Ministério do Trabalho e Emprego

Falta de auditores fiscais dificulta combate ao trabalho escravo

Governo federal prepara concurso que vai repor em parte quadros da categoria.

AgĂȘncia Brasil

De janeiro até o último dia 21, os auditores fiscais do trabalho resgataram 2.847 pessoas exploradas em condição análoga à escravidão no Brasil. (Acervo/MPT Mato Grosso do Sul)

BRASIL - O cadastro de empregadores que submeteram trabalhadores a condiçÔes anĂĄlogas Ă  escravidĂŁo, a chamada “lista suja do trabalho escravo” do MinistĂ©rio do Trabalho e Emprego (MTE), somou 472 empresas inscritas atĂ© mĂȘs.

De janeiro atĂ© o Ășltimo dia 21, os auditores fiscais do trabalho resgataram 2.847 pessoas exploradas em condição anĂĄloga Ă  escravidĂŁo no Brasil. AlĂ©m desses trabalhadores, os auditores encontraram atĂ© o mĂȘs de outubro 2.064 crianças e adolescentes em trabalho infantil, proibido por lei (Estatuto da Criança e do Adolescente).

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Os nĂșmeros do aproveitamento abusivo da mĂŁo de obra no paĂ­s foram repassados Ă  AgĂȘncia Brasil na Ășltima sexta-feira (24) pelo MTE. De acordo com as fontes ouvidas pela reportagem, Ă© provĂĄvel que esses dados, ainda que superlativos, subestimem a exploração ilegal da força de trabalho no Brasil. Segundo as fontes, o quadro de auditores fiscais do trabalho estĂĄ defasado hĂĄ anos.

“Se nĂłs tivĂ©ssemos o nĂșmero pleno de auditores fiscais do trabalho, mais operaçÔes possivelmente teriam sido realizadas e mais criminosos infratores teriam sido incluĂ­dos na lista daqueles que cometem a prĂĄtica e o crime de trabalho escravo e de submissĂŁo ao trabalhador a condiçÔes degradantes”, afirma o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Bob Everson Carvalho Machado.

“Hoje nós temos na ativa 1.917 auditores, de um quadro possível de 3.644”, diz Machado. “É uma situação gravíssima que, obviamente, impacta em todas as áreas de atuação da inspeção do trabalho.”

Conforme Machado, a carĂȘncia tem efeitos negativos em vĂĄrias atribuiçÔes do MTE. “Impacta, por exemplo, na fiscalização do trabalho escravo. Impacta na fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista. Impacta na busca por ambientes de seguros de trabalho, nĂŁo combatendo assim os acidentes no local de trabalho. Impacta no combate Ă s piores formas de trabalho infantil. Impacta na fiscalização do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), na inserção de pessoas com deficiĂȘncia no mercado de trabalho e tambĂ©m na inserção de aprendizes.”

DenĂșncias nĂŁo apuradas

A carĂȘncia de auditores fiscais do MTE Ă© lamentada por procuradores do MinistĂ©rio PĂșblico do Trabalho (MPT). “Em 2023, jĂĄ foram mais de 3,5 mil denĂșncias que chegaram aos ĂłrgĂŁos pĂșblicos sobre trabalho em condiçÔes anĂĄlogas Ă  escravidĂŁo. O atual quadro de auditores torna quase impossĂ­vel, ou inviabiliza que todas as denĂșncias sejam fiscalizadas”, reclama o coordenador nacional de Combate ao Trabalho Escravo e Enfrentamento ao TrĂĄfico no MPT, Luciano AragĂŁo Santos.

AragĂŁo assinala que o “prejuĂ­zo imediato Ă© dos trabalhadores”, inclusive quando tĂȘm direito a benefĂ­cios previstos em lei. “O governo concede o seguro-desemprego especial, em trĂȘs parcelas, para trabalhadores e trabalhadoras resgatados. Mas, para essa liberação, Ă© necessĂĄrio que o auditor fiscal esteja presente na força-tarefa [que flagra a exploração]. A alternativa, quando eles nĂŁo estĂŁo presentes, Ă© o MPT ajuizar uma ação para liberação judicial de seguro-desemprego. Mas, obviamente, Ă© um processo mais moroso do que a liberação administrativa feita pelo auditor no prĂłprio momento da fiscalização”, explica.

Segundo AragĂŁo, a ausĂȘncia de auditores nas forças-tarefas pode deixar impunes os empregadores que cometem crimes. “Quando o auditor fiscal nĂŁo participa, o empregador acaba ficando imune e se livrando de uma sĂ©rie de autos de infração, e uma sĂ©rie de multas administrativas que incidem.”

Novecentas vagas 

O MinistĂ©rio da GestĂŁo e da Inovação em Serviços PĂșblicos (MGI) anunciou que 900 vagas para auditores fiscais do trabalho serĂŁo ofertadas em concurso pĂșblico no primeiro trimestre de 2024. Essa serĂĄ a carreira com mais vagas no Concurso Nacional Unificado – 13,55% das 6.640 vagas. Como noticiado pela AgĂȘncia Brasil, o edital deve ser publicado em 20 de dezembro.

Na opiniĂŁo de AragĂŁo, a reposição de 900 auditores “nĂŁo Ă© suficiente para ter um quadro ideal de fiscais de trabalho.” O presidente do Sinait concorda e calcula que seria necessĂĄrio contratar um total de 1.727 novos auditores. “NĂłs temos a expectativa de que, no prazo de validade do concurso, possam ser chamados os excedentes, aqueles aprovados pelo certame e que estĂŁo fora do nĂșmero inicial de vagas”, diz Bob Machado.

A natureza das atividades dos auditores fiscais do trabalho Ă© bem capilarizada nos diversos setores econĂŽmicos e em todo territĂłrio nacional – no meio rural e no meio urbano, em pequenas cidades e em metrĂłpoles. Assim, a distribuição dos futuros concursados Ă© um ponto crĂ­tico. “O mundo do trabalho estĂĄ nos rincĂ”es espalhados do Brasil”, pondera Machado, alertando que a mĂĄ distribuição dos concursados pode inviabilizar o trabalho dos auditores. “NĂŁo Ă© possĂ­vel imaginar que um Ășnico auditor conseguiria dar conta de toda a profusĂŁo de hospitais, comĂ©rcios e indĂșstrias de SĂŁo Paulo”, exemplifica.

De acordo com o secretĂĄrio de Inspeção do Trabalho do MTE, Luiz Felipe BrandĂŁo, a distribuição dos concursados por estado ainda nĂŁo foi estabelecida. Um grupo de tĂ©cnicos do ministĂ©rio estĂĄ mapeando as ĂĄreas com maior deficiĂȘncia de auditores fiscais e onde se encontram situaçÔes mais crĂ­ticas.

Ele admite que o concurso “nĂŁo vai repor totalmente” o nĂșmero de auditores necessĂĄrios, mas ressalta que o recrutamento pelo certame â€œĂ© o primeiro passo para caminhar nesse sentido.”

De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego, o salårio inicial de um auditor fiscal do trabalho é de R$ 21 mil.

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