Relatório

CPI da Pandemia atribui nove crimes ao presidente Jair Bolsonaro

Comissão aprovou relatório sugerindo 80 indiciamentos.

Agência Estado

Atualizada em 26/03/2022 às 19h18
O relatório final de Renan Calheiros foi aprovado com sete votos favoráveis e quatro contrários (Marcos Oliveira/Agência Senado)

A CPI da Covid aprovou seu relatório final nesta terça-feira, 26, após seis meses de trabalho, e manteve o foco no pedido de indiciamento de Jair Bolsonaro. O presidente é acusado de ser o responsável pelo agravamento da pandemia de coronavírus, que deixou mais de 600 mil mortos no País. Com 1.288 páginas, o relatório do senador Renan Calheiros (MDB-AL) - que passou com um placar de sete votos a favor e quatro contrários - também pede o indiciamento de mais 77 pessoas e duas empresas.

"Há um homicida no Palácio do Planalto", disse Renan, em um duro discurso no qual afirmou que Bolsonaro agiu como "missionário enlouquecido para matar o próprio povo". Em seu último discurso, o senador afirmou que "bestas feras" tentaram ameaçar a CPI, mas não obtiveram sucesso.

Votaram a favor do relatório que agrava a crise do governo os senadores Eduardo Braga (MDB-AM); Humberto Costa (PT-PE); Omar Aziz (PSD-AM); Otto Alencar (PSD-BA); Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Tasso Jereissati (PSDB-CE), além do próprio relator. Já os votos contrários vieram dos senadores Eduardo Girão (Podemos-CE); Jorginho Mello (PL-SC); Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Marcos Rogério (DEM-RO).

No caso de Bolsonaro, o texto final aprovado pede o indiciamento do presidente por nove crimes. Os crimes comuns nos quais ele é citado são epidemia com resultado morte; infração de medida sanitária; charlatanismo; incitação ao crime; falsificação de documento particular; emprego irregular de verbas públicas e prevaricação, conforme definidos pelo Código Penal; os crimes contra a humanidade são de extermínio, perseguição e outros atos desumanos, arrolados no Tratado de Roma, do qual o Brasil é signatário. A CPI ainda pediu o indiciamento de Bolsonaro por crimes de responsabilidade - violação do direito social e quebra de decoro do cargo.

A lista encabeçada por Bolsonaro segue com os pedidos de indiciamento de seus três filhos com carreira política - o senador Flávio (Patriota-RJ), o deputado Eduardo (PSL-SP) e o vereador carioca Carlos (Republicanos). O texto também pede o indiciamento de empresários bolsonaristas, blogueiros de direita que disseminaram desinformação na pandemia, dirigentes do Ministério da Saúde e especialistas que integraram o chamado "gabinete paralelo", núcleo de assessoramento do presidente durante a pandemia.

As últimas mudanças no relatório de Renan foram decididas em uma reunião do grupo majoritário da CPI na noite desta segunda-feira, 25. O encontro, realizado no apartamento funcional do presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM), se estendeu pela madrugada. Na ocasião, os senadores decidiram pela inclusão do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), no rol de indiciados, além do ex-secretário de Saúde, Marcellus Campêlo, entre outros.

Antes das inclusões, o número de indiciados era de 70 pessoas. Várias delas tiveram seus nomes incluídos e removidos do relatório nas sucessivas versões. A última leva de indiciamentos foi patrocinada pelo vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

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Na manhã desta terça, a lista chegou a 79 pessoas: Renan incluiu o senador Luis Carlos Heinze entre os indiciados. Depois, atendendo a uma questão de ordem de Alessandro Vieira, o nome do gaúcho acabou retirado da lista. Ao incluir o colega de CPI, o alagoano disse que Heinze "reincidiu" na divulgação de informações falsas. "Pela maneira como incitou o crime em todos os momentos, eu queria, nesta última sessão, dar um presente a vossa excelência: (...) será o 81º indiciado desta comissão", disse o relator, anotando em seguida o nome de Heinze no relatório, à caneta.

A participação de Heinze na CPI ficou marcada pela defesa de teses como a suposta eficácia do "tratamento precoce" na cidade de Rancho Queimado (SC).

O relatório da CPI deve ser apresentado ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), na manhã desta quarta-feira, 27. Depois, as conclusões da comissão serão enviadas ao Ministério Público: a parte que diz respeito a Bolsonaro será encaminhada à Procuradoria-Geral da República (PGR); outras partes da apuração serão apresentadas às unidades do MPF nos Estados e aos MPs de cada unidade da Federação, a depender do tipo de crime e das pessoas envolvidas.

Uma reunião dos senadores da CPI com o procurador-geral da República, Augusto Aras, também está marcada para a manhã desta quarta, 27; semanas atrás, Aras disse que tomará providências e que não será omisso diante dos fatos levantados pela comissão. Caso o procurador-geral da República não dê sequência às investigações, os integrantes da CPI estudam ingressar com uma ação penal privada subsidiária no Supremo Tribunal Federal (STF)

Segundo o advogado criminalista Fernando Castelo Branco, o pedido de indiciamento da CPI é diferente daquele feito pela polícia. "A CPI é um poder investigatório, criado para apurar fatos e a responsabilidade por esses fatos. O efeito prático (do pedido de indiciamento) é dar, no relatório final, um destaque para esses personagens. No final, caberá ao Ministério Público proceder ao acolhimento ou não dessas acusações, para fazer uma denúncia (formal)", diz ele, que é professor de processo penal no curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

"O que motivou esta Comissão Parlamentar de Inquérito foi, em janeiro deste ano, vermos irmãos morrendo. Foram (...) as trágicas cenas de Manaus. Foram as filas do desespero pelos cilindros de oxigênio (...). Quantas mesas de jantar nas casas das famílias brasileiras estão incompletas no dia de hoje por causa do descaso? Já foi dito aqui: pelo menos 200 mil irmãos nossos poderiam estar entre nós. Quantos amigos e parentes não poderiam estar neste momento na sala de TV assistindo a conclusão deste trabalho? E isso não foi por acaso: teve responsabilidade (do governo federal)", disse o vice-presidente do colegiado, Randolfe Rodrigues

"O crime central que encontramos foi fartamente demonstrado: o crime de epidemia agravado pelo resultado morte (...). É evidente que o presidente da República não criou o vírus, mas é tão evidente quanto que o presidente se esforçou para acelerar a propagação do vírus", argumentou o senador Alessandro Vieira.

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