SÃO PAULO - Daniel Cravinhos, primeiro a falar no julgamento mais esperado do ano, disse nesta segunda-feira (17/7) que Suzane von Richthofen é a “mentora” do assassinato dos pais, Manfred e Marísia, em crime ocorrido em outubro de 2002. Em seu depoimento, Daniel, que foi namorado de Suzane até pouco depois do crime, também afirmou que seu irmão, Cristian, não teve participação no assassinato do casal.
Ao depor, Daniel disse que, por ser agredida e sofrer abusos do pai, Suzane arquitetou o assassinato. Momentos antes, Daniel afirmou que Manfred von Richthofen batia e abusava da própria filha. “[Suzane me] falou que o pai a tinha agredido. Nunca ficou dessa forma, respondia que tinha muito medo. O pai dela bebia, passava a mão nas partes íntimas dela. Ela me contava isso, que tinha medo”, disse.
Segundo ele, Suzane começou a fazer as coisas em segredo. Com dois anos de namoro, Daniel freqüentava o sítio da família Richthofen, mas os pais dela eram contra o namoro. De acordo com Daniel, por causa da resistência dos pais, Suzane chegou a dizer para a mãe que tinha “dado um tempo no namoro”. “[Manfred e Marísia] foram contra depois que pegaram a Suzane viajando comigo”, afirmou em seu depoimento.
Daniel disse também que considerava Andreas, o outro filho do casal Richthofen, “como um irmão”. “Eu era o melhor amigo dele, que passava o dia inteiro em casa comigo. A mãe da Suzane pedia pra ele ir lá. Suzane ficava de castigo e planejava a morte dos pais. E eu pensava: ‘que adolescente não tem problema com os pais?’ Foi quando ela me falou que queria matar os pais, e que só ficaria bem quando isso acontecesse”, contou Daniel no depoimento.
Drogas e plano de morte
O ex-namorado de Suzane disse que, com dois meses de relacionamento, tentou manter relações sexuais com ela, mas Suzane teria chorado muito. Daniel contou que antes do crime os dois não podiam mais se ver dado à não aprovação do namoro pelos pais da estudante. Segundo ele, Suzane fumava maconha e cigarro já antes de conhecê-lo, o que o levou a usar a droga. “Toda vez que ela chegava da faculdade ela chegava com o cheiro”, disse.
“Ela [Suzane] falou que tinha sido fortemente agredida pelos pais e que planejou matá-los com uma arma que tinha. Ela pediu para que eu atirasse de dentro do quarto pra ver se dava pra ouvir de fora. Depois que isso aconteceu, eu passei a acreditar que ela seria capaz. Tudo isso aconteceu uns três ou quatro meses antes do fato [o crime]”, disse ao depor.
De acordo com o depoimento de Daniel, em todas as viagens escondidas dos dois namorados, Suzane falava que ia matar os pais. Em uma das viagens, Suzane teria discutido com Daniel e afirmado que mataria os pais de outra forma, não utilizando a arma. “Ela falou que com a arma não iria dar, mas que tinha as pás. Meia calça...Foi tudo idéia dela, porque tinha tudo que ser perfeito porque ela tinha ouvido uma discussão entre a empregada e a mãe dela, e que poderia incriminá-la”, afirmou.
Daniel afirmou que Suzane já tinha pedido para levar Andreas ao cibercafé antes mesmo do crime. “Às vezes, eu levava ele escondido dos pais. Eu gostava de ir com ele lá. E nós iríamos comemorar o aniversário [dela] num motel. Foi aí que ela falou que ia fazer o crime nesse meio tempo.”
Noite do crime
Segundo Daniel, como as pás não estavam na casa, então Suzane pediu que ele buscasse as pás. “Eu fiquei desesperado, não falei disso pra ninguém. Fui falar com meu irmão, falei que não iria conseguir fazer aquilo sozinho. Fiquei tanto tempo convivendo com isso que não consegui. Ele [Cristian] foi contra. Quando era umas 22h30 o Andreas ligou porque tinha combinado de sair quando os pais estariam dormindo. Deixei o Andreas no ciber, dei a volta e peguei meu irmão, só falava que ele tinha que me ajudar, porque sempre eu ajudei ele. Ele era contra, disse que isso não podia ser feito, que não era normal. Suzane insistia, que não agüentava mais”, afirmou.
