O que há em comum entre Cleópatra, Nefertite e os “mentores do amor”?
Nos últimos tempos, tem crescido um mercado cada vez mais barulhento nas redes sociais: o de “fórmulas” para fazer um homem se apaixonar e permanecer apaixonado.
Nos últimos tempos, tem crescido um mercado cada vez mais barulhento nas redes sociais: o de “fórmulas” para fazer um homem se apaixonar e permanecer apaixonado.
São vídeos curtos, cursos pagos, gurus do amor, “mentores de autoestima” e até psicanalistas ensinando mulheres a adotar determinados comportamentos para atrair “homens de valor”.
Confesso que observo tudo isso com um certo desconforto, por isso resolvi escrever um pouco sobre o assunto, mesmo sem me aprofundar na complexidade que ele realmente exige.
O que tenho visto por aí é gente vendendo amor como se fosse produto de prateleira, com estratégias, manuais e frases ensaiadas. Como se fosse possível aplicar uma técnica emocional e colher um resultado certeiro. Como se o outro fosse previsível e como se existisse fórmula genérica para algo tão humano.
Só que não existe!
Relacionamento não é produto da Shopee, não é receita, é construção.
Cada um é uma obra individual, feita por duas pessoas que se encontram, se escutam, se adaptam e, se houver real afinidade, crescem juntas.
A maior incoerência, para mim, é ver tantos “especialistas” tentando ensinar como agir para parecer alguém de valor; como se integridade e maturidade emocional fossem algo que se aprende num curso; como se fosse possível treinar caráter só para impressionar.
E o mais grave: será que essas pessoas têm, de fato, uma vida afetiva estável? Uma trajetória que sustente o que dizem? Ou só aprenderam a comunicar bem sem necessariamente viver aquilo que ensinam?
Há ainda um ponto que me incomoda profundamente: a apropriação de figuras históricas como Cleópatra e Nefertite, apresentadas como modelos de mulheres sedutoras, mas pouco se fala do que realmente estava por trás dessa sedução.
Cleópatra usava a sedução como estratégia política de alto nível.
Ela foi culta, poliglota, articulada com líderes como Júlio César e Marco Antônio, soube usar o poder da presença, da inteligência e do afeto como instrumento de influência e não como tática emocional vazia para atrair afeto. A sedução dela vinha com conteúdo, com contexto, com consequência.
Nefertite, por sua vez, foi uma rainha com forte presença pública, representada em inúmeras obras como uma mulher de beleza marcante, mas também como figura de poder político e religioso.
Ao lado de Akhenaton, participou de uma revolução religiosa no Egito antigo. Ela não era adorno, era decisão.
Hoje, reduzem essas mulheres a símbolos de sedução superficial para consumo digital, transformando suas forças históricas em roteiro de Reels e entregam tudo isso ao público como se fosse solução para dilema afetivo moderno.
E é esse tipo de romantização rasa que tem sido vendida como solução para dilemas afetivos reais.
Hoje, ensina-se à mulher que, para ser valorizada, precisa controlar o que sente, não demonstrar demais, não se apegar, não se mostrar interessada, desaparecer por uns dias, ativar "gatilhos emocionais", tudo com o único objetivo de parecer mais interessante do que se é.
A lógica é simples (e perigosa): se você quer alguém "de valor", precisa agir como uma “mulher de valor”, mas aí eu pergunto: desde quando caráter é performance?
Quem tem princípios não precisa decorar frases, vive o que acredita.
Não precisa ensaiar, não reprime sentimentos para parecer interessante e tampouco interpreta papel para conquistar validação.
E se alguém só permanece interessado enquanto você segue uma cartilha de comportamento, talvez essa relação nunca tenha sido sincera desde o início.
Meninas, relacionamento de verdade não se sustenta em ensaio ou em frases de efeito com táticas de engajamento e sim em presença, verdade e construção diária.
Amor não é disputa, nem teatro. Amor de verdade é parceria, troca, construção conjunta e se você está se sentindo obrigada a seguir um roteiro para manter alguém interessado, talvez o que esteja em risco não seja o relacionamento, mas a sua própria integridade emocional.
Então aqui vai o meu “produto” e é de graça! Um recado de quem acredita em relações reais:
- Mulher de valor não finge, não implora, não representa. Ela se conhece e por isso escolhe com consciência.
- Mulher de valor não aceita migalha emocional, não negocia dignidade, não se diminui para caber no desejo de ninguém e, principalmente: não compra fórmula mágica, porque já entendeu que o que é real não se compra, se constrói com verdade, liberdade e reciprocidade.
- Mulher de valor não precisa ser treinada para amar, nem para ser amada, precisa apenas de coragem para ser quem é e lucidez para não aceitar menos do que merece.
Não pretendo, com esse texto, ser exemplo para ninguém. Não sou psicanalista, nem coach de relacionamentos.
Sou apenas uma mulher real, que tem tropeçado, aprendido, evoluído e que hoje entende que, se for para haver algum “encaixe”, que seja de essência, não de estratégia.
Sâmara Braúna
Advogada há 24 anos, criminalista, especialista em liberdade, garantias constitucionais, em violência de gênero e crimes sexuais. Pós-graduada em Direito Penal. Conselheira Estadual OAB/MA. Representante da OAB-MA no Comitê de Políticas Penais do Estado do Maranhão e integrante da lista tríplice para o cargo de Jurista do TRE.
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