BRASÍLIA - A ausência de defensor durante julgamento levou o ministro José Arnaldo da Fonseca, da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a conceder liminar ao deputado estadual João Rodrigues, do Partido da Frente Liberal (PFL), de Santa Catarina. A decisão suspendeu os efeitos da decisão da Justiça Federal no Sul do país que condenou Rodrigues a dois anos e quatro meses de reclusão por calúnia e racismo contra os índios.
O crime teria ocorrido quando o deputado apresentava um programa de televisão. Nos comentários, que teriam sido veiculados há dois anos, Rodrigues teria se posicionado favorável aos agricultores na disputa de 900 hectares de terra – atualmente ocupados por produtores rurais – que devem ser usados para a ampliação da reserva indígena Toldo Chimbangue. Ele teria, segundo a denúncia, acusado falsamente os índios da região de cometerem crimes de violação de domicílio, dano e furto, bem como teria atribuído fatos ofensivos à reputação deles. A ação começou a correr na primeira instância da Justiça Federal em Chapecó (SC).
Rodrigues foi citado para apresentar o direito de retratação, disposto no artigo 26 da Lei de Imprensa. Segundo esse artigo, a retratação ou retificação espontânea, expressa e cabal, feita antes de iniciado o procedimento judicial, excluirá a ação penal contra o responsável pelos crimes de injúria e calúnia. O que ele fez espontaneamente, mas como não foi divulgada a denúncia foi recebida em junho do ano seguinte, afirma a defesa do deputado.
Quando ele assumiu o cargo de prefeito de Pinhalzinho (SC), em agosto de 2001, o caso foi remetido ao Tribunal Regional Federal da Quarta Região, sediado na capital gaúcha. Ali, o Ministério Público Federal solicitou que os atos processuais fossem refeitos a partir da diplomação de Rodrigues no cargo, mas o juiz federal relator do caso entendeu que os fatos se deram antes de sua diplomação.
O resultado foi sua condenação, em outubro de 2002, contra a qual a sua defesa interpôs embargos de declaração (tipo de recurso em que se alega ter havido obscuridade, omissão ou contradição na decisão). A alegação é que o julgamento deveria ser considerado nulo devido à incompetência daquele tribunal tendo em vista ele não mais exercer o cargo de prefeito por ocasião de sua realização. Segundo a defesa, teria havido, ainda, cerceamento de defesa devido à ausência de intimação do réu diante do surgimento de circunstância elementar nova (mutatis libelli). Esse recurso foi acolhido, o julgamento foi anulado, mas a condenação foi mantida na mesma sessão.
É contra essa decisão que a defesa de João Rodrigues impetrou habeas-corpus no STJ. Segundo alega, a denúncia imputou a Rodrigues, inicialmente, a prática dos crimes de calúnia e difamação, previsto na Lei de Imprensa. Depois de encerrada as instrução processual, após ouvidas as testemunhas de acusação e de defesa, o MPF acrescentou à denúncia o crime de racismo, "conduta mais grave" do que as que ele havia sido inicialmente acusado. Contra essa última acusação, a defesa de João Rodrigues não se manifestou, dessa forma ele foi condenado sem que lhe tenha sido dada a oportunidade de apresentar defesa, sustenta os advogados, para quem ficou demonstrada a violação flagrante do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
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João Rodrigues, afirma a defesa, jamais tomou conhecimento que estava sendo processado pelo crime de racismo, eis que a notificação foi feita pela imprensa à pessoa de seu antigo advogado, que deixou transcorrer o prazo para defesa e produção de provas sem nada fazer. Diante desses argumentos, os atuais advogados do deputado catarinense pedem que seja decretada a nulidade do processo.
Decisão
Ao analisar o pedido, o ministro Jose Arnaldo da Fonseca considerou plausível o defeito apontado pelos advogados de que houve cerceamento de defesa pela falta do seu defensor no julgamento. O ministro considerou dois aspectos. O primeiro que foi anulado o julgamento quando apreciados os embargos de declaração. E, depois, nos próprios embargos e na mesma assentada, o relator naquele tribunal ter votado no sentido de que reconhecia a nulidade do acórdão e que renovava o julgamento da ação penal nos mesmos moldes da decisão reafirmando integralmente seus termos. A decisão salientou que a defesa não sofria nenhum prejuízo, visto que a seção já havia firmado seu entendimento sobre o mérito da causa, e o procedimento adotado buscava apenas evitar a "desnecessária repetição do julgamento".
"Ora, nos embargos declaratórios não cabe sustentação oral, e alega-se ausência do defensor do acusado", afirma o relator. Diante disso, concedeu a liminar para suspender os efeitos da decisão condenatória, determinando que o presidente da Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da Quarta Região fosse comunicado e fossem solicitadas informações. Após o que o processo será enviado ao Ministério Público Federal para que seja emitido parecer. Somente depois que o processo retornar ao STJ, o ministro analisará o mérito do pedido, submetendo seu entendimento aos demais ministros da Quinta Turma.
João Rodrigues exerce sua primeira legislatura na Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina. Foi eleito deputado estadual, em 2002, com 48.308 votos. Quando ocorreu o fato do qual ele foi acusado, Rodrigues era radialista e apresentava um programa de televisão.
As informações são do Superior Tribunal de Justiça.
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