“Quando eu dei por mim, já estávamos chegando na casa dela. Ela foi orientando a gente no que fazer no crime, me deu a luva, pediu para eu colocar a meia calça para não deixar vestígio na casa, coloquei por cima do sapato. Ela entrou na sala da casa, viu se os pais estavam dormindo, voltou e viu que a gente estava na garagem. Fomos com ela no começo da escada, ela falou que ia acender a luz do corredor. Na hora que ela acendeu a luz, eu e meu irmão fizemos muito barulho, desesperados. Meu irmão passou mal e desistiu, eu entrei no quarto fui em cima do Manfred. Na hora que percebi, já estava fazendo aquilo. Meu irmão não conseguiu, ficou parado, em estado de choque, eu que fui em cima da Marísia também”, conta.
O juiz abriu a possibilidade de os jurados fazerem perguntas para Daniel, que, questionado, disse não se lembrar corretamente, mas que imaginava ter desferido de quatro a seis golpes em cada um dos pais de Suzane.
O júri popular acontece no Fórum da Barra Funda, depois de pouco mais de uma hora de atraso, e será presidido pelo juiz Alberto Anderson Filho. A previsão é que o julgamento dure cinco dias, encerrando-se na próxima sexta-feira (21/7). A primeira fase do julgamento foi a composição do júri, que não agradou à defesa de Suzane. O julgamento não terá cinco testemunhas arroladas inicialmente, que desistiram de comparecer, entre elas o pai dos Cravinhos, Astrogildo.
Pena
A promotoria espera uma pena mínima de 50 anos para cada um dos réus. Ao chegar para o julgamento, o promotor Nadir de Campos afirmou haver um acordo entre a acusação e a defesa dos Cravinhos, para garantir a realização do júri nesta segunda-feira. Os advogados dos Cravinhos, no entanto, disseram desconhecer o acerto.
Suzane e os irmãos estão presos e respondem por duplo homicídio triplamente qualificado (meio cruel, motivo torpe e impossibilidade de defesa) e por fraude processual, pela intenção de simular latrocínio. Caso a pena ultrapasse 20 anos, automaticamente será realizado novo julgamento.
Em entrevista exclusiva a Última Instância, Mauro Otávio Nacif, principal defensor da estudante, disse que trabalhará com duas teses controversas para tentar inocentar sua cliente: a da coação moral irresistível e a da não exigibilidade de conduta adversa. Ele também antecipou que, em seu depoimento, a estudante irá dizer que fugiu para casa de Daniel, seu namorado à época, mas que ele não quis ficar com ela. Nacif prometeu apresentar uma “bomba” nos oito minutos finais de sua defesa.
Adiamento
Os irmãos Cravinhos e Suzane dividem o banco dos réus pela segunda vez. A primeira tentativa de júri, no dia 5 de junho, foi adiada após o que foi chamado de “manobra” dos advogados de defesa, em razão da ausência de uma testemunha. Enquanto os advogados da moça abandonaram o plenário, revoltados com a negativa do juiz Alberto Anderson Filho de adiar completamente a sessão, os defensores dos irmãos Cravinhos sequer compareceram ao tribunal, alegando cerceamento de defesa.
Desta vez, os advogados prometem que, se não houver irregularidade, o júri acontecerá. Para Nacif, o júri é nulo e deveria ser separado. Ele alega que, com a junção, perderá meia hora reservada à defesa da cliente. O pedido foi negado pelo ministro Raphael de Barros Monteiro Filho, presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), na sexta (14/7), mas Nacif promete apresentar novo pedido ao juiz logo no começo da sessão de hoje.
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