Economia

Teto do rotativo reduz endividamento, mas juros continuam altos

Medida vale apenas para novos financiamentos.

Mariana Tokarnia / AgĂȘncia Brasil

Atualizada em 03/01/2024 Ă s 23h49
Novo limite dos juros do rotativo do cartão de crédito é um importante passo para reduzir o endividamento no país. (Agência Brasil)

BRASÍLIA - Em vigor desde esta quarta-feira (3), o novo limite dos juros do rotativo do cartĂŁo de crĂ©dito Ă© um importante passo para reduzir o endividamento no paĂ­s, dizem especialistas. Eles alertam, no entanto, que a medida vale apenas para novos financiamentos e, mesmo com a redução, os juros continuam altos, e os consumidores devem tomar cuidado para nĂŁo se endividarem ainda mais.

Quando o consumidor não paga o valor total da fatura do cartão de crédito até o vencimento, automaticamente entra no crédito rotativo. Ou seja, contrai um empréstimo e começa a pagar juros sobre o valor que não conseguiu quitar. O problema é que a taxa do rotativo estå entre as mais altas do mercado.

Segundo os dados mais recentes do Banco Central (BC), em outubro juros do rotativo do cartão de crédito estavam, em média, em 431,6% ao ano. Isso significa que uma pessoa que entre no rotativo em R$ 100 e não quita o débito, deve o equivalente a R$ 531,60 após 12 meses.

Após 30 dias no crédito rotativo, os consumidores devem quitar a dívida ou entrar no crédito parcelado e negociå-la com as instituiçÔes financeiras.

Agora, essa taxa de juros no rotativo terĂĄ um teto de 100%. Quem deixa de pagar uma fatura de R$ 100, por exemplo, pode ter que pagar, no mĂĄximo, o equivalente a R$ 200 apĂłs 12 meses.

Segundo o diretor Executivo do Procon-SP, Luiz Orsatti Filho, a medida Ă© um passo importante. No entanto, acredita que a taxa idealmente deveria ser ainda menor. “[A medida] vai beneficiar o pĂșblico em geral e nĂŁo apenas o superendividado, que tem essa dĂ­vida com o cartĂŁo de crĂ©dito, mas o pĂșblico em geral que, Ă s vezes, precisa fazer algum tipo de financiamento”, diz. “Para um paĂ­s como o Brasil, esse Ă­ndice infelizmente ainda Ă© muito alto. É um passo importante, mas ainda temos muito a caminhar, mas nĂŁo deixa de ser um passo importante”, acrescenta.

EstatĂ­sticas

No Brasil, trĂȘs a cada quatro famĂ­lias estĂŁo endividadas. Segundo a Confederação Nacional do ComĂ©rcio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 76,6% das famĂ­lias brasileiras tĂȘm dĂ­vidas a vencer em cartĂŁo de crĂ©dito, cheque especial, carnĂȘ de loja, crĂ©dito consignado, emprĂ©stimo pessoal, cheque prĂ©-datado e prestaçÔes de carro e da casa. O maior percentual de dĂ­vidas em atraso (36,6%) Ă© dos consumidores de baixa renda, de atĂ© trĂȘs salĂĄrios mĂ­nimos.

A pesquisa mostra tambĂ©m que o cartĂŁo de crĂ©dito ainda Ă© o mais usado pelos endividados, atingindo 87,7% do total de devedores. “Qualquer crĂ©dito deve ser a Ășltima opção de qualquer situação. Pode ser uma emergĂȘncia, pode ser o acaso, mas deve ser a Ășltima opção, e claro, procurar instituiçÔes financeiras autorizadas pelo Banco Central, nĂŁo qualquer tipo de agente nĂŁo oficial. E, claro, buscar o crĂ©dito mais barato, seja ele consignado, pessoal e, por Ășltimo o rotativo”, diz Orsatti Filho.

Crescimento econĂŽmico

Segundo o presidente do Instituto Locomotiva e fundador do Data Favela, Renato Meirelles, a medida Ă© acertada, uma vez que o rotativo Ă© uma das maiores causas do endividamento. “Os juros do rotativo eram maiores do que os que qualquer consumidor de baixa renda pagaria a um agiota do bairro onde mora, por exemplo. Sei que a frase Ă© forte, mas Ă© uma verdade absoluta. NĂŁo tinha nenhum modelo de emprĂ©stimo que cobrava mais juros do consumidor e acredito que o crĂ©dito rotativo Ă© o verdadeiro responsĂĄvel pela inadimplĂȘncia”, ressalta.

À medida que a inadimplĂȘncia cair, diz Meirelles, surgirĂŁo novas necessidades dos consumidores. AlĂ©m disso, novas condiçÔes econĂŽmicas provocadas pela redução dos juros deverĂŁo influenciar a decisĂŁo das autoridades e dos bancos. “Se isso vai levar a uma queda ainda maior dos juros, isso o tempo vai dizer. Mas o que a gente vĂȘ Ă© um incentivo, um caminho da economia nacional de redução da taxa de juros, o que tem impacto grande na redução da inadimplĂȘncia, de um lado, e no aumento do crĂ©dito Ă  população de menor renda, por outro, o que incentiva o crescimento de toda a economia”, diz.

Pesquisas realizadas pelo Instituto Locomotiva em setembro de 2023 mostram a importùncia do crédito para os brasileiros, que acabam usando a modalidade para comprar bens de necessidade e também para realizar sonhos. Meirelles destaca também a importùncia da modalidade de parcelamento sem juros, cuja mudança ou extinção chegou a ser cogitada em 2023.

De acordo com o Instituto Locomotiva, a inadimplĂȘncia chega a 50% entre aqueles que parcelaram com juros, caindo para 33% entre os que parcelaram a compra sem juros. Por isso, para Meirelles, a redução do juro do rotativo foi acertada e terĂĄ impactos positivos.

Adequação dos limites

Para a professora de finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) Myrian Lund, a redução da taxa de juros deverĂĄ fazer com que os bancos e as instituiçÔes financeiras reduzam tambĂ©m os limites dos cartĂ”es de crĂ©dito “Cada banco te dĂĄ um limite astronĂŽmico e isso acaba levando as pessoas a consumir mais que a capacidade de pagamento”, diz.

Com a queda dos juros, as instituiçÔes deixarĂŁo de ganhar com as taxas dos endividados e isso poderĂĄ fazer com que revejam os limites, adequando-os Ă  capacidade de pagamento de cada consumidor. “O limite do cartĂŁo acaba virando complemento da renda. Na verdade, o que precisa Ă© um processo de educação financeira, onde tem que se adequar ao que ganha”.

A taxa de 100% da dĂ­vida total, diz Lund, continua alta. Por isso, a professora da FGV dĂĄ algumas dicas aos consumidores para evitar o endividamento. Primeiro, ter apenas um cartĂŁo de crĂ©dito ativo. “A nossa mente nĂŁo soma os vĂĄrios cartĂ”es que tem, sempre acha que gastou pouco”, justifica.

A segunda dica Ă© reduzir o limite do cartĂŁo, para evitar gastar alĂ©m do que se pode pagar. E, por fim, evitar o parcelamento sem juros, a nĂŁo ser para bens de maior valor como um notebook ou uma geladeira, evitando usar essa modalidade em compras diĂĄrias, como roupas, farmĂĄcia ou mercado. “Teria que guardar dinheiro para pagar no mĂȘs seguinte e sĂŁo rarĂ­ssimas as pessoas que fazem isso”, diz a professora.

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