Jornada profissional

Acidentes de trabalho no Brasil somam 612 mil em 2022

No ano passado, 2.538 trabalhadores morreram durante jornada.

AgĂȘncia Brasil

A área da saúde concentra grande parte dos acidentes de trabalho. (Rovena Rosa / Agência Brasil)

RIO DE JANEIRO - Uma pesquisa do ObservatĂłrio de Segurança e SaĂșde no Trabalho, disponibilizada pelo MinistĂ©rio PĂșblico do Trabalho (MPT), mostra que, em 2022, o Brasil registrou 612,9 mil notificaçÔes de acidentes relacionados Ă  jornada profissional. Isso resultou em 148,8 mil benefĂ­cios concedidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). JĂĄ o nĂșmero de Ăłbitos por acidente de trabalho no paĂ­s atingiu 2.538 no ano passado. Nesta quinta-feira (27), comemora-se o Dia Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho.

Estados

Entre as unidades federativas, São Paulo apresentou o maior volume de notificaçÔes por acidentes de trabalho (204.157), ou o correspondente a 35% do total. Minas Gerais vem em seguida, com 63.815 notificaçÔes, seguido do Rio Grande do Sul, com 50.491.

Em escala municipal, a capital paulista exerce a liderança, com 51.233 notificaçÔes, à frente do Rio de Janeiro (18.747) e de Belo Horizonte (11.776). O procurador do Trabalho Luciano Leivas avaliou que, considerando esses dados como absolutos, eles refletem um quadro da distribuição da população economicamente ativa no país.

“SĂŁo estados mais populosos, com maior empregabilidade e, por conta dessa maior concentração da população economicamente ativa, os dados absolutos apontam o estado de SĂŁo Paulo e outras unidades com maior população economicamente ativa ponteando esses dados”, disse ele, que tambĂ©m Ă© vice-coordenador da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente de Trabalho e da SaĂșde do Trabalhador e da Trabalhadora (Codemat), do MPT.

Trabalhadores da saĂșde

A ĂĄrea da saĂșde concentra grande parte dos acidentes de trabalho, representando 10% das notificaçÔes feitas ao INSS. A atividade de atendimento hospitalar Ă© o setor com mais acidentes de trabalho, somando 603.631 de 2012 a 2022. Nesse cenĂĄrio, a de tĂ©cnico de enfermagem detĂ©m o maior nĂșmero de acidentes de trabalho, da ordem de 313.654 no mesmo perĂ­odo. Leivas afirmou que a ĂĄrea da saĂșde tem essa peculiaridade porque, dentro dos serviços de saĂșde, existem meios mais cĂ©leres de notificação.

HĂĄ tambĂ©m subnotificação na ĂĄrea da saĂșde. “Muitos serviços diversos do setor hospitalar deixam de fazer as comunicaçÔes de acidente de trabalho por vĂĄrios motivos”, afirmou. Por outro lado, explicou que como a atividade hospitalar Ă© vocacionada para o atendimento Ă  saĂșde, os dados tendem a ser mais prĂłximos da realidade.

Por ter uma notificação regular mais fidedigna, o setor de saĂșde tende a ter uma estatĂ­stica consolidada mais elevada. O procurador do Trabalho disse que, em tese, os setores que adotam como prĂĄtica a subnotificação poderiam ter mais adoecimentos e acidentes relacionados ao trabalho do que aqueles que estĂŁo efetivamente registrados.

Repressão x prevenção

Leivas esclareceu que a atuação do MPT para reduzir o volume de acidentes de trabalho e garantir a saĂșde do trabalhador se dĂĄ de duas maneiras: repressiva e preventiva. Na modalidade repressiva – quando o fato jĂĄ aconteceu –, o MPT trabalha junto com os centros de ReferĂȘncia em SaĂșde do Trabalhador, do MinistĂ©rio da SaĂșde, para instalação de um inquĂ©rito civil. O ĂłrgĂŁo tambĂ©m exerce atividades de fiscalização para identificar falhas no gerenciamento dos riscos do ambiente de trabalho, buscando a regularização.

A forma preventiva, ou promocional, se dĂĄ por meio dos projetos nacionais temĂĄticos. A Codemat tem cinco grandes projetos. Um deles Ă© o fortalecimento da saĂșde do trabalhador no Sistema Único de SaĂșde (SUS). Esse projeto nĂŁo aborda casos de fraturas, queimaduras, lesĂ”es e atĂ© mesmo Ăłbito decorrente de um fato instantĂąneo, mas o adoecimento relacionado ao trabalho. Ou seja, a exposição a agentes quĂ­micos, fĂ­sicos e biolĂłgicos no ambiente laboral e que leva ao funcionĂĄrio adoecer, atĂ© mesmo depois de sair do emprego, adquirindo um cĂąncer ou uma lesĂŁo por esforço repetitivo, por exemplo.

“O SUS Ă© que acaba acolhendo esse trabalhador adoecido”. Esse projeto nacional do MPT fortalece o SUS, buscando identificar onde o trabalhador estĂĄ adoecendo e, aĂ­, tentar fazer as medidas de adequação do setor econĂŽmico.

