BRASIL - O Valor Bruto da Produção (VBP) atingiu um número positivo no último mês. As estimativas de safra recorde em 2023 e os ganhos de produtividade foram determinantes para que esse resultado fosse satisfatório. De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram R$ 1,151 trilhão só no mês de outubro. Um valor 2,2% acima do observado em 2022, que foi de R$ 1,126 trilhão. Mas na opinião de especialistas, ainda é cedo para comemorar.
O advogado especialista em direito do agronegócio e empresarial, Francisco Torma, entende que, em termos de valor e de quantidade, a produção foi maior na safra de 2022-23 do que na 2021-22. Mas explica que esse valor deveria ser ainda maior.
“Nós temos na ordem de 20% a mais de produção de grãos. E o nosso VBP aqui do período cresceu 4,2% em termos de valores, em termos de dinheiro. Isso significa que nós estamos com problema de valor das commodities. Nosso produto está valendo pouco, tanto é que nós produzimos 20% a mais e isso impacta em 4,2% a mais em termos financeiros”, analisa.
Para Torma, existe uma crise velada no setor. “Na verdade, nós temos uma situação em que se celebra um valor positivo que deveria ser muito maior, deveria ser pelo menos 20% de crescimento do valor bruto da produção. Então o crescimento de 4,2 na verdade implica em um decréscimo em valor agregado na nossa produção”, explica.
Segundo o especialista em agronegócios Marcelo Moura todo crescimento deve ser comemorado, mas acredita que na necessidade de analisar o cenário que aponta o resultado positivo.
“É um resultado indiscutivelmente satisfatório, mas que não significa que o Brasil já tem condições de deitar em berço esplêndido, como dizem. Sempre vão existir desafios, um deles é climático. O Brasil tem que ser estratégico, saber negociar no mercado internacional o crédito de carbono, por exemplo — uma vez que as consequências da degradação do meio ambiente são globais”, avalia.
Produtos em destaque
Amendoim com 17,6% de aumento real no VBP, arroz 17,8%, banana 15,9%, cacau 19,5%, cana de açúcar 17,2%, laranja 18,0%, mandioca 42,4%, soja 2,9%, tomate 23,0% e uva 14,5% foram os produtos que tiveram melhor rendimento em outubro. Esse comportamento deve-se à influência de preços, quantidades produzidas ou a ambos. Soja, milho, cana de açúcar, café e algodão são os cinco que representam 81,9% do VBP das Lavouras.
Na pecuária, os destaques positivos são para suínos, leite e ovos. Carne bovina e de frango não apresentaram bons resultados neste ano. Mato Grosso, São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Goiás foram as regiões que mais se destacaram com 59,8% do VBP total.
“São estados tradicionalmente fortes no agro, com grande representatividade no que diz respeito tanto à produção quanto à força operacional que tem, a força econômica e a força política no segmento”, destaca Marcelo Moura.
Pecuária teve retração
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O VBP das lavouras cresceu 4,2% em valores reais e está estimado em R$ 811,7 bilhões. Já a pecuária obteve um faturamento de R$ 339,9 bilhões e apresentou retração de -2,1% em relação ao ano.
Na opinião do analista e consultor de Safras & Mercados, Fernando Iglesias, existe uma explicação para o resultado não ter sido tão bom para a pecuária de corte em 2023. “Isso acontece em função da queda dos preços médios das proteínas de origem animal no mercado internacional. Então a exportação trouxe receitas menores e isso acabou afetando no resultado da atividade”, aponta.
Advogado agrarista, Francisco Torma analisa: “Nós estamos num ciclo de baixa porque nós temos excesso de fêmeas hoje no Brasil. Então nós estamos abatendo muitas fêmeas - e isso daqui a um ou dois anos vai impactar num valor muito maior da carne, quando nós tivermos menos animais de corte disponíveis em fase adulta, prontos para o abatimento”
Investimentos
Na opinião do especialista em meio ambiente e agronegócios Charles Dayer, o Brasil precisa prestar mais atenção na maior incidência de eventos extremos. “A gente vem enfrentando em alguns locais problemas de seca e em outros excessos de chuva. Então a gente tem que preparar nossas lavouras para essas questões, porque a gente tem culturas que são mais sensíveis à falta d'água, por exemplo”.
Conforme Dayer, o país tem condições de se preparar, mas é preciso investir com mais seriedade. “Isso pode ser buscado por meio de tecnologia de trato de cultivo, colhe antes da hora, ou plantar mais cedo e por aí vai, acompanhar melhor a questão do clima e também envolver na melhoria genética dos cultivares. Isso vai ajudar a enfrentar esses eventos extremos que fogem ao controle do agricultor”.
O advogado Francisco Torma acredita que existem políticas públicas que não estão sendo feitas a contento. “Precisamos ter políticas públicas que garantam o seguro, o seguro efetivo para o produtor rural. Temos um grande problema de seguro hoje no Brasil. O excesso de acionamento de seguros em dois anos fez com que o preço do seguro disparasse e fez com que muitas empresas seguradoras saíssem do mercado”, relata.
Torma reforça a necessidade de mais atenção com o setor que mais movimenta a economia do país. “O produtor, quando tem que contar só com a sorte, ele está colocando a sua produção em risco, e quando nós colocamos a nossa produção em risco, nós acabamos deixando todo o setor da economia muito instável, muito suscetível a grandes perdas”, lamenta.
Na opinião do analista e consultor Fernando Iglesias, a situação pode melhorar, mas é preciso observar o cenário e investir na prevenção. “Nós próximos anos vamos ter desafios também, agora nós temos desafios climáticos, tem que avaliar essas questões envolvendo o clima, os índices pluviométricos que podem trazer problemas”, cita.
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