Artigo

O sumiço de Vandré

José Ewerton Neto *

Atualizada em 11/10/2022 às 12h15

Por onde andará Geraldo Vandré? O que foi feito dele? As perguntas, parecidas, referem-se à perplexidade e, até mesmo, a uma indisfarçável e injustificada indiferença da mídia e dos seus fãs, diante do destino de um dos maiores ídolos da MPB que, nos idos dos anos 70 (especialmente na época áurea dos festivais) era tão admirado quanto Chico Buarque e Caetano Veloso.

Essa questão me motivou a adquirir o livro Geraldo Vandré, o homem que disse não! De outras fontes eu soubera que ele se tornara esquivo aos holofotes e à mídia, e preferira o caminho das sombras.

Por que decidira assim? Qual seria a razão oculta por trás de uma decisão tão radical num momento em que personalidades sem conteúdo e representatividade, vendem o corpo - e a alma - por quinze segundos de fama? No caso específico de Geraldo Vandré, um dos ícones do movimento musical contra a ditadura, razões adicionais se misturavam às teorias conspiratórias: (teria sido torturado e ficara neurótico, em consequência? Decepcionara-se com os rumos do país?).

Dias atrás eu assisti a um premiado filme-reportagem sobre a vida da cantora Amy Winehouse onde implode seu drama pessoal de incompatibilidade com a fama e o sucesso. O filme escorraça a visão mesquinha dos que só se permitem interpretá-la como uma jovem talentosa consumida pelas drogas, para revelar a face complexa - e etérea - do compromisso de alguém com a sua própria arte. Teria acontecido algo semelhante a Geraldo Vandré?

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O livro não responde, apenas insinua a insatisfação do artista com o rumo que as coisas tomaram. É pródigo em acumular as raras informações disponíveis no ambiente que o cercou após voltar ao Brasil, depois de exilado, mas a chave da solução permanece inacessível por ser Geraldo Vandré um ser inconclusivo, já que as poucas vezes em que fala nada esclarece. O fato é que, aparentemente, tão perturbado ficou com o mito de herói criado em torno de si que se converteu, até mesmo, em cantor da Aeronáutica, ao mesmo tempo em que passou a repudiar a suspeita de que havia sido torturado pelos militares.

Numa época em que cantores de talento equivalente ao seu e que assumiram a pecha de perseguidos da ditadura como Caetano Veloso e Chico Buarque colhem os louros desses méritos, em nome da ideologia/heroísmo praticados, causando por isso a decepção de alguns artistas ex-amigos como Millor Fernandes, causa espécie que o mais autêntico deles e, portanto, o mais legítimo, negue a potencial violência sofrida e em momento algum busque as vantagens que isso lhe acarretaria.

O livro chega em boa hora, especialmente para aqueles que, jovens como eu na época, o tiveram como ídolo, mas as dúvidas permanecem: “Por onde andará Geraldo Vandré? Por onde andarão os sonhos da juventude?”.

* Autor de “O entrevistador de lendas”

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