COLUNA
Rogério Moreira Lima
Engenheiro e professor, foi coordenador Nacional da CCEEE/CONFEA e vice-presidente CREA-MA (2022). É membro da Academia Maranhense de Ciência e diretor de Inovação na Associação Brasileira de
Rogério Moreira Lima

Judicialização das Telecomunicações: Riscos e Impactos no Futuro do 5G no Brasil

A desistência da Winity II Telecom em relação às autorizações obtidas no Lote A1 da Licitação nº 1/2021-SOR/SPR/CD-ANATEL, conhecido como Leilão 5G, trouxe implicações significativas para o cenário das telecomunicações no Brasil.

Rogério Moreira Lima

A desistência da Winity II Telecom em relação às autorizações obtidas no Lote A1 da Licitação nº 1/2021-SOR/SPR/CD-ANATEL, conhecido como Leilão 5G, trouxe implicações significativas para o cenário das telecomunicações no Brasil. A empresa havia adquirido a faixa de 700 MHz, reconhecida por sua ampla cobertura e excelente penetração em edificações, com compromissos de ampliar o acesso à internet em áreas rurais e reforçar o serviço em centros urbanos. Contudo, em agosto de 2023, a Winity optou por renunciar às autorizações, interrompendo os planos previamente estabelecidos.

A faixa de 700 MHz é estratégica para o setor de telecomunicações, sendo amplamente reconhecida por sua capacidade de propagação eficiente. Em centros urbanos, essa frequência desempenha um papel crucial no reforço da cobertura, particularmente em locais com alta densidade populacional, devido à sua penetração superior em edificações. Em áreas rurais e de difícil acesso, o alcance dessa faixa é essencial para superar barreiras geográficas e promover a inclusão digital, reduzindo desigualdades no acesso à conectividade. Globalmente, a faixa de 700 MHz é um padrão consolidado em redes LTE e 5G, atendendo a demandas crescentes por cobertura, qualidade de serviço e conectividade universal.

Os desafios enfrentados pela Winity, possivelmente relacionados à construção de infraestrutura e ao cumprimento de metas de cobertura, destacam a complexidade do mercado de telecomunicações no Brasil. Sua desistência atrasou os planos da ANATEL para expandir a inclusão digital, impactando regiões que mais necessitam de conectividade. Enquanto a faixa de 700 MHz, em UHF, apresenta mecanismos de propagação como visibilidade, difração, reflexão e tropodifusão, as faixas de 3,5 GHz e 26 GHz, em SHF, dependem majoritariamente da propagação em visibilidade. Embora a difração ainda seja possível em 3,5 GHz, sua eficiência é inferior à observada na faixa de 700 MHz, onde esse mecanismo predomina.

Como resposta, a ANATEL anunciou que publicará um novo edital para a faixa de 700 MHz até 31 de dezembro de 2025, criando novas oportunidades para que empresas interessadas assumam os compromissos de cobertura. No entanto, a demora nesse processo poderá ampliar os atrasos na expansão das redes móveis, comprometendo os avanços planejados. O sucesso do novo edital dependerá de atrair investidores com capacidade técnica e financeira para enfrentar os desafios regulatórios e operacionais do setor.

Paralelamente, a judicialização surge como outro desafio significativo. A recente ação judicial solicitando o compartilhamento obrigatório das ERBs (Estações Rádio Base) quando a distância entre elas for inferior a 500 metros, relatada pela Folha de São Paulo em 1º de janeiro de 2025, gera apreensão. Além disso, a entrada como amicus curiae de associações de municípios, como Assomasul e FGM, na ação movida pela ABRINTEL (ADI 7708), intensifica a complexidade do cenário. Essa decisão impacta diretamente o planejamento do 5G, que depende de uma infraestrutura robusta para atingir seu pleno potencial. A tecnologia MIMO Massivo (Multiple Input, Multiple Output), fundamental para o 5G, utiliza múltiplas antenas para aumentar significativamente a capacidade da rede. Para que funcione adequadamente, é necessário implantar uma alta densidade de antenas por habitantes, especialmente em áreas urbanas densamente povoadas. A imposição judicial pode criar entraves técnicos e econômicos, comprometendo o desempenho esperado das redes 5G.

