SÃO LUÍS – A cidade de São Luís, ao longo de sua história, tem sido berço de importantes nomes da literatura maranhense e brasileira. Nos dias atuais, o cenário não é tão diferente. A Atenas Brasileira continua nos presenteando com produções nobres e marcantes.
Em muitas dessas obras, produzidas na terra de Ferreira Gullar e Nauro Machado, a própria capital maranhense é o ponto de partida para criações literárias. Nesta data querida, o Imirante.com conversou com três escritores maranhenses que buscaram inspiração na ilha para algumas de suas publicações.
A tórrida e misteriosa São Luís de Vinícius Bogéa
O escritor Vinícius Bogéa vê a nossa Atena como um maravilhoso cenário para o desenrolar de romances policiais. Isso ele demonstra em dois livros lançados há pouco tempo, Céu de Ilusões: sobre crimes e artes (2008) e Diário Oculto (2009). O primeiro é uma trama baseada em um assalto ao Museu Histórico e o segundo, uma novela de investigação jornalística.
“Comecei a ler Agatha Christie, Raymond Chandler... Sempre gostei de escrever desde criança, escrevia contos de terror, assisti muito Sexta-feira 13”, relata Bogéa.
Apesar de ter nascido em Viana (MA), ele revela o forte laço que tem com a cidade onde cresceu. “São Luís é inspiradora, é exótica. Dá pra gente criar personagens muito profundos, criar cenários com o Centro Histórico. Boa parte se passa no Centro Histórico, essa região do São Francisco, os arredores do Centro. Toda vez que eu escrevo, só me vem São Luís como plano de fundo”, ressalta.
Aos 39 anos, o escritor e jornalista lamenta a desvalorização da cultura local e, também, a queda no número de leitores. “São Luís tem muitos poetas, e isso me inspira e me dá mais força para escrever. Me sinto cada vez mais tentado, não me acomodo por as pessoas deixarem de ler. A gente procura escrever e passar essa sensação de querer ler, de querer se inspirar também”, pontua.
As São Luíses de Celso Borges
Quem anda pelas ruas do Centro Histórico da cidade talvez tenha se deparado algum dia com as declamações poéticas do jornalista e escritor Celso Borges.
Nascido no coração da ilha magnética, precisamente em 1959, Celso viveu boa parte de sua vida em São Luís, trazendo, in memoriam, significados e afetos. Aos 30 anos, mudou-se para São Paulo, no qual morou até 2009. Passou a viver a ilha de longe recheada de lembranças e memórias, ao mesmo tempo que, percebia suas fraturas e vícios de província. Assim que retornou à cidade, encontra uma São Luís ainda fraturada, mas alguns encontros e vivências traz de volta o prazer de residir novamente na cidade.
Suas obras transpassam o papel. Têm formatos, cores, gosto e arranjos sonoros. Em sua bagagem literária, traz 11 livros de poesia, entre eles Pelo Avesso (1985) e Persona Non Grata (1990); a trilogia A posição da poesia é oposição que reúne três livros-CD: XXI (2000), Música (2006) e Belle Époque (2010); e O futuro tem o coração antigo (2013).
Seu primeiro contato com a poesia foi aos 17 anos, quando começou a escrever. Suas referências foram muitas: desde Pablo Neruda a Mark Twain. Entretanto, não mais do que a cidade de São Luís, esta que sempre foi protagonista de grande parte de seus escritos. Até quando estava longe de sua terra natal, Celso a trazia para perto como memória viva em suas obras.
“Em quase todos meus trabalhos de poesia há alguns textos em que falo da cidade, uns mais, outros menos. No instante da cidade é o primeiro em que me jogo sobre a cidade pra valer. Estão ali minhas descobertas de primeira juventude, outros lugares da cidade, além do centro, os muros, personagens e amigos da universidade etc. Em Belle Époque e Fúria, ela aparece mais claramente. Minha poesia é resultado do espaço físico onde vivo e das pessoas e invenções que encontro. É um grande caldeirão de pedra, carne, sonhos e delírios.”, discorreu.
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Em sua obra mais recente sobre a cidade de São Luís, O futuro tem o coração antigo, Celso traz um poema longo que leva o título do livro. Depois, segue 50 poemas curtos, de uma a três linhas, que dialogam com clicks fotográficos da cidade que ele encontrou no seu retorno.
“Não fico apenas com o retrato do Centro Histórico, mas atravesso as pontes São Francisco e Bandeira Tribuzi e falo das praias sujas, dos shoppings com suas salas de cinema sem alma, das cercas elétricas do Calhau e Renascença e dos galos que já não tem hora para anunciar a manhã”, explicou.
Celso não se considera saudosista. Para ele, o presente e o passado tem a sua importância e o seu lugar. Ama a cidade de ontem e de hoje, com as suas belezas e contradições. Ama a infância que vivenciou e o agora. Intensamente.
A Ilha em recortes de Talita Guimarães
As vivências cotidianas na cidade de São Luís também foram fonte de inspiração para a jornalista e escritora Talita Guimarães. Natural de São Luís, Talita teve o seu primeiro contato com a escrita aos 16 anos. Também é autora do livro e Vila Tulipa (2007), contemplado com o Prêmio Odylo Costa Filho, no XXX Concurso Literário e Artístico Cidade de São Luís, em 2006.
Recorte! (2015) é o segundo livro de sua trajetória literária e reúne crônicas, poemas, breves narrativas, contos e não-recortes (no caso, textos que abordam sobre dúvidas e lamentos) que dialogam com desenhos feitos pela autora.
A obra é dividida em dois momentos: Caderno Vermelho de Recortes (2010 a 2013) e Caderno Amarelo de Recortes (2014). A ideia de produzir o livro partiu de suas inquietações em aprender a lidar com a realidade do mundo, ou seja, de suas andanças pela ilha, como ela mesmo define.
“Comecei a olhar para as pessoas, para as cenas, para as paisagens e reportar o que eu via e como eu me relacionava com o que eu via. Tanto que o primeiro recorte do livro surgiu a partir de uma vivência minha com uma criança no ônibus. É a partir daí que começo a ver São Luís com outros olhos”, explicou.
Questionada sobre um texto do livro que ela tem como especial, na mesma hora, Talita mergulhou em sua mente e resgatou a reminiscência da Praça da Alegria, local onde passou boa parte de sua infância e sente certo saudosismo.
“Eu gosto muito de uma crônica que se chama Passeio pela lembrança de um lugar que fala sobre a Praça da Alegria. Uma memória minha, de infância, da minha Praça da Alegria e de como hoje ela está completamente diferente. No texto, eu resgato a praça de antes para lembrar de como a cidade era pra mim naquela época”, disse.
Recorte também é uma obra que demonstra amor a ilha magnética nos mínimos detalhes; é um convite para olhar para a cidade com mais afeto e identificar momentos e diálogos rápidos que fazem você ganhar o dia, mas ao mesmo tempo, mostra a realidade triste e feia da cidade, como a cena de uma criança sorrindo e um engraxate sujo e descalço, ambos transitando todos os dias pelas pessoas.
“São Luís é uma cidade muito viva. É uma cidade que te exige atenção e cuidado. Ela também exige que você aprenda a gostar dela, pois ela não te conquista de cara. Eu que cresci aqui, aprendi a amar a minha cidade. Aprendi a identificar as coisas bonitas e as feias, sendo estas, motivos da gente cuidar um pouco mais para construir uma cidade melhor”, explicou.
Tomo um fragmento parafraseado de um dos escritos da Talita para finalizar este texto: Que a cidade de São Luís possa ser um poema vivo e todos os dias nos lançar versos novos.
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