Copa do Mundo

Futebol pode ajudar Putin a melhorar imagem da Rússia

País enfrenta sanções e isolamento na comunidade internacional após anexação da Crimeia, acusações de interferência em eleições e por apoio a governo sírio; analistas estão divididos sobre papel da Copa como peça de relações públicas

Atualizada em 11/10/2022 às 12h30
Presidente russo Vladimir Putin discursou antes da abertura da Copa do Mundo, em Moscou (Presidente russo Vladimir Putin discursou antes da abertura da Copa do Mundo, em Moscou)

MOSCOU - Todos os holofotes estão postos sobre a Rússia. Desta vez, porém, a atenção que o país ganha não tem a ver com acusações de envenenamentos de espiões, interferência em eleições e outros pontos de tensão com a comunidade internacional. O motivo é o futebol, o Mundial, o novo grande aliado de Vladimir Putin.

Embora o presidente russo admita não ser entusiasta desse esporte, ele tem se dedicado à causa na Copa do Mundo que começou na quinta-feira, 14, tendo o seu país como sede.

Não em vão, é a vitrine perfeita para melhorar a imagem global da Rússia em um momento de isolamento, segundo analistas consultados pela BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC.

A guerra na Síria, o conflito na Ucrânia, o caso do ex-espião russo envenenado junto com a filha, no Reino Unido, ou a suposta interferência em processos eleitorais nos Estados Unidos e em outros países s são algumas das questões que vinham causando duras críticas à Rússia e causando um desgaste considerável a sua imagem no cenário internacional.

É nesse contexto que, para o correspondente da BBC em Moscou, Steve Rosenberg, a Copa do Mundo é uma oportunidade de ouro para Putin. " Eu já posso revelar o vencedor desta Copa do Mundo: Vladimir Putin", disse o jornalista após a abertura do torneio na quinta-feira.

O fato de o maior campeonato de futebol do mundo estar ocorrendo no país já é uma vitória para o Kremlin, destaca Rosenberg, e apesar de alguns críticos no Ocidente terem pedido um boicote ao evento, o fato é que "suas equipes e seus seguidores também estão" no país, participando.

'Um país moderno e aberto'

A expectativa é que meio milhão de pessoas visitem a Rússia para a Copa do Mundo e Putin está ciente disso.

Depois da apresentação do cantor britânico Robbie Williams na abertura do torneio em Moscou e antes da Rússia marcar 5 gols contra a Arábia Saudita na partida de abertura, o presidente expressou sua satisfação e aproveitou a oportunidade para se dirigir ao mundo.

"Nós amamos o futebol aqui. A Rússia é um país aberto, hospitaleiro e amigável", disse Putin em seu discursou.

Isolamento

"Desde a invasão da Crimeia em 2014" - logo após os Jogos Olímpicos de Inverno em Sochi (Rússia) - "os países do Ocidente têm concentrado parte de suas políticas em isolar a Rússia e esse isolamento tem afetado o prestígio do país", explica o cientista político Andrew Radin, da consultoria independente RAND, dos Estados Unidos.

"A Copa do Mundo é uma oportunidade para reorientar a imagem internacional da Rússia e destacar que o país é uma sociedade moderna e desenvolvida com história e cultura ricas."

"Uma das maneiras de fazer isso é abrir-se ao exterior: não apenas acolhendo os torcedores com o melhor sorriso, mas convidando artistas estrangeiros, como Robbie Williams, ou outras personalidades para fazerem parte da celebração.", diz Alina Polyakova, especialista em Rússia do Instituto Brookings.

"Tudo para mostrar que a Rússia é um país semelhante ao Reino Unido, à França ou aos Estados Unidos, e não o regime autoritário como aparece na imprensa, algo que é claro que é. É possível ser as duas coisas: uma nação moderna e um regime autoritário", acrescentou ela à BBC News Mundo.

O evento também pode servir para manter a popularidade de Putin dentro do país, diante das reformas que vem realizando para enfrentar os problemas econômicos do país.

Na quinta-feira, o governo anunciou que aumentaria o imposto sobre consumo - equivalente ao ICMS no Brasil - e a idade de aposentadoria para homens e mulheres, uma decisão impopular que evitou tomar por anos e que só foi divulgada algumas horas antes do início da Copa do Mundo.

Uma mudança?

A questão agora é: a posição da Rússia mudará em âmbito global graças à Copa do Mundo? Os especialistas acham difícil. "Eu não acredito que isso será um ponto de virada (para a relação entre a Rússia e o Ocidente)", diz Jeff Mankoff, especialista em Rússia no Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, na sigla em inglês).

"Os chefes de Estado dos principais países do Ocidente não foram a Moscou para a abertura da Copa do Mundo, e eu acho que a evidência é de que a relação segue como antes", analisou ele em entrevista à BBC News Mundo.

"As disputas sobre a guerra na Síria, o conflito na Ucrânia, a suposta interferência nas eleições em todo o mundo ou as sanções contra Moscou continuarão a fazer parte da conversa entre as elites políticas durante o campeonato", diz Mankoff, e "voltarão ao primeiro plano quando terminar."

"Muita gente pode ficar impressionada com a gestão russa da Copa do Mundo, mas geralmente essas impressões têm uma recompensa limitada", diz Stephen Sestanovich, ex-embaixador extraordinário dos EUA para os novos países que surgiram com o colapso da União Soviética e membro do grupo de analistas do think tank Conselho de Relações Exteriores.

Em sua opinião, há apenas uma maneira pela qual a Copa do Mundo pode propiciar uma mudança: se Putin realmente quiser que aconteça e utilizar a boa atmosfera do futebol para dar um passo atrás nos grandes conflitos.

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