Líbano no Maranhão

Libaneses e descendentes se estabelecem, mas sentem saudade

A partir do século XX, a Ilha de São Luís contou com a presença maior de libaneses que se estabeleceram principalmente na atividade comercial

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h19

[e-s001]São Luís - São Luís registrou, ao longo da história, a influência de diferentes populações. Desde os franceses, passando pelos portugueses e, com menor frequência, os holandeses, a cidade tem elementos que suscitam a presença destes e outros povos. A partir do século XX, a Ilha também contou com a presença maior de libaneses que se estabeleceram principalmente na atividade comercial. Em vários casos, libaneses de origem buscavam refúgio na cidade para fugirem dos horrores das guerras locais.

Em determinados momentos da história, a notoriedade adquirida por determinados libaneses foi tamanha que muitos foram sondados para compor cargos públicos. Com investimentos e visão a médio e longo prazo, os libaneses permaneceram no território ludovicense e, mesmo distantes da pátria querida, mantém a saudade acesa e o amor ao território asiático.
Ainda que com parentes no Líbano, O Estado buscou, nas últimas semanas, conversar com alguns libaneses radicados na cidade. Com famílias estabelecidas, a maioria não pensa em voltar para casa. A importância do Líbano para a formação histórica da cidade é reconhecida por nomes importantes.

Citação ao Líbano “assolado” pela guerra
Em seu artigo semanal publicado na edição impressa de O Estado dos dias 8 e 9 de agosto deste ano e intitulado “O Sofrido Líbano” o ex-presidente José Sarney faz alusão ao acidente mais recente, ocorrido na cidade de Beirute (capital Libanesa) e ainda à sua ligação pessoal com o país.

No texto, Sarney cita Antônio Dino – que foi seu vice-governador. De acordo com Sarney, Dino contou a ele “uma parte dessa saga da imigração libanesa dizendo que no início do século XX alguns refugiados políticos, seus ancestrais e muitos outros, vieram para o Maranhão, principalmente para o interior”.

Ainda no texto, o ex-presidente e ex-governador maranhense cita que ele mesmo “tem dentro de casa os Murad e os Duailibe”, além de netos, genros e outros descendentes. Sarney lembrou ainda da relação de sua biografia com o Líbano. Segundo ele, quando o romance “O Dono do Mar”, de sua autoria, fora traduzido para o árabe, houve o convite para ir à Beirute e prestigiar o lançamento da obra.

À época, segundo Sarney, a cidade havia saído da guerra civil e estava com um cenário “de destruição”, fazendo uma espécie de ligação histórica com o atentado sofrido por Rafik Hariri , ex-primeiro ministro libanês morto em 2005 e cujo fato é considerado histórico no país, semelhante aos atentados, para os norte-americanos, em 11 de setembro de 2001.

A influência política dos descendentes libaneses
Com a notoriedade adquirida por famílias do país, a partir da segunda metade do século XX na capital maranhense, alguns representantes da população do país do oriente passaram a ser cortejados para cargos públicos dando, desta forma, suas contribuições para os ludovicenses em geral.

Um deles foi Alfredo Salim Duailibe – filho de Salim Nicolau Duailibe, nascido no território libanês e que, em meados de 1955, teve o seu nome ligado nos movimentos eleitorais à época. Reportagem de “O Combate” datada de 14 de junho de 1955 (uma terça-feira) cogitava para a sucessão do então governador da época, Eugênio Barros, o nome de Alfredo Salim Duailibe. Segundo o texto, 30 municípios do estado “haviam se manifestado na ocasião a favor da indicação”.

Ainda de acordo com a reportagem, os deputados José Sarney Costa, Raimundo Rodrigues, Pedro Braga Filho, Eusébio Martins Terra e Erasmo Dias estavam “dispostos” a sufragar nas urnas o nome do dr. Alfredo.

Em 1956, Alfredo Salim foi eleito vice-governador maranhense na gestão de Newton Bello, entre os anos de 1961 e 1966, dando a contribuição libanesa para a sociedade local. Ele foi ainda secretário do Interior e Justiça do Maranhão do governo Pedro Neiva de Santana e suplente do senador Alexandre Costa.

