História de São Luís

Uma "Pequena Ilha" fincada no movimentado bairro São Francisco

Por causa da ausência de planejamento na formação da localidade, é possível ver carências em setores como saúde, educação e outros serviços

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h15
Apesar da vizinhança nobre, da Península da Ponta d’Areia, a Ilhinha ainda pena com a deficiência de serviços como educação e saúde
Apesar da vizinhança nobre, da Península da Ponta d’Areia, a Ilhinha ainda pena com a deficiência de serviços como educação e saúde

São Luís - A comunidade da Ilhinha representa uma parcela da população ludovicense que ainda sofre com problemas de ordem social. Por causa da ausência de planejamento na formação da localidade, é possível ver carências em setores como saúde (com a escassez na oferta de unidades próximas), educação (sem a disponibilidade de creches pela iniciativa pública) e outros serviços.

Mesmo com a promoção de projetos para minimizar a desigualdade entre a pobreza e o “luxo”, na vizinha Ponta d’Areia, a carência entre os ocupantes da Ilhinha ainda é notória. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2011 apontavam que 6,9 mil pessoas residiam na Ilhinha, o que colocava o aglomerado como um dos 10 com maior índice de moradores. Hoje, este número é seguramente maior.

Segundo os mais antigos, por apresentar no nascedouro as características de uma ilhota e parcialmente isenta da drenagem direta da maré e com concentração de superfície, a localidade passou a receber o nome de Ilhinha. Inclusive, ainda na década de 1970, as competições de futebol amador no São Francisco eram realizadas em um campo na região.

Sem representatividade plena, já que não há uma associação reconhecida no local para o atendimento dos anseios da população, a Ilhinha ainda depende de iniciativas do poder público e medidas privadas. Apesar da execução do projeto Promorar há alguns anos, que distribuiu casas na região, e implantação de ações mais recentes pelos governos estadual e federal, com a abertura de imóveis para famílias de baixa renda, em pleno século 21, ainda é possível avistar pessoas vivendo em palafitas na “pequena Ilha”.

A “pequena Ilha” dentro do São Francisco
Por sua origem, sem planejamento urbano, a área da Ilhinha é marcada por uma gente, em especial, simples e sincera. Estimava-se, com base em levantamentos de moradores e registros antigos, que, há alguns anos, o aglomerado – fincado no bairro São Francisco – registrava de 50 a 60 imóveis.

Porém, visualmente, é possível concluir que, diante do crescimento populacional e “inchaço”, além de projetos sociais de habitação, a Ilhinha apresenta mais do que este saldo.

De acordo com o trabalho acadêmico intitulado “Análise Toponímica de 81 Nomes de Bairros de São Luís”, de Heloísa Reis Curvelo Matos, o surgimento da povoação Ilhinha está intrinsecamente ligado ao aterro da Ponta d’Areia e ao represamento do que é conhecido atualmente como Lagoa da Jansen ou, denominado por alguns especialistas, de Igarapé da Jansen.

Antes da construção de vias e outros acessos, a área de maré que não era ocupada anteriormente por ocupações passou a receber pessoas humildes que fizeram espontaneamente seus imóveis e passaram a depender exclusivamente da extração de itens nas concentrações dos manguezais próximos para a subsistência.

Dali, surgiu, ainda de acordo com Curvelo Matos, uma “pequena Ilha”, no entorno do eixo de maré, que passou a ser denominado informalmente de “Ilhinha”. Posteriormente, entre as décadas de 1980 e 1990, a “Ilhinha” serviu prioritariamente como elemento de junção de pessoas que buscavam, em outra região da cidade, novos meios de sobrevivência.

Ainda segundo a pesquisa “Análise Toponímica de 81 nomes de Bairros de São Luís”, da sua origem à atualidade, a Ilhinha obteve poucas melhorias. O poder público tenta compensar qualquer forma de perda social com outros benefícios sociais.

No início da década de 1990, a Ilhinha passou a ser classificada “como Zona de Interesse Social”, pela Lei n° 3.252, que dispunha sobre a instituição do Plano Diretor de São Luís.

Segundo o documento, obtido por O Estado, o objetivo da inclusão do aglomerado na ordem do Plano era, conforme especifica o próprio Título I referente à função social da cidade, cumprir as condições para o desenvolvimento da produção, do comércio e serviços, para a plena realização dos direitos dos cidadãos.

Entregue à população em 2002, Avenida Ferreira Gullar foi criada principalmente para desafogar trânsito da área
Entregue à população em 2002, Avenida Ferreira Gullar foi criada principalmente para desafogar trânsito da área

A importante obra: a Avenida Ferreira Gullar
Outra via importante para a consolidação da Ilhinha como referência urbana foi a construção da Avenida Ferreira Gullar, que recebeu o nome de um dos grandes nomes da literatura nacional.

A obra foi entregue em 2002 e desenvolvida pela Gerência de Desenvolvimento Regional à época. Com 910 metros na ocasião, a via fora criada principalmente para desafogar o trânsito de veículos na cidade.

O valor esteve orçado em R$ 4,2 milhões e a avenida serviu como complemento para o anel viário dos bairros do Jaracati, além de Ilhinha, São Francisco e outros.

Recentemente, o governo estadual executou serviços de pavimentação na via. De acordo com informações da gestão pública, os serviços de quatro quilômetros foram executados.

