IMPERATRIZ - Quem ver o goiano Rômulo Leal, no palco fazendo mixagens, nem de longe imagina se tratar de um padre. Apaixonado por música eletrônica, e, também, pelo sacerdócio, o religioso consegue conciliar as duas coisas, e tem roubado a cena nos eventos católicos em Imperatriz, com sua contagiante Cristoteca.
A história de Rômulo Leal, hoje com 40 anos, é bem diferente da história da maioria de jovens que decide seguir no sacerdócio. É que antes de estudar para ser padre, Rômulo era da noite, e tinha uma carreira como DJ. “Eu vivia de festa em festa, era muito baladeiro (risos). Com a facilidade que eu tenho de fazer amizades, então fiz amizades com os DJs que animavam a noite. Eles foram me ensinado, e nesse ensinar, eu ficava no lugar deles, enquanto desciam para a pista. Com isso, fui aprendendo e exercendo. Mas era mesmo por diversão, nunca ganhei dinheiro com isso”, relembra o sacerdote, como tudo começou.
Apesar de gostar de festas e da vida na noite, Rômulo que ainda não era padre, conta que sentia um vazio no coração. “Em 1996, eu fiz uma experiência de Deus, que mexeu muito comigo, onde participei de uma tarde de louvor de um grupo de oração, na cidade que estava morando, Cezarina (GO)”, explica. “Depois dessa experiência, aquele prazer que eu sentia de estar em festa, balada, mas que não preenchia, de repente eu me sentir preenchido. Então, eu entrei para o grupo de oração. Abandonei completamente a noite, abandonei tudo e fiquei só no trabalho para com a igreja”.
Boa pinta, em seus tempos de balada, o padre assume que era namorador. Mas na igreja, ele conta que arrumou uma namorada, chamada Sílvia, que o ensinou a viver dentro da igreja. “Gostava muito dela, mas Deus moveu meu coração para um chamado vocacional. Eu olhava para o padre e admirava o sacerdócio, e principalmente, a espontaneidade de estar junto com o povo, a dedicação pelas coisas sagradas. Isso me chamou a atenção e foi me incomodando a ponto de chegar e dizer: ‘vou fazer um estágio vocacional’. Só que eu peguei uma aposta com um amigo chamado Demis, que chegou na frente da minha namorada e disse: ‘Rômulo, você tem jeito de padre. Por que você não estuda para ser padre?’. Eu disse não. Não quero saber disso, de jeito nenhum”, relembra.
Mesmo sem querer ser padre, porém, incentivado pelo amigo Demis, resolveu fazer um acompanhamento vocacional, um retiro. “Quando o bispo Dom Washington fez uma dinâmica conosco, de entregar uma folha em branco, para a gente escrever tudo que a gente tinha vivido do retiro vocacional. Se fosse para entrar naquele momento no seminário, eu entraria ou não? Nesta hora bateu uma crise de consciência. Meu coração pedia para entrar, mas ao mesmo tempo, eu olhava para minha família, para minha namorada, meu trabalho. E pensava; ‘não é para entrar’. Não sei porque num instante eu escrevi sim e coloquei dentro da caixinha, mas aquilo me incomodou. Aí foi a hora que resolvi entrar para o seminário”, relembra o padre, então com 24 anos.
Apaixonado pela namorada Silvia, que o ensinara a viver dentro da igreja, Rômulo fez com ela um “contrato” verbal. “Era muito namorador, tive muitas namoradas. Como sou de uma família festeira, impulsionava cada vez mais. Tinha algumas moças que namorava, que minha mãe nem gostava, outras gostava bastante, como a Sílvia, por exemplo, que foi o grande amor da minha vida. Mas que não deu certo porque eu fui para o seminário”, conta antes de explicar sobre o contrato com a então namorada.
“Uma vez em oração, eu falei para Deus: ‘Senhor, eu só vou para o seminário se Sílvia terminar comigo. Eu tinha certeza de que ela não ia terminar, que eu sabia que ela gostava de mim, como eu gostava muito dela. Ela veio conversar comigo sobre minha crise vocacional, e pediu um tempo. Nesse tempo, fui para o seminário para tentar tirar isso (sacerdócio) da minha cabeça. Então, fizemos um ‘contrato’: eu ficar no seminário um ano e ela ficar sem namorar. Depois de um ano a gente ia se encontrar, para saber no final o que a gente queria”, ressalta, lembrando que a paixão pelo seminário falou mais alto. “Eu voltei e falei para ela, ‘Silvia, vou ficar no seminário’. Ela chorou, eu chorei também, e cada um seguiu sem caminho”, detalha.
