BOM JARDIM - A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), por unanimidade, condenou fazendeiro acusado de manter sete trabalhadores, incluindo um menor de idade, em condições análogas à escravidão em uma fazenda localizada no município de Bom Jardim, a 279 km de São Luís. A decisão atendeu a uma apelação do Ministério Público Federal (MPF).
De acordo com a denúncia apresentada pelo MPF, depoimentos, relatórios, fotografias e outros elementos coletados na investigação evidenciaram que o acusado, Humberto Dantas dos Santos, submeteu os trabalhadores a condições degradantes de trabalho em sua propriedade, conhecida como Fazenda Garrafão, em Bom Jardim.
Conforme relatório que fundamentou a denúncia do MPF, os trabalhadores viviam em dois barracos de palha, sem paredes, piso, portas ou janelas. Nos locais sequer havia instalações sanitárias e os trabalhadores eram obrigados a fazer suas necessidades no mato.
As precárias moradias também não contavam com depósito para lixo ou mesmo local para guardar os pertences dos trabalhadores. Também não havia local adequado para o preparo dos alimentos, tampouco para as refeições. Consta ainda que os trabalhadores não tinham acesso a água potável em condições higiênicas e laboravam sem equipamentos de proteção individual.
Os trabalhadores dormiam em redes compradas por eles próprios e a água consumida era retirada de um córrego, que estava “cortado”, ou seja, represado, com água parada, usada por animais como cachorro e o gado da fazenda. Todos os empregados relataram que ficaram com diarreia depois de tomarem dessa água. Após reclamarem para o encarregado da fazenda, foi providenciada uma “pipa” com água para os trabalhadores. Porém, a fiscalização constatou que a água da pipa era barrenta, suja e armazenada dentro do barraco em embalagem reutilizada de herbicida.
Continua após a publicidade..
Diante da situação constatada, o MPF denunciou o fazendeiro pelo crime previsto no art. 149 do Código Penal (Reduzir alguém a condição análoga à de escravo). “No presente caso, a prova dos autos evidencia que o acusado praticou o crime na medida em que submeteu os trabalhadores a condições degradantes de trabalho, como se vê dos inúmeros depoimentos, relatórios, fotos e demais elementos de prova que instruem o processo”, sustentou o procurador da República Juraci Guimarães Junior.
Condenação
A denúncia do MPF, em um primeiro momento, havia sido julgada improcedente por juiz da 2ª Vara da Seção Judiciária do Maranhão, que absolveu o fazendeiro sob o argumento de que, embora configuradas diversas infrações trabalhistas, não seria possível afirmar que o trabalho era prestado em condições degradantes. No entendimento do magistrado, a ausência de indícios do emprego de violência ou grave ameaça à vida e à integridade física dos trabalhadores impossibilitaria a caracterização do delito previsto no art. 149 do CP.
Em apelação contra a decisão de primeiro grau, o MPF sustentou que o crime previsto no art. 149 do CP é tipo penal misto alternativo, pois descreve várias condutas. Logo, basta a prática de qualquer uma delas para se caracterizar a prática do delito. Desse modo, para sua configuração, não é exigida somente a privação da liberdade de locomoção, mas qualquer ação que se apresente caracterizada como degradante, por violação à dignidade humana.
O caso foi, então, remetido ao TRF1, onde a decisão de primeiro grau foi revertida, e o réu, condenado. A relatora do processo, desembargadora Monica Sifuentes, acatou os argumentos do MPF e considerou inequívoca a prática do crime previsto no art. 149 do Código Penal. Na decisão, a magistrada salientou que “as consequências do crime extrapolam o tipo penal do art. 149 do CP quando trabalhadores relatam problemas de saúde em razão do consumo da água inadequada. Acrescente-se que a submissão a condições degradantes afasta do cidadão a crença de pertencer a uma sociedade de iguais e, portanto, ser também merecedor de direitos”. O voto foi seguido de forma unânime por todos os integrantes da 3ª Turma do Tribunal.
Saiba Mais
- Campanha alerta para versão contemporânea do trabalho escravo
- Trabalhado escravo: governo inclui 248 empregadores em lista suja
- Brasil resgatou 3,1 mil trabalhadores escravizados em 2023
- Falta de auditores fiscais dificulta combate ao trabalho escravo
- PF investiga contratação de 16 trabalhadores maranhenses resgatados em condições de escravidão no RS
Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais X, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.
+Notícias