Anteriormente, a então governadora do Estado, Roseana Sarney, destacou benefícios que seriam posteriormente viabilizados aos maranhenses, com investimentos oriundos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) 2 Mobilidade Urbana.

Onde está a solidariedade...
Além de gente sofrida e que luta diariamente por melhores condições de vida, a Ilhinha apresenta casos bem-sucedidos de solidariedade. Um sentimento de ajuda que prospera internamente entre os “ilhinenses” e entre pessoas de outros bairros.

Uma destas iniciativas foi o Clube das Mães Tereza Murad. Fundada no dia 3 de novembro de 1985, inicialmente no bairro Ponta do Farol, após várias iniciativas de atos de assistência aos moradores da região, a entidade foi pensada para reivindicar e lutar pelo desenvolvimento básico da comunidade tais como água, luz, escola entre outros benefícios que a comunidade necessitava.

Desde então, foi criada uma creche-escola que atualmente atende mais de 40 famílias, prestando serviços na área social, educacional, nutricional e recreativa. Mesmo com a pandemia, os serviços da instituição foram mantidos, mediante as regras sanitárias. O projeto Gratitude, do Grupo Mirante, realiza periodicamente ações de solidariedade para a ajuda da creche.

E o cenário atual?
Atualmente, a Ilhinha expande-se e, além de moradias – feitas a partir da iniciativa dos moradores e resultados de benefícios sociais, a localidade também registra concentração de estabelecimentos de diversos gêneros. São supermercados, mercearias, lojas com materiais de construção, de planejamento e elaboração de móveis e oficinas para manutenção de veículos, além de praças, campos de futebol e outros espaços para entretenimento.

Além disso, à noite, a Ilhinha costuma ter estabelecimentos como bares e churrascarias com bom movimento. Como todo bairro intitulado “da periferia”, muitos ainda relacionam a Ilhinha apenas pelo viés da violência urbana.

Mesmo com ocorrências registradas no sistema da Secretaria de Segurança Pública (SSP), moradores que se fixaram na Ilhinha desejam permanecer no lugar. “Eu sou feliz morando por aqui, gosto daqui, aqui fixei minha família e onde quero ficar”, afirmou o carroceiro Paulo César Penha, de 55 anos.

O auxiliar de Serviços Gerais, Antônio José Martins, de 57 anos, admite preocupação com a segurança. Porém, para ele, é uma questão que atinge outros locais e que não se restringe à Ilhinha. “Tem tanto lugar mais chique que tem problema. Então aqui tem, mas dá pra viver numa boa”, afirmou.

Testemunha do começo da Ilhinha
Se a memória da Ilhinha é representada basicamente pela lembrança única das pessoas de moradores e ex-moradores, devido à ausência de referências bibliográficas mais específicas acerca do lugar, O Estado decidiu personificar o legado da Ilhinha na imagem da aposentada Maria dos Santos França, de 97 anos.

Ela foi uma das primeiras pessoas a chegar na localidade, há mais de quatro décadas. E se recordou sobre como era caracterizado o espaço. “Quando eu cheguei na região da Ilhinha, não tinha nada. Era somente mangue e maré. Agora aqui tem muita casa, tem a avenida bonita, bem diferente. Mas, eu continuo simples do mesmo jeito e daqui não saio”, disse.

Atualmente, a aposentada reside em um pequeno imóvel nos fundos da residência de um dos filhos. Segundo ela, a casa foi feita com palha e acabamento simples. “Era feita quase que de bairro, aqui a gente tinha pouca condição de chegar e ficamos. E ver todo mundo chegando aqui pra manter as coisas que tem, comércio e as casas, dá mais alegria ainda de permanecer”, disse.

Sobre se mudar para outro local, a aposentada é categórica. “Nem pensar. Vou morrer e passar meus últimos dias morando aqui. O pessoal diz que é violento, mas comigo aqui nunca aconteceu nada”, disse.

SAIBA MAIS

Nos últimos meses, como forma de compensação social, obras do Executivo estadual viabilizaram a entrega de duas praças na Ilhinha e adjacências integralmente revitalizadas em abril do ano passado. Os serviços, conforme informação oficial do governo estadual, fazem parte do projeto PAC Ponta do São Francisco.

Além da entrega de novos espaços públicos, a intervenção englobou um conjunto de outras melhorias, de acordo com o Executivo, como intervenções na rede de esgoto e drenagem pluvial. Segundo o governo maranhense, foram aplicações na ordem de R$ 7,6 milhões. Ainda de acordo com o Estado, as indicadas melhorias beneficiaram 256 famílias que conviviam “em situação de vulnerabilidade”.

Atualmente, além de recuperação asfáltica da via, a avenida Ferreira Gullar que corta a Ilhinha sofreu modificações no sistema de iluminação pública, com a substituição de lâmpadas mais antigas por luminárias de LED.

De acordo com a Prefeitura de São Luís, responsável pelos serviços, 196 pontos de iluminação foram trocados somente na Avenida Ferreira Gullar.

Áreas consideradas como aglomerados

  • Ilhinha
  • Portelinha
  • Janaína
  • Sá Viana
  • Vila Isabel Cafeteira
  • São Francisco
  • Camboa
  • Mangue Seco
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

Números

  • 6,9 mil pessoas residiriam na Ilhinha
  • 910 metros era a extensão da Avenida Ferreira Gullar na inauguração
  • 1970 foi o ano de início da expansão da cidade de São Luís que possibilitou o surgimento da Ilhinha
Fonte: Governo do Maranhão e IBGE

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