Explicações

Recursos à obras do Incra desaparecem em Coroatá

O Estado do Maranhão

Atualizada em 27/03/2022 às 13h43

COROATÁ - Mais de R$ 2,6 mi-lhões que já deveriam estar contribuindo para tirar do isolamento e da falta d’água populações pobres de 11 povoados de Coroatá surgem agora como mais um alvo de suspeita de desvio criminoso dos recursos públicos dentro de uma prefeitura maranhense. O prefeito Luis Mendes Ferreira (PDT), o Luís Amovelar, terá de explicar ao Ministério Público Federal e ao TCU o que fez com o dinheiro recebido, a fundo perdido, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e daquilo que seria a contrapartida do município para a perfuração e instalação de poços artesianos e construção e conservação de estradas vicinais.

A conta exata é de R$ 2.605.189,18. A parte maior, R$ 2.344.670,26, saiu do Incra. Os 10% restantes, R$ 260.518,92, seriam a parte do município. Com esses recursos, entre 28 de junho e 24 de dezembro de 2006, o prefeito deveria ter construído 68 quilômetros de estradas vicinais, 101 metros de pontes de madeira, 216 metros de bueiros e 14 sistemas simplificados de abastecimento d’água. O dinheiro foi todo gasto, o prazo para terminar a obra se esgotou e nada pode ser dado como serviço concluído. Há local em que a obra nem foi iniciada.

O relatório final do Incra sobre o que Luis Amovelar realizou com os mais de R$ 2,6 milhões é implacável. “O padrão da execução das obras das estradas é péssimo, os bueiros não foram executados de acordo com as especificações técnicas (...) Existem trechos onde não foram implantadas obras de arte necessárias, bueiros inferiores aos do projeto, o desmatamento lateral não foi executado, a dimensão da pista de rolamento é inferior ao projetado e os serviços de revestimento primário são de péssima qualidade”, atesta Abilemar Alves Júnior, engenheiro do Incra.

No mesmo documento, o técnico responsável pela avaliação do serviço denuncia que as pontes estão cedendo, “pois não houve cravação das estacas”. Mais grave do que isso é que o material utilizado é de péssima qualidade, as pontes todas estão, em média, três metros menos extensas e um metro mais estreitas do que determinam os projetos. Todos os itens de segurança dessas pontes, como a fundação, o guarda-corpo, guarda-rodas, balancins, alas e cortinas, fogem completamente dos padrões mínimos de segurança.

Os 216 metros de bueiros que deveriam ser feitos ao longo das estradas são mais elementos de condenação da obra. Em determinados locais, os tubos de concreto foram deixados à margem da rodovia. Onde eles estão implantados as medições atestaram que estão fora das especificações de diâmetro de resistência. No Km- 19,5 do trecho entre os povoados Fazendinha e Betânia, os tubos colocadosm já foram quebrados.

Da mesma forma que as estradas, os sistemas de abastecimento d’água ficaram pela metade ou nem foram iniciados. Os poços estão sem proteção sanitária e subestação elétrica. Em alguns deles, ao invés dos conjuntos submersos do tipo “motobomba”, com compressão a diesel e que nunca funcionam. Em mais da metade dos sistemas não colocaram nem caixa d’água, e em todos eles a rede de distribuição é de menos de 20 metros de profundidade quando, no mínimo, deveria ter 80 centímetros.

Em povoados como Farinha Seca, o serviço de abastecimento nem chegou a ser iniciado. Em Paraíso, a moradora Sônia Gomes Muniz diz que o poço ficou com 130 metros de profundidade. “A água é salobra e não serve para a gente beber”, diz ela, apoiada por vizinhos e por pessoas dos demais povoados por onde passou a obra.

Quando viu a reação dos moradores dos povoados à medida que a obra foi sendo paralisada pela construtora, o prefeito Luis Amovelar tentou ganhar tempo no Incra, pedindo prorrogação do prazo, alegando que a construtora estava tendo dificuldades para comprar material no mercado e que as chuvas estavam atrapalhando os serviços, mas até para isso ele já havia perdido o prazo: as obras deveriam ter sido concluídas em 24 de dezembro de 2006 e um pedido de dilatação do prazo só poderia ser admitido antes daquela data. A solicitação do prefeito pedetista só foi feita no dia 13 de fevereiro de 2007.

Depois disso, já sem meios de remendar tudo o que se caracterizou como desvio de dinheiro dos cofres federal e municipal, o procurador da República Sergei Medeiros Araújo já solicitou do Incra todas as informações sobre o que se passa em Coroatá. O líder da oposição na Assembléia Legislativa, Ricardo Murad (PMDB), também já acionou o Tribunal de Contas da União, TCU. Na denúncia, Murad diz que, “a bem da verdade, houve simulação grosseira da execução do objeto do convênio” e que o dinheiro foi desviado.

Luís Amovelar esteve recentemente no centro de outro escândalo, com a descoberta da “drenagem”, por meio de construtoras fantasmas, de mais de R$ 1,3 milhão dos convênios que ele recebera do então governador José Reinaldo Tavares (PSB), no segundo semestre de 2006, exatamente durante a campanha eleitoral. “Diferentemente do caso com o dinheiro recebido do Estado, desta vez ele vai ter que se reportar ao Ministério Público Federal, que não tem demonstrado nenhuma tolerância com esse tipo prática criminosa”, diz o advogado Marcos Lobo, que assiste ao deputado Murad na denúncia apresentada ao TCU.

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