Em um país distante…
Minhas noites maldormidas têm me feito lembrar, vivamente, a obra magistral “Cem Anos de Solidão”, de Gabriel García Márquez.
Minhas noites maldormidas têm me feito lembrar, vivamente, a obra magistral “Cem Anos de Solidão”, de Gabriel García Márquez.
Considerada, por muitos, como um dos maiores clássicos da literatura mundial, em “Cem Anos de Solidão” García Márquez narra a história dos Buendía, uma estirpe de solitários que vivem na fictícia Macondo. Em um exercício de realismo fantástico, Garcia Márquez nos brinda com uma obra atemporal e que permite construir diversos paralelos com a nossa própria existência.
Bem, como disse no início, recordei-me dessa obra porque tenho a convicção de que algumas coisas não são reais, são frutos da minha imaginação fértil, que acabo reproduzindo nos sonhos. Acho que, ao dormir, tenho entrado no mundo fantástico da fantasia e quero hoje compartilhar com vocês o que tenho visto em sonhos. Ou seriam pesadelos? Fiquei agora na dúvida.
Meio que plagiando o imortal García Márquez, vou chamar o local, onde acontece a história, de Braconda e o povo da localidade de brasuca. Vale lembrar: trata-se de uma história de ficção, logo, uma estória e qualquer semelhança com eventos reais, em respeito à liberdade de expressão, deixo por conta do leitor.
Em Braconda, que existe na minha mente e só aparece em sonhos/pesadelos, o povo paga para que profissionais das áreas médica, jurídica e de segurança lhes deem, respectivamente, atendimento médico, quando se depara com a falta de saúde; defesa, quando precisa responder a algum processo perante a Justiça; e segurança, porque os índices de violência naquele país são elevadíssimos.
Por conta da insegurança reinante, apesar dos brasucas pagarem altos impostos para preservar as suas integridades física e patrimonial, o certo é que a violência só cresce. Exemplo disso foi o estupro de uma brasuquinha de apenas 4 anos de idade, que foi violentada pelo padrasto, sob o silêncio cúmplice da mãe da menor. O que aconteceu? Após a destituição do pátrio poder declarada pela Justiça, aqueles profissionais pagos para defender a sociedade ingressaram com recurso contra essa decisão, mesmo já havendo, inclusive, pretendentes à adoção da criança violentada. Os defensores entendiam que a mãe, a despeito da omissão, tinha o direito de manter os vínculos da maternidade. Resultado: como o recurso subiu para as Cortes Superiores, assoberbadas de processos – e nisso já se vão alguns anos sem solução, estando a menor no abrigo –, dificilmente ela será adotada, mesmo se confirmada a decisão do juiz. O tempo até a solução definitiva, que poderá mantê-la no abrigo até a adolescência, impedirá que se apresentem novos pretendentes à adoção.
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No quesito saúde, também sonhei que estava em Braconda e fui a um hospital público visitar uma conhecida. Não sabia chegar ao hospital, porque muito distante da minha casa. Sabia o bairro, mas não como chegar exatamente no local. Dirigi-me então até o bairro, parei o carro na primeira parada de ônibus que avistei e perguntei se alguém podia me orientar sobre a localização exata do hospital. Uma senhora simpática disse que morava perto do hospital e se prontificou a me levar até o local, desde que lhe desse uma carona até sua casa. Não pestanejei e abri a porta para que entrasse. Começamos a conversar e ela me relatou o seguinte: que o marido estava em casa com muita dor, já tinha sido diagnosticado com apêndice, mas que teria de aguardar que supurasse, para ser atendido na emergência cirúrgica, ou seja, a pauta de cirurgias agendadas, antes de qualquer complicação, era impossível. Assim, seu marido só seria atendido caso o quadro se agravasse e aí seria operado de urgência. Acordei ensopada de suor, apesar do ar-condicionado marcar 17 graus.
É isso mesmo, em Braconda, quem não tem plano de saúde privado, mesmo que pague impostos que se igualam àqueles pagos em países considerados desenvolvidos, só terá atendimento médico quando o quadro clínico se agravar.
Não acreditam nessa história de impostos altos? Comprovo: Braconda cobra de tributos das empresas 34% (imposto de renda mais contribuição social), contra 19% no Reino Unido, 25% nos Estados Unidos, 27% no Canadá e 30% no Japão.
Para ficar por aqui, pois o espaço que me foi concedido pelo jornal não permite contar todas as estórias fantásticas que enfrento ao dormir, conto uma última. Um determinado governante resolveu enfrentar a bandidagem crescente, que se organizava em facções e escravizava os moradores das periferias. Para tanto, organizou uma operação policial gigantesca. A bandidagem, bem armada e não aceitando perder território, mandou logo uma mensagem: matou um policial e tentou contra a vida de outro. O governante não se intimidou e mandou reforçar a operação.
Os primeiros resultados da perícia realizada após os confrontos dão conta de que a polícia reagiu ao ataque dos delinquentes, coisa natural em qualquer país em que o Estado protege os seus cidadãos da delinquência e responde à altura quando aqueles são atacados. Mas, em Braconda, alguns poucos apontam que os policiais mataram à queima roupa e pedem a cabeça desses agentes estatais, mesmo sem disporem de nenhuma evidência nesse sentido.
Como disse, as estórias que acontecem em Braconda são partes do mesmo realismo fantástico que García Márquez descreve em “Cem Anos de Solidão”. E, mesmo adorando essa obra, tenho rezado muito, antes de pegar no sono, para que meu anjo da guarda afaste dos meus sonhos/pesadelos os dramas vividos pelos brasucas.
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