Eleição na Espanha

Julgamento de catalães vira tema central em campanha

Sentados no banco dos réus, líderes separatistas são protagonistas da guerra ideológica que se instaurou entre esquerda e direita no país; eleições parlamentares acontecerão no dia 28 deste mês

Atualizada em 11/10/2022 às 12h25
Apoiadores do partido de extrema direita Vox participam de um comício em Toledo (Reuters)

MADRI - A campanha eleitoral espanhola mais disputada dos últimos anos começou oficialmente ontem, e alguns dos protagonistas da guerra ideológica que se instaurou entre esquerda e direita (incluída a extrema) não estão pedindo votos nos comícios ou nas ruas, mas sentados no banco dos réus. São líderes da falida tentativa de declarar a independência da Catalunha, que, para seus apoiadores, participaram de uma demanda justa por autonomia e liberdade e que, para o Ministério Público, incorreram nos crimes de rebelião (com violência), desvio de verbas públicas e desacato.

O tema catalão está no centro dos debates políticos prévios às eleições parlamentares de 28 de abril, e não poucos analistas atribuem a subida notável do partido Vox, de extrema direita, nas pesquisas a ter sabido canalizar o sentimento de insatisfação de parte da população espanhola com o discurso secessionista.

Também ontem completaram-se dois meses do início deste que é o julgamento mais midiático dos últimos anos por aqui. Trata-se da metade de todo o processo, cuja sentença está prevista para junho. No momento, o juízo está na fase probatória, em que depõem no Tribunal Supremo as testemunhas — de observadores internacionais ao ex-presidente do governo Mariano Rajoy, passando por deputados, ex-ministros e policiais que participaram dos tumultuosos dias de outubro de 2017, quando os acusados realizaram um plebiscito de autodeterminação que fora proibido e, depois, declararam (e suspenderam) a independência da Catalunha.

Mas foi a fase anterior a de maior repercussão. Nela depôs Oriol Junqueras, ex-presidente do governo regional e artífice do plano de secessão. Num discurso, ele se descreveu como preso político e atacou a dura reação da polícia no dia do plebiscito desautorizado de 2017, que terminou em choques com os “votantes” e dezenas de feridos, muitos deles idosos.

"Não há nada no Código Penal que impeça a realização de um referendo. Mas impedi-lo com o uso desmedido da força, sim, é ilegal", sustentou Junqueras, para quem os procuradores pedem 25 anos de prisão.

Ele é candidato a representante catalão no Parlamento espanhol pela Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) e lidera as pesquisas. Também bem posicionado nas sondagens aparece outro encarcerado, o ativista social Jordi Sànchez, líder de chapa do agrupamento Junts Per Catalunya, de Carles Puigdemont, presidente regional da Catalunha na época da declaração de independência - e que escapou de ser preso na Espanha com um autoexílio na Bélgica.

"Foi rebelião. Não só querem romper a unidade da Espanha como usaram a violência e jogaram parte da população contra as instituições", acusa Pablo Casado, candidato do Partido Popular (PP) às eleições gerais e cuja estratégia é atacar o secessionismo, disputando, assim, votos com a extrema direita do Vox. "Quando chegarmos ao poder, proibiremos os indultos em caso de rebelião. Os criminosos condenados deverão cumprir sua pena (de 25 anos) integralmente".

A certeza dele não é unânime. No ano passado, a Justiça alemã já havia desmerecido a tese de rebelião violenta e, entre críticas veladas à Justiça espanhola, recusou-se a extraditar Puigdemont — detido em Hamburgo, a pedido da Espanha, quando atravessava a Alemanha de carro. Agora, erros da acusação e citações malfeitas dos promotores têm gerado mais críticas, como as da magistrada Victoria Rosell, ex-deputada do partido de esquerda Podemos.

"Tudo o que chama a atenção neste julgamento é que o objeto não é tão nítido como deveria. Fica evidente a tentativa de construir a acusação de uma rebelião violenta ou uma sedição imputáveis pessoalmente aos acusados. Temos visto provas de protestos, manifestações ou atos de desobediência, mas não de rebelião", sustenta ela.

A também magistrada Teresa Freixes, professora de Direito Constitucional na Universidade Autônoma de Barcelona, defende a força e a saúde das instituições espanholas. Ela diz não poder emitir um parecer sobre o desenrolar do julgamento porque integra uma comissão de juristas encarregada de elaborar um relatório após a sentença. Freixes declara, no entanto, que a tentativa de independência foi um “golpe à democracia à margem da ordem legal”.

"Há muitos “especialistas” opinando sobre o que não conhecem. Entidades como a organização judicial progressista europeia Medel dizem que a Espanha é um dos países com maior garantia de cumprimento do processo legal. Também somos dos menos condenados pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos", afirma. "Na minha opinião, o principal problema social na Catalunha é a fratura gerada pelo secessionismo, que, sem maioria social, tentou impor uma independência ao arrepio da lei, da democracia e do senso comum".

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