Além de político, no exercício da medicina, Alfredo Salim também se destacara. Era um profissional conhecido pela prestatividade e respeito aos pacientes.

Os libaneses que adotaram São Luís como terra natal e não esqueceram a saudade
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que 7.075.181 pessoas vivem atualmente no território maranhense. Porém, não há levantamento específico acerca dos descendentes libaneses no estado. Estima-se que a maior parte esteja concentrada na capital, São Luís, por onde aqui estão fixados e constituíram uma ou mais gerações.

Alguns grupos estão concentrados em áreas como Vinhais, Calhau e Renascença. Outras famílias, anteriormente nas décadas de 1970 e 1980 se estabeleceram em bairros como São Cristóvão, por exemplo, e, em seguida, migraram para outros distritos da cidade.

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Dentre as famílias aqui presentes, está a de Maria Wassouf Fiquene. Orgulhosa de ser libanesa, ela e outros irmãos, e a partir da iniciativa do pai, Brahim Fiquene, se mudaram do Líbano para o Brasil.
Segundo ela, inicialmente a família buscou refúgio na capital paulista. Por questões logísticas e a partir de convites de outros grupos de libaneses que já residiam, os Wassouf vieram para São Luís. “Nos estabelecemos e logo tivemos que lidar com algumas dificuldades, como a língua e o choque cultural, por exemplo”, disse.

A “fuga” do território libanês coincidiu com os conflitos internos entre população local e israelenses, para controle de fronteira. Os confrontos entre as duas nações se acirraram no início da década de 1980. Libaneses eram, inclusive, recrutados para compor o exército israelense. “Um dia, eu e meus irmãos, ainda crianças, permanecemos isolados em uma escola na região de Beirute que testemunhava mais um confronto. Foi digamos a gota d’água para que nossa família definisse pela vinda ao Brasil”, afirmou Maria Fiquene.

“Parecia que nosso sangue era diferente”, diz libanesa residente na capital
As dificuldades para adaptação de sua família no Brasil e, em especial, no Maranhão não desanimaram a família de Maria Fiquene. Ela e os irmãos receberam formação maranhense, mas mantinham – sob a batuta do pai – as raízes da terra natal. “Em casa, a gente falava árabe. Na escola, as pessoas perguntavam até se o nosso sangue era diferente. Foi um choque grande vir estudar aqui”, lembrou a libanesa.

A manutenção da cultura própria era um orgulho e, ao mesmo tempo, um princípio do pai, Brahim (ou Ibrahim em árabe) Fiquene e da mãe, Samia Fiquene. Foi graças aos dois que Maria e os demais irmãos permaneceram no país. “Eu amo o Maranhão, é também a nossa terra, claro. Mas eu sinto muita falta da minha Líbano querida, a quem levo no meu coração”, afirmou.
O sentimento é o mesmo dos seus irmãos, Anis e George Fiquene. “Claro que nós amamos o Brasil e essa terra maranhense maravilhosa. Mas o libanês, ainda que deixe seu país, leva consigo um amor pelo país único”, disse George.l

[e-s001]“Quando fui um dia ao Líbano, quase não voltei, por opção”

As memórias de uma das inesquecíveis viagens para o Líbano, terra dos descendentes de Galvani Sauaia por pouco não o fizeram permanecer no país. “Fiquei em uma casa cujos costumes lembravam demais hábitos de vida de minha mãe, por exemplo”, disse o médico Galvani Sauaia, cuja família (em especial de parte de mãe) veio ao Maranhão e fixou moradia na cidade de Rosário (distante 46 quilômetros da capital).

Após estudos, Galvani constituiu família em São Luís. No entanto, quando pode, visita a terra dos seus parentes. “Viajo constantemente ao Líbano, quando posso. Tinha viagem programada para este ano, mas fomos impedidos por esta pandemia”, afirmou.

