MARANHÃO - O total de casos de violência no campo brasileiro registrados ao longo do primeiro semestre de 2024, bem como o número de vítimas destes conflitos, foi menor que no mesmo período de 2023, segundo o relatório da CPT. Os Estados com mais registros de vítimas de violência contra a pessoa nos seis primeiros meses do ano foram Pará, Maranhão e Bahia. Quanto às mulheres vítimas de violência no campo, os maiores registros vêm do Pará, Maranhão e Mato Grosso.
Os dados parciais foram divulgados nessa segunda-feira (2), pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), entidade vinculada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Os principais tipos de violência contra a pessoa efetivamente contabilizados no país são as ameaças de morte (114), intimidação (112) e criminalização (70), sendo que as mulheres são mais frequentemente vítimas de intimidação, criminalização e ameaças de morte.
A região do Matopiba – fronteira de expansão principalmente da soja nas divisas dos Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – registrou um aumento em diversas formas de violência em comparação ao mesmo período de 2023. Neste ano, segundo o levantamento da CPT, o desmatamento ilegal apresentou um crescimento de 16,67%, a destruição de roçados aumentou em 30%, as ameaças de despejo subiram 60%, enquanto as ameaças de expulsão registraram um aumento expressivo de 150%.
Nesta região, também houve aumento na quantidade de vítimas da violência contra a pessoa, num movimento contrário ao analisado na Amacro e Amazônia Legal, de acordo com o estudo.
Além disso, ainda de acordo com a comissão, a violência decorrente da contaminação por agrotóxicos teve um “crescimento alarmante” no campo brasileiro, saltando de 19 ocorrências nos seis primeiros meses de 2023 para 182 no mesmo período deste ano. Segundo a CPT, a maior parte desses casos (156) ocorreu no Maranhão, onde comunidades estão sofrendo severas consequências da pulverização aérea de veneno.
“Este tipo de violência, em específico, está inserido nos conflitos pela terra, pela água e na violência contra a pessoa”, explicou a comissão, apontando que também houve, no último período, aumento das ocorrências de ameaça de expulsão, que passaram de 44 no primeiro semestre de 2023 para 77 em 2024.
Mais dados sobre o campo brasileiro
Nos seis primeiros meses de 2024, houve ao menos 1.056 ocorrências de conflitos no campo no Brasil. Já entre janeiro e julho do ano passado, o total de casos chegou a 1.127 – o pior resultado desde 2015.
Das 1.056 ocorrências do último período, 872 estão relacionadas a conflitos pela terra e 125 a disputadas pela água. Os outros 59 casos envolvem o trabalho análogo à escravidão, com 441 trabalhadores resgatados. No primeiro grupo, houve uma redução, já que, no primeiro semestre de 2023, a CPT contabilizou 938 ocorrências.
“Mas o número [de conflitos pela terra] revela o retrato de uma realidade ainda grave, de altos índices de violência”, apontou a CPT na nota em que divulgou os dados parciais. Para a entidade, apesar da melhora comparativa dos números, “a conflitividade continua elevada”.
Também houve uma “redução significativa” no número de casos de trabalho escravo e de trabalhadores resgatados, que diminuíram de 98 casos e 1.395 resgates para, respectivamente, 59 e 441. Em contrapartida, o número de casos de conflitos pela água passou de 91 para 125 – o quinto pior resultado desde 2015.
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O número (417) de vítimas de violência contra a pessoa também é menor do que o resultado anterior (840), embora a CPT sustente que, a estas vítimas, seria possível somar as pessoas que mais sofrem com as consequências da crise climática e de incêndios criminosos.
No geral, houve um menor número de pessoas assassinadas: seis, nos seis primeiros meses de 2024, contra 16 no mesmo período de 2023. Contudo, segundo a CPT, outros cinco casos foram registrados posteriormente, fazendo com que, até novembro, chegasse a 11 o total de assassinatos relacionados à violência no campo e disputas fundiárias. E há, ainda, outros nove casos não esclarecidos, em análise.
"Mesmo sendo computados como dados qualitativos, que não se somam à violência no campo, os impactos da crise climática foram sentidos pelas comunidades camponesas, quilombolas e indígenas", diz a comissão. Foram 100 casos de desmatamento ilegal, dos quais 76% dos registros ocorreram na Amazônia Legal, sendo as comunidades indígenas as que mais sofreram com a devastação do fogo. O Estado com maior registro de desmatamento é o Amazonas com 19 ocorrências, seguido por Pará, com 17; Maranhão, com 14 e Rondônia, com 12.
Até a conclusão do mais recente levantamento, a maioria (235) das vítimas dos conflitos por terra eram os posseiros (habitantes de comunidades tradicionais que não detêm títulos de propriedade das terras), seguidos por quilombolas (116) e sem-terra (92). Já os maiores causadores dessas violências apontados pela CPT são os fazendeiros (339), seguidos por empresários (137); governo federal (88) e estaduais (44) e grileiros (33).
Já as principais vítimas dos conflitos pela água foram os povos indígenas, presentes em 35 casos registrados, seguidos por quilombolas (24), posseiros (21), ribeirinhos (18) e pescadores (13). Do outro lado, estão empresários (32), fazendeiros (26), hidrelétricas (23), mineradoras (19) e o governo federal (8), por meio de órgãos públicos que não cumprem procedimentos legais de garantia de políticas públicas aos povos e comunidades.
Os principais tipos de violência no eixo Água são de “Uso e preservação” e “Barragens e Açudes”. Entre as situações de conflitos registradas, o “Não cumprimento de procedimentos legais” (45 ocorrências em 2024), “Contaminação por agrotóxicos” (31) e “Destruição e/ou poluição” (29) são as que mais cresceram em relação ao ano anterior.
“É importante ressaltar que os números divulgados refletem apenas uma parte dos casos ocorridos em 2024, pois os dados só são consolidados após tramitação e validação pelos órgãos de fiscalização competentes”, explicou a comissão.
Todos os dados foram contabilizados pelo Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno (Cedoc), da CPT.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Justiça e Segurança Pública disse que tem em curso a pesquisa Memórias dos Massacres do Campo, que resgata histórias dos conflitos no campo a partir do levantamento documental dos processos e investigações. Com isto, a pasta pretende construir um acervo audiovisual de casos identificados entre 1985 e 2023 e assim ter uma melhor compreensão acerca do tratamento dado aos casos de violência no campo, especialmente em relação à apuração dos fatos, processamento e responsabilização. "A análise impulsionará a construção de políticas públicas para o aprimoramento das questões identificadas", disse em nota.
A reportagem da Agência Brasil entrou em contato com os ministérios do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar e do Meio Ambiente e Mudança do Clima e aguarda pelas respostas.
O Imirante entrou em contato com a assessoria do Governo do Estado e aguarda retorno.
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