Hå também o projeto de combate à subnotificação. Os dados do INSS se reportam apenas ao trabalhador do mercado formal, que tem carteira assinada, e não contemplam os aqueles do mercado informal ou os que mesmo no mercado formal, sofrem acidentes e adoecimentos não notificados pelas empresas. A meta é demonstrar mais claramente a realidade acidentåria no Brasil.

O projeto que objetiva o banimento do amianto como matĂ©ria-prima da indĂșstria nacional obteve este ano decisĂŁo favorĂĄvel do Supremo Tribunal Federal (STF). “HĂĄ uma tendĂȘncia de redução de cĂąnceres decorrentes da exposição ao amianto”. Outra ação promove a saĂșde do trabalhador nos frigorĂ­ficos, que sĂŁo um ambiente “extremamente hostil Ă  saĂșde humana”, disse Leivas. Por fim, um projeto multissetorial busca fazer protocolos ou diretrizes sobre fatos causadores de cĂąncer relacionados ao trabalho. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, parte significativa dos adoecimentos com diagnĂłstico de cĂąncer tĂȘm relação com o trabalho.

Prevenção

De acordo com Luciano Leivas, a questĂŁo da prevenção de acidentes de trabalho merece destaque. “Do ponto de vista econĂŽmico, os acidentes de trabalho tĂȘm grande impacto, e tambĂ©m na PrevidĂȘncia Social, traduzidos por valores elevados de benefĂ­cios, como pensĂŁo por morte, aposentadorias por invalidez, auxĂ­lio-doença por incapacidade temporĂĄria, decorrentes de acidentes de trabalho”.

Leivas afirmou que as datas comemorativas sĂŁo importantes, bem como fazer reflexĂ”es sobre o problema. “Mas a questĂŁo tem que ser levada para dentro das empresas e sindicatos, construir uma cultura de prevenção de acidentes do trabalho, que vĂĄ alĂ©m da ideia do equipamento de proteção individual (EPIs), que, muitas vezes, nĂŁo tem a menor eficiĂȘncia para prevenir um acidente”.

Segurança

O presidente da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANMAT), Francisco Cortes Fernandes, explicou que a questão da segurança e da medicina do trabalho é um processo interligado. O engenheiro ocupacional, por exemplo, reconhece os riscos existentes no local de trabalho, comunicando se estão acima ou abaixo do limite de tolerùncia de exposição ocupacional.

Ao engenheiro de segurança e trabalho cabe propor medidas de segurança quando os riscos que estão dentro do ambiente de trabalho ultrapassam os limites de segurança. Ao médico do trabalho, por sua vez, cabe identificar, através de exames ocupacionais, as doenças relacionadas à exposição ao risco ou que não foram ou não estão sendo bem controladas.

Fernandes afirmou que existem empresas no Brasil com padrĂ”es de excelĂȘncia em segurança e cumprem a legislação vigente. Outras, por sua vez, estĂŁo fora da normativa de segurança do paĂ­s. “Como existe em todas as profissĂ”es e setores, hĂĄ casos Ăłtimos, bons e ruins”, externou o presidente da ANMAT Ă  AgĂȘncia Brasil.

Célula de cultura

A mestre em fisiologia do exercĂ­cio pela Universidade Federal de SĂŁo Paulo (Unifesp), Bianca Vilela, afirmou que as empresas tĂȘm um papel preponderante para evitar acidentes no ambiente corporativo. “É o exemplo que, depois, deve ser levado para fora da empresa”. Bianca destacou que a empresa Ă© uma cĂ©lula de cultura que vai abordar ali a saĂșde e a segurança de seus colaboradores.

Em uma linha de montagem de veículos, por exemplo, hå vårios materiais como prensa, martelos, e uma série de situaçÔes que podem gerar acidentes. Para evitar que esses acidentes aconteçam, existem normas que vão regulamentar a segurança do colaborador. Aí entram os chamados EPIs. Se a pessoa vai manusear algo cortante, ela tem que ter uma luva específica. Para suportar ruído maior do que deveria, o trabalhador deve usar um protetor auricular.

“Todos esses cuidados devem ser o coração da empresa, para que o colaborador volte para casa saudĂĄvel. NinguĂ©m quer voltar sem um dedo ou com alguma torção ou, atĂ© mesmo tendo um incidente de trabalho, que Ă© antes do acidente. SĂŁo coisas que vocĂȘ quase tropeça, quase se corta. Todos esses cuidados fazem parte do dia a dia da empresa”, ressaltou a fisiologista.

Conscientização

É necessĂĄrio, tambĂ©m, que haja conscientização da parte dos trabalhadores, porque existe muita gente resistente a seguir as normas. A fisiologista salientou que quem desempenha um serviço hĂĄ muitos anos sem problemas, pode ter uma falsa impressĂŁo que estĂĄ imune a acidentes.

“Isso Ă© muito perigoso. A empresa precisa dar esse fomento de treinamento e de equipamentos, mas o colaborador tem uma palavra muito importante nesse processo, que Ă© a aceitação. Ele precisa aceitar aqueles procedimentos corretos para que ele mesmo seja o beneficiado”. QuestĂ”es importantes no dia a dia de trabalho, como a ginĂĄstica laboral, vĂȘm em seguida. “AĂ­ vocĂȘ vai criando a cultura de saĂșde e segurança, que sĂŁo inseparĂĄveis”, afirmou Bianca Vilela.

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