COLUNA
Lourival Souza
Diretor da Belonave e Mestre em Economia Política (SMC University, Suíça).
Lourival Souza

Aborto: o extermínio que tentam esconder

As imagens da guerra de Israel podem nos dizer muito sobre a morte de outros inocentes.

Lourival Souza

Depois do voto da ministra Rosa Weber (ADPF 442) pela descriminalização do aborto até 12 semanas, resolvi tratar do assunto. Não sou daqueles que começam a escrever imediatamente. Procuro esperar o tempo hábil para organizar as ideias, refletir e, depois, levar para o papel. E como o mundo continua girando, outras coisas que me chamam atenção acontecem; foi o caso do conflito entre Hamas e Israel. Como a guerra na região é frequente, já não se observa grande impacto do público. Digo, aquele tipo de impacto que só a novidade traz; mesmo assim, há sempre alguma crueldade que nos comove. Desta vez foram os 40 bebês degolados e o assassinato da menina autista de 12 anos. A imagem do bebezinho na piscina do seu próprio sangue, dos corpinhos carbonizados e do sorriso de Noya, certamente mexeram com o sentimento e a imaginação.

Assistindo a toda essa comoção, pensava por que as crianças mortas pelo aborto não são um consenso de crueldade como as da guerra. Acho que uma das respostas possíveis está nas imagens. Como alguém ligado às finanças e à economia, lido com os números, e as pessoas que me conhecem esperam que só fale deles. Mas os números, mesmo as grandes cifras, ainda soam abstratas. Se falo que milhões de crianças foram mortas nos países em que a prática foi legalizada, não há tanto choque como a imagem de um feto desmembrado ou mesmo a descrição do sofrimento e horror que a criança vive no útero ao se debater e gritar enquanto algum dos vários métodos abortivos tentam dar cabo da sua vida.

Quando redigi a primeira versão deste artigo, estava reunindo todos os argumentos científicos, morais, econômicos para mostrar o quão cruel e ineficaz é o aborto. São argumentos que tenho usado há anos em conversas e eventos de que participo, mas as imagens da guerra me lembraram de como a imagem fala por si. Digo, me lembraram, porque, certa vez, fui a um desses eventos pró-aborto. Falei de como, após a fecundação, já existe um indivíduo com DNA próprio, com o qual se inicia um processo que só se encerra com a morte na vida adulta, num fato inconteste, em que não resta nenhuma dívida científica. Falei também da realidade das famílias desestruturadas e da iniciação sexual precoce — em muitos casos, incentivada —, que leva à gravidez e aos problemas daí decorrentes, e de como a ideia de que há mais bocas que comida não tem amparo nos dados — aliás, a economia necessita de gente para crescer e no mundo há muito espaço para ocupar. Enfim, tudo isso era respondido com algum deboche ou bravata, mas, na hora que começava a falar dos procedimentos abortivos, a conversa mudava. Era acusado de “estar apelando”. Ora, mas não é isso mesmo que acontece?

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Não à toa os defensores do aborto não gostam de falar como ele feito. Pelo contrário: tentam deixar a coisa mais abstrata (ou enfeitada), para neutralizar nosso senso de realidade. Logo passam a tratar da liberdade da mulher, de direitos reprodutivos, política de saúde etc. E o pior: não só escondem como descaracterizam a sua própria espécie ao dizer que ninguém sabe ao certo quando a vida começa ou se a criança no ventre é, de fato, um indivíduo. Quanto a isso, cabe fazer outro paralelo com a guerra em Israel. Quando alguém mata uma criança inocente, certamente o faz por não reconhecer nela o mesmo valor que o seu próprio. Ou seja, primeiro se rebaixa o outro e, depois, o mata. Assim é o aborto, assim é o assassinato, assim é a escravidão, assim é a guerra.

Mesmo aqueles que defendem os procedimentos de forma indolor não o fazem por compaixão. No fundo, esse tipo de argumento é puro autoengano, pois, fazer com que a vítima não grite é só uma forma de não perturbar a consciência do algoz.

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