Os 409 anos da capital

Beleza antiga e moderna: São Luís vista do Bonfim

Dando outro olhar da cidade, às vésperas de comemorar seus 409 anos de história, O Estado contempla seus leitores com a beleza de um dos lugares menos explorados

Thiago Bastos / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h15
Da obra no Bonfim à vista de São Luís
Da obra no Bonfim à vista de São Luís

São Luís - São Luís completa, no dia 8 deste mês, 409 anos de história - conforme cita a historiografia oficial. Além de se apregoar, com razão, a origem de formação do nosso povo, é comum valorizar as belezas que somente as terras ludovicenses registram.

São casarões, ruas, alamedas, costumes, pratos típicos e outras características que fazem dessa gente única no mundo. Que tornou, por exemplo, a cidade conhecida em todo o planeta por abrigar um acervo arquitetônico que fez da capital maranhense um patrimônio de todos, com reconhecimento da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

São várias as teses de formação da cidade, passando pela defesa lusa ou a tradicional descoberta a partir da missão francesa, teoria esta última rechaçada por alguns historiadores.

Independentemente da crença na origem, diferentes facetas - cultura, história e características dos moradores - tornam a cidade de São Luís um lugar apaixonante de se viver. Quem nasceu e reside até hoje não tem vontade de se mudar.
Um dos motivos é a capacidade de descobrir novos ou lugares pouco explorados em seu território. O Estado parabeniza a cidade nesta data, sob outro ângulo, e se debruça por meio de um olhar alternativo ludovicense. Observar São Luís de uma perspectiva pouco determinada.

Como é a cidade a partir do Bonfim?
Saindo do eixo central da cidade e seguindo em deslocamento via Avenida dos Portugueses até o emblemático bairro do Anjo da Guarda, é viável atravessar o também bairro Vila Nova para chegar a um ponto considerado paradisíaco e urbano.
A Praia do Bonfim, com uma curta faixa de areia e entorno de manguezais, representa talvez o encontro perfeito e ainda relativamente inacessível, considerando a baixa procura, da natureza com a origem da cidade.

No século XVI, segundo algumas teses, a primeira faixa de terra vista pelos tais descobridores teria sido justamente a praia. Alguns moradores da região, diante de contos de seus antepassados e pesquisas, citam a Vila de Nazaré como ponto de nascedouro e formada nesta orla.

Se a tese é legítima ou não, o certo é que a formação natural registrada propiciou, séculos depois, o uso por poucos moradores das terras pelo Bonfim, que teria esse nome - dizem alguns - devido ao Nosso Senhor do Bonfim, marcante em determinadas manifestações católicas e afro.

Com o nome de Praia do Bonfim, a capital possui um oásis que está prestes a passar por processo de revitalização, com o objetivo de atrair mais visitantes. As obras são tocadas pelo Governo do Maranhão e estão orçadas na casa dos quase 7 milhões de reais.

O Estado decidiu conhecer um pouco mais as belezas e curiosidades deste paraíso, que propicia uma perspectiva da São Luís antiga para poucos.

A Praia do Bonfim e suas características
A Ponta do Bonfim, representada por essa visão menos comum da cidade antiga de São Luís, registra em sua história uma referência à biografia da trajetória epidemiológica da cidade. Foi a partir daí que se registrou, em meados da década de 1930, o início das obras da Colônia do Bonfim, responsável por abrigar os hansenianos.

Era um período de descontrole, conforme apontavam profissionais de saúde à época, do tratamento a este público. A princípio estas pessoas eram colocadas em ponto específico onde atualmente se localiza o Cemitério do Gavião, na Madre Deus. Posteriormente, e para caracterizar o processo de isolamento deste público, visto até então de forma extremamente pejorativa, pensou-se na inclusão de um abrigo na Ponta do Bonfim para o recebimento destas pessoas.