Ordenação Sacerdotal
Após 12 anos de estudos, Rômulo foi ordenado padre. Dehoniano, da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus (SCJ), ele veio parar no Maranhão para sua missão sacerdotal. Foi nomeado vigário paroquial de uma igreja, na pacata cidade de Santa Luzia, onde surgiu o projeto Cristoteca.
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Cristoteca
O projeto nasceu com a finalidade de promover diversão aos jovens da igreja, a partir de uma inspiração adquirida durante um período de dois anos em que Rômulo viveu em São Paulo (capital). “Tinha um padre lá que trabalhava com os jovens, dessa forma. Quando eu vim para Santa Luzia, eu via que eles (os jovens) não tinham diversão. Era só da igreja para o colégio, e não saiam para diversão nenhuma. Foi então, que resolvi fazer uma Cristoteca, o primeiro Encontro da Juventude Ddehoniana (EJD)” ressalta o sacerdote, que para sua surpresa, a festa reuniu aproximadamente 300 jovens. O sucesso foi tanto que foram realizadas várias edições em Santa Luzia.
Ao ser transferido para Imperatriz, há pouco mais de um ano, o padre resolveu continuar com o projeto. Pároco da Igreja Santa Cruz, localizada no bairro Vila Lobão, cuja igreja foi a que recebeu a primeira edição do evento, na segunda maior cidade do Maranhão. Não demorou muito tempo para a Cristoteca fazer a cabeça dos jovens e o projeto se expandir para as demais igrejas que compõem a Diocese de Imperatriz. O projeto reúne pessoas de todas as idades, entre jovens, idosos e crianças. Para o padre, a Cristoteca é uma forma de levar os jovens para a igreja.
“É uma forma de entretenimento coma as músicas católicas cristãs. Mas também uma forma de trazer os jovens para a igreja”, avalia o padre, que já participou de um dos maiores festivais de música eletrônica do mundo, o Tomorrowland. “Eu fui para o Tomorrowland, com essa curiosidade de saber o que festival oferecia e que atrai tanto a juventude. O que tem lá de entretenimento que eu poderia ver, avaliar e remodelar para a nossa evangelização”.
Além de evangelizar por meio da música e da dança, o padre ressalta que a Cristoteca é uma experiência mútua. Ou seja, boa para os jovens e para ele. “Tenho crescido muito com isso. Uma, que já não sou jovem mais. No entanto, a energia dos jovens que vem durante os encontros que a gente faz, é sem igual. Eles participam com a gente, rezam junto comigo, cantam, dançam, isso é cativante”.
Assédio
Com pinta de galã, e bem aceito pelo público jovem, sobretudo o público feminino, o padre, que é celibatário convicto, garante que consegue lidar com o assédio, sem cair em tentação. “Na verdade, existe um respeito muito grande delas para comigo. Aqui em Imperatriz, principalmente, aconteceu uma ou duas vezes de uma ou outra pessoa passar uma cantada”, garante o sacerdote, que para evitar esse tipo de coisa, toma algumas precauções.
“Eu me imponho, não dou tanta liberdade. Brinco, me divirto, danço. Mas tem o limite para tudo isso. Tenho esse cuidado para comigo e para com elas (as fieis), jura o padre, que vai mais além. “Eu posso contar nos dedos as cantadas que levei aqui em Imperatriz”, afirma, lembrando do acolhimento dos fiéis da cidade, que o recebeu de braços abertos. “Para mim foi extraordinário. Primeiramente, foi na paróquia de Santa Cruz, a acolhida, disponibilidade, tudo que eu precisava as pessoas se colocaram à disposição. Isso me encheu o coração. Depois foi se espalhando ao longo de toda a cidade, por toda paróquia que eu passo, sou muito bem acolhido”, diz, orgulhoso, o padre DJ, Rômulo Leal, como é conhecido na cidade.
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