, os músculos, a pele, o fígado, os rins, a visão a pressão arterial, em fim todos os órgãos e sistemas biológicos e cerebrais se mobilizarão em bloco para aquela finalidade. 

Do ponto de vista psicopatológico as condições clínicas, que mais facilmente apresentam manifestações de raiva, são: Transtorno Explosivo Intermitente - TEI, Transtorno de Personalidade Antissocial - TPAS, episódio maníaco, surto psicótico agudo, depressão severa, demência senil, Doença de Alzheimer, Epilepsia de Lobo Temporal, intoxicação alcoólica aguda, embriagues patológica, intoxicação aguda por uso de outras drogas. Cada uma dessas condições clinicas, revelam a fúria de diferentes motivos e razões, muito embora, o padrão neurofuncional da resposta afetiva e emocional seja sempre a padronizada.

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