O marco para as obras, de acordo com pesquisa de O Estado, ocorreu em 1932. Um dos mentores dos trabalhos foi Achiles Lisboa. De acordo com publicações da época, seria uma construção para o preenchimento do que as autoridades, à época, chamavam de “moderna profilaxia”, voltada neste caso para o combate à doença.

A obra significaria, na prática, exclusão oficial e potencialmente reconhecida pelo poder público já que, no século XVIII, a região era conhecida por abrigar um espaço de reclusão das pessoas que registravam, por exemplo, a varíola - outra doença cujos surtos em períodos específicos da humanidade assolaram parte da população local. Além de servir para conter os doentes de varíola, o local também recebeu corpos de ingleses que, por aqui vinham em busca de terras.
Sempre o Bonfim com sua colônia foi caracterizado por ser um espaço “bem afastado”, tornando-se ideal para o “isolamento” - neste caso, de pessoas com hanseníase. A política de saúde era estimular a retirada destas pessoas do convívio das outras, em aparente controle sanitário.

Voltando à Achiles Lisboa, o mesmo se destacou em Medicina e Farmácia, campos do conhecimento voltados para a contenção de enfermidades. Ele tornou-se um colaborador das obras da Colônia, que se arrastaram até 1937.
A inauguração do espaço para o recebimento dos hansenianos, de acordo com o importante trabalho científico intitulado de “A hanseníase no Maranhão na década de 1930: rumo à Colônia do Bonfim” teria ocorrido em 8 de outubro de 1937, sob articulação do Ministério da Educação e Saúde. Durante o ato solene, ainda de acordo coma peça acadêmica, o então diretor do Departamento Nacional de Saúde, Barros Barreto, emitiu discurso.

O gestor apontava que – antes das iniciativas do governo de Getúlio Vargas, o governo apresentava deficiência na área da saúde pública, em especial em relação à hanseníase. No entorno da Colônia, segundo historiadores, foram formados grupos de moradia que registravam uma espécie de vilarejo com pelo menos 72 casas.

Ali, a comunidade hanseniana se estabelecia e, onde atualmente existem bairros como o Vila Nova e Anjo da Guarda, por exemplo, não eram registradas moradias. Posteriormente, conforme defendem pessoas que residem em ambas as localidades, famílias originárias dos próprios leprosos que não eram aceitos - quando recebiam licença médica para saírem da Colônia, passaram a se estabelecer “do outro lado” da Barragem, numa espécie de abrigo social.
O bairro do Vila Nova, inclusive, comemorará 50 anos de fundação em agosto de 2022 e as comemorações devem começar em breve em um dos bairros mais populosos do eixo Itaqui-Bacanga.

Na praia, a natureza dá o alimento, basta ir buscar
Na praia, a natureza dá o alimento, basta ir buscar

A praia dos antigos e do sustento de muita gente…
Da vista privilegiada do antigo e moderno da capital, já que do outro lado a partir do Bonfim são avistados bairros como São Francisco, Renascença, além da parte histórica da cidade, moradores da região tiram o seu sustento a partir da confluência das águas.

Peixes como tainha e sardinha, dependendo da maré, são retirados nas primeiras horas do dia e ao entardecer, para o sustento dos dias. Pescador há mais de três décadas, nascido e criado na região do Vila Nova, seu Ivan Souza é a prova de que a cidade é muito mais do que o acervo arquitetônico, ou história de fundação ou o seu processo de desenvolvimento.

Ela é formada por uma gente simples, de caráter forte e reconhecidamente honesto e que depende da natureza para comer.
Após uma boa pescaria sob as águas e na faixa de areia da Praia do Bonfim, o pescador mostra - após tirar o sustento da rede de pesca oriunda do pai dele – também pescador – os pouco mais de cinco quilos de peixe retirados.

O pescador aponta que, no momento, a maré traz bons cardumes. “Está em época de boa maré. Então graças a Deus está dando para levar um bom sustento para o feriado”, disse. Seu Ivan mora com esposa e um filho às margens da praia do Bonfim.

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