Artigo

Lágrimas na madrugada

Antonio Carlos Lima *

Atualizada em 11/10/2022 às 12h15

Muita gente não conseguiu conter as lágrimas no instante em que Rayssa, essa menina de quem o mundo inteiro agora fala, subiu ao pódio para receber, na madrugada de segunda-feira, a Medalha de Prata por sua performance histórica nas Olimpíadas do Japão.

Eu mesmo mergulhei sutilmente no cobertor, para que minha mulher, incapaz de articular uma palavra sem engasgar-se de emoção, não percebesse que eu também enxugava o rosto molhado na hora em que Rayssa beijou e ergueu o troféu e recebeu a corbeille reservada aos campeões.

Você, que também ficou de vigília para testemunhar aquele momento único, marco de uma vitória pessoal arrebatadora, deve ter experimentado a mesma emoção.

Não somente porque ali estivesse uma linda menininha de treze anos, cabelos cacheados, aparelho nos dentes e um sorriso mágico no rosto. Ou porque se tratasse de uma brasileira do pobre e espoliado Norte do Brasil. Nem, unicamente, em nosso caso, porque naquele pódio estivesse uma conterrânea, maranhense, de Imperatriz, consagrada como segunda melhor atleta do mundo nessa nova modalidade de esporte.

Era por causa de tudo isso, mas também em razão do carisma de Rayssa, de sua alegria e descontração permanentes, de sua inocência, de seus passinhos de fada, agora fadinha do mundo, com seu pó de pirlimpimpim espargindo alegria e felicidade desde a casa humilde em que vive em Imperatriz até os confins mais remotos da Terra.

Eu, que nem sou fã de skate e nem aprecio os esportes radicais, assisti há cinco anos ao videoclipe que tornou Jhulia Rayssa Mendes Leal conhecida e deu novo rumo à sua vida. Ela, vestida de fadinha, já impressionando a todos por sua habilidade com um esporte pouco praticado no seu meio.

Desde então, falávamos aqui em casa: essa menina tem um grande futuro! Mas, sinceramente, não tínhamos grandes esperanças, melhor dizendo, certezas, de que chegasse a tanto. Haveria, no Japão, Estados Unidos, Filipinas, atletas mais preparados tecnicamente do que ela...

Ela, no entanto, já acreditava, aos oito anos, que algo grande estava reservado para ela. Antes mesmo de ser selecionada, tatuou no braço o símbolo das Olimpíadas, por saber que ali estava o seu destino. Ela tinha um sonho. E tornou esse sonho realidade.

A vida de Rayssa, que o mundo inteiro agora conhece e admira, só não é exatamente um conto de fadas, desses que povoam a literatura infantil e habitam a imaginação das crianças, porque, para alcançar o seu triunfo, não houve mágica nem varinha de condão. Ela venceu pelo talento, aliado à determinação de estudar, treinar, superar-se.

Como se isso não bastasse, depois da vitória ela ainda deu a todos nós uma lição de grandeza, humildade e responsabilidade, ao desaconselhar recepções festivas em sua cidade por considerá-las inadequadas para um momento que ainda exige cuidados rigorosos em relação a uma pandemia que já ceifou a vida de mais de meio milhão de brasileiros. Fiquem em casa, foi o presente que ela pediu ao povo de sua terra. Grande Rayssa, fadinha de Imperatriz, do Brasil e mundo!

Quem ficou acordado na madrugada de segunda-feira sabe, por isso, o quanto foi emocionante a vitória dessa fada que um dia apareceu nos chãos e nos céus de Imperatriz para brilhar no Japão, palco do mundo, e nos fazer acreditar na capacidade humana de transformar sonhos, por maiores que sejam, em realidade.

Essa a razão das lágrimas que muitos, inclusive a própria Rayssa e eu, não conseguiram conter na madrugada inesquecível de segunda-feira.

* Jornalista e escritor. Membro da Academia Maranhense de Letras. Email: antoniocglima@uol.com.br

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