Desta forma, a engenharia de telecomunicações, alicerçada nos pilares da análise espectral, propagação de ondas eletromagnéticas e teoria estatística das comunicações, surge como via para fornecer as bases para superar esses desafios. A análise espectral, sustentada pela Transformada de Fourier, otimiza o uso do espectro eletromagnético, evitando interferências e maximizando a eficiência das redes. Tecnologias como OFDM exemplificam sua aplicação prática, mitigando os efeitos do multipercurso e reduzindo a taxa de erro de bits, além de melhorar tanto a cobertura quanto a taxa de transmissão de dados.

A propagação de ondas eletromagnéticas, regida pela Equação de Helmholtz, é essencial para compreender os mecanismos de transmissão de sinais e prever fenômenos como atenuação, difração e multipercurso, por exemplo. Modelos como o Alfa-Beta-Gama (ITU-R P.1411) são cruciais para prever o comportamento do sinal em ambientes urbanos e suburbanos. Além disso, a teoria estatística das comunicações assegura a confiabilidade dos sistemas, com aplicações como a taxa de erro de bits (BER) e a modelagem de tráfego, fundamentais para o desempenho em redes de alta densidade.

No Brasil, que utiliza as faixas de 3,5 GHz e 26 GHz para o 5G, o planejamento técnico e o equilíbrio regulatório são indispensáveis. A expansão da infraestrutura, especialmente com a implantação de ERBs, deve ser acompanhada de decisões estratégicas que conciliem qualidade de serviço, viabilidade econômica e inclusão digital. A judicialização, embora necessária em alguns casos, deve ser conduzida com cautela para não prejudicar os avanços tecnológicos e sociais.

O 5G é uma peça central na transformação digital, essencial para suportar inovações como a inteligência artificial. Sem infraestrutura adequada, o Brasil corre o risco de ficar para trás nesse processo. Não adiante a informação sem se ater acesso rápido a mesma, em qualquer tempo e lugar. É imperativo valorizar a engenharia e buscar soluções que promovam o progresso tecnológico e social, minimizando entraves jurídicos e maximizando os benefícios para a sociedade. A engenharia de telecomunicações, com sua expertise técnica, deve ser protagonista nesse diálogo, garantindo que decisões estratégicas e regulatórias sejam fundamentadas em critérios técnicos robustos e sustentáveis. Mais engenharia e menos litígios judiciais!

Artigo elaborado em colaboração com o Adv. José Alberto Lucas Medeiros Guimarães, Mestrando em Direito pelo Programa de Pós-Graduação em Direito e Instituições do Sistema de Justiça da Universidade Federal do Maranhão (PPGDir/UFMA)

Fontes:

[1] Anatel antecipa licitação da faixa de 700 MHz e amplia incentivos ao seu uso, em caráter secundário, por prestadoras de pequeno porte, disponível em https://www.gov.br/anatel/pt-br/assuntos/noticias/anatel-antecipa-licitacao-da-faixa-de-700-mhz-e-incentiva-uso-da-faixa-em-carater-secundario-para-ppps

[2] RF EMF Guidelines (2020), disponível em https://www.icnirp.org/en/frequencies/radiofrequency/index.html

[3] Resolução ANATEL nº 700/2018

[4] Resolução CONFEA nº 218/1973

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[5] Resolução CONFEA nº 380/1993

[6] Lei Federal nº5.194/1966

[7] Lei Federal nº9.472/1997

[8] Constituição Federal de 1988

[9] Termina o leilão do 5G; veja as vencedoras, disponível em https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/11/04/vencedoras-do-leilao-do-5g.ghtml?utm_source=chatgpt.com

[10] Gratuidade do direito de passagem de infraestrutura de telecomunicações é constitucional, disponível em https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=460758&ori=1

[11]Municípios pedem ao STF para entrar na guerra das torres de celular, disponível em https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painelsa/2025/01/municipios-pedem-ao-stf-para-entrar-em-guerra-das-torres-de-celular.shtml?pwgt=kh671ktqvdms3g3ujjycnoaof5yff05sav46bxat16kuia6a&utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=compwagift

[12] Abrintel rebate Conexis no STF sobre limites na disposição de torres, disponível em https://telesintese.com.br/abrintel-rebate-conexis-no-stf-sobre-limites-na-disposicao-de-torres/

[13] Lei Federal nº 13.116/2015

[14] STF restabelece compartilhamento de torres por empresas de telecomunicações, disponível em https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-restabelece-compartilhamento-de-torres-por-empresas-de-telecomunicacoes/

[15] Edital de Licitação nº 1/2021-SOR/SPR/CD-ANATEL, disponível em https://www.gov.br/anatel/pt-br/assuntos/5G/leilao-de-espectro-5g



 



 



 



 

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