Ele não vê a hora de retornar ao país. “Por pouco não fui para o Líbano trabalhar após o episódio da explosão em Beirute. Vi que meu povo estava precisando. Mas fui convencido de permanecer. Quando fui em uma das viagens para a Líbano, quase não voltei, por opção. Quem vai, pensa em não voltar”, disse Sauaia, quase sempre acompanhado por sua “sobrinha-filha”, Thaysa Halima.

Thaysa, inclusive, tem uma meta: morar em definitivo no território libanês daqui a alguns anos. “Tenho esta meta. Por enquanto, faço a minha carreira no Maranhão, mas espero realizar este sonho”, afirmou.

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[e-s001]“Aqui o cenário é de mais calmaria”

O Estado conversou com Natalie Wassouf Fiquene, irmã de Maria Fiquene (libanesa), que mora há alguns anos em Beirute, e presenciou todo o horror do pós-explosão na região portuária de Beirute, no início deste mês.

Segundo ela, a situação neste momento no país é de mais calma. “Nos primeiros dias após a explosão, o quadro era de absoluta tensão, já que a população aproveitou o episódio para reivindicar questões voltadas à política local”, disse.

No dia da explosão, segundo ela, o governo libanês havia flexibilizado o conjunto de regras que, até então, obrigava as pessoas a permanecer isoladas devido ao coronavírus. “Então, posso afirmar que a tragédia poderia ter sido ainda maior, pois várias pessoas que poderiam estar nas áreas residenciais no entorno da explosão haviam saído”, disse Natalie.

Nos últimos dias, a explosão – cujas razões são creditadas preliminarmente ao governo local – gerou uma série de fatos que instabilizaram o país, dentre eles, a renúncia do então primeiro-ministro, Hassan Diab, oficializada no dia 10 deste mês. Outros membros do governo libanês também foram destituídos e geraram uma série de protestos no país por ruas e avenidas, no que se chamou entre os populares de “Dias da Ira”.

Até o momento, 16 pessoas foram presas, incluindo um dos responsáveis pelos procedimentos alfandegários da estrutura portuária onde ocorreu a explosão. De acordo com as primeiras investigações, o armazenamento de 2.750 toneladas de nitrato de amônio por seis anos sem a segurança necessária pode ter provocado a explosão.

No dia do acidente, Natalie estava distante de onde mora, há alguns quilômetros do local da explosão. “Estava a pelo menos uma hora do local e ainda assim foi possível ouvir a explosão. Não sabíamos num primeiro momento o que havia provocado toda aquela situação. Nossos parentes, a todo instante, ligavam do Brasil pedindo informações. Foi uma situação muito difícil”, afirmou.

Apesar dos conflitos e da situação tensa, Natalie elogia o país. Para ela, mesmo com os fatos, é possível ainda residir de forma serena no Líbano. “É um país cuja qualidade de vida é muito boa. Até antes deste episódio, o Líbano vinha dando sinais muito bons de recuperação financeira e passava bem pelas restrições das atividades comerciais, em sua maioria, devido ao coronavírus”, disse. Ela elogiou ainda a iniciativa do governo brasileiro que, recentemente, encaminhou ajuda ao Líbano. “Foi de suma importância, aliás a ajuda não somente do Brasil como de outros países vem sendo bem recebida”, disse Natalie que afirmou que o povo libanês ama o Brasil. “Em época de Copa, o Líbano se veste de verde e amarelo, por exemplo”, frisou.


Sobre o Libano

Curiosidades

População: 4.223.553 habitantes
Localização: País situado na extremidade leste do mar Mediterrâneo, na Ásia Ocidental, numa região que faz ligação entre esse continente e a Europa;
Limites: Faz fronteira com a Síria ao norte e a leste e com Israel ao sul e a oeste;
Populações: No cruzamento da bacia do Mediterrâneo, o Líbano é uma das regiões de antigas civilizações, como fenícios, assírios, persas, gregos, bizantinos e turcos otomanos;
Cidades marcantes: Uma das principais cidade do país é Zahlé, também chamada de Zahlan ou Zahleh. Zahlé é considerada a terceira principal do território libanês, é considerada uma das principais cidade do vale do Begaa, conhecido por solo fértil e produtor de diversas vinícolas;

Fonte: Brasil Escola

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