Pesquisa

A moda e a cidade

Pesquisadora analisa como a moda trouxe reflexo das transformações da cidade

Bruna Castelo Branco/ Da equipe de O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h15
A pesquisadora Jéssica Sampaio
A pesquisadora Jéssica Sampaio (Jéssica sampaio)

São Luís - A moda é uma forma de expressão. Por meio dela, conseguimos expressar nosso estado de espírito, nossas preferências artísticas, os grupos que nos identificamos. É também uma forma de registro histórico.

Já imaginou pensar as transformações de uma cidade e do comportamento de seus moradores analisando a moda como expressão? Essa foi a motivação da pesquisadora Jéssica Sampaio, mestra em História ao desenvolver a pesquisa “Silhuetas da História: moda, gênero e transformações sociais em São Luís (1920 – 1950)” e o livro paradidático “Modos e Modas na Cidade de São Luís”.

A ideia apresenta como a moda pode traduzir questões de gênero, representações do cotidiano, comportamentos sociais, distinções de classe. No início do século XX, as modernizações na economia interferiam diretamente nas questões da vida privada e de como as pessoas se apresentavam na sociedade. Por causa disso, a pesquisa é focada no período de 1920 a 1950.

Segundo a pesquisadora, em relação a São Luís, essas mudanças por meio da moda que já estavam ocorrendo no século XX, evidenciaram mais a partir do século XX. “Em São Luís, há um envolvimento com a moda desde o século XIX, mas foi somente no início do século XX que as transformações ficaram mais evidentes. Mesmo com problemas de infraestrutura, calçamento das ruas, fornecimento de energia elétrica e higiene, a cidade tentava acompanhar novidades e costumes de locais como Rio de Janeiro e São Paulo, que se espelhavam nas noções de progresso dos europeus e americanos”, pontua Jéssica Sampaio.

A pesquisadora ressalta que a moda permite que o corpo assuma um significado social e o contato com o mundo externo através de símbolos de ostentação, comportamentos e mentalidades e as roupas femininas foram as que mais sofreram mudanças.

No período analisado, enquanto os homens continuaram a vestir-se com tons sóbrios e tecidos mais adaptáveis ao clima, a silhueta feminina passou por muitas mudanças. A robustez dos corpos do século XIX perderam espaço para uma nova idealização de um corpo magro. “Apesar de a cintura ser marcada no século XIX, não evidenciava o corpo de forma excessiva por escondê-lo por baixo dos tecidos, cobria colo, pernas, braços e pescoço. No entanto, em 1920, perde a volumosidade dos tecidos pesados e os modelos que cobriam o corpo em grande parte, dão espaço aos tecidos com transparências e decotes. Com as modificações no vestuário, houve um novo processo ‘ideal de corpo’ feminino, que diferente do século anterior, era esbelto, magro e moldava a silhueta para adaptar as mulheres de elite às novas demandas exigidas pela vida urbana”, destaca a pesquisadora que pontua que as roupas femininas passaram a mostrar mais o corpo, com tecidos mais leves e com vestidos e saias acima do joelho.

Além das mudanças no vestir, o guarda-roupa da mulher também ganhou outros itens de belezas como brincos, bolsas, pulseiras, batons e cremes que “estavam na moda”. Os cabelos curtos, simbolizando praticidade e naturalidade também fizeram a cabeça das ludovicenses.

Gênero

Segundo a pesquisadora, esse novo comportamento já traziam mudanças em relação ao comportamento do século anterior, cuja vaidade e beleza não eram considerados prioritários. No século XIX, os homens assumiam a vida pública e as mulheres dedicavam-se ao casamento, ao lar e a cuidar dos filhos. Em suas aparições públicas, era de bom tom exibir um corpo robusto, com joias e adornos, além de vestidos em tecidos estruturados para demostrar prestígio. Nesta época, as mulheres da elite preparavam-se para ser boas esposas e precisavam ter um bom dote para ser oferecido ao marido como forma de garantir sua sobrevivência sob a tutela de um novo homem, enquanto os homens eram incentivados à liderança, movimentação de ações políticas e econômicas.

“Se no século XIX as mulheres precisavam do dote para garantir sua sobrevivência e conseguir um casamento, no século XX esse dote de caráter financeiro se configura como um novo dote, o da aparência, que surgiu quando as alterações levaram as novidades estéticas e culturais ao cotidiano, espaço em que a beleza era capaz de alcançar o propósito feminino, o casamento”, assinala a pesquisadora.

Essas mudanças nos trajes e no comportamento feminino, geraram resistência. Jornais da época publicavam reportagens e manuais de comportamento sobre os abusos da moda, alertando que esses “avanços” poderiam comprometer a ordem e a organização da sociedade. Segundo os jornais, as mulheres deveriam se manter belas, prezando pela moralidade e sem se afastar dos cuidados com o lar, pois a independência feminina era considera um perigo para as relações sociais da época.


Status

Os trajes utilizados também demarcam o pertencimento em grupos sociais. “Os passeios nas ruas, as festas, reuniões, todas as referências ao que poderia ser notado pela classe burguesa e camadas médias, com o intuito de manter vivo o refinamento e assumir a posição de distanciar as classes por meio de símbolos e padrões, que desfazem qualquer semelhança entre os segmentos sociais, preenchendo critérios de distinção e liderança. A moda em função das classes dominantes seduz os que disseminam novos comportamentos e consumos, influenciando o indivíduo a adotar uma identificação social baseada na sua relação com o grupo” conta.

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