Artigo

Existe fada no Maranhão

Natalino Salgado Filho *

Atualizada em 11/10/2022 às 12h15

Rayssa Leal seria apenas mais uma típica menina de treze anos com seus indefectíveis aparelhos nos dentes e cabelos esvoaçantes. Debutante, lida com os primeiros dilemas nesta importante fase de transição da existência, pela qual todos os adolescentes passam. Mas ela acaba de ganhar uma medalha olímpica, que lhe confere o mérito de ver o seu nome inscrito na história do esporte brasileiro e do mundo. A história ganha contornos ainda mais especiais, principalmente para nós: Rayssa Leal é uma maranhense de Imperatriz.

Basta uma rápida pesquisa na internet e eis que nos deparamos com uma reportagem que, há apenas seis anos, projetou Rayssa, via mídia, para o Brasil. Naquela reportagem, aos sete anos, olhar vivaz e rosto concentrado, vestida de fada, a menina tentava realizar uma manobra em uma calçada de sua cidade e saltar um desnível, enquanto girava o skate no ar e caía sobre ele. Algumas tentativas e, voilá, ela conseguiu. A manobra da fadinha chama-se heelflipe, uma das mais difíceis de fazer.

O vídeo viralizou e um dos maiores astros do skate mundial, Tony Hawk, retuitou o vídeo. É como se o Pelé elogiasse um garoto magrinho por seus dribles filmados em um campinho de chão batido, perdido em algum lugar inóspito do Brasil. Aquela vestimenta de fada deu-lhe o carinhoso apelido de “fadinha do skate”. Com aquelas frágeis asas, mas firmemente ancoradas no talento e no dom que mal despontava no não tão longe 2015, aquela menina de olhar esperto voou e nos deu uma grande alegria.

O que mais me impressionou no conteúdo do vídeo de Rayssa, além de sua manobra ter dado certo, foram os tombos que antecederam ao espetáculo imprevisível que ela proporcionou ao Brasil e ao mundo. De três tentativas, foram dois tombos. Ela simplesmente levantou e tentou de novo. Isso me faz pensar que o talento é um tipo de presente com que nascemos, mas que, para descobri-lo e lapidá-lo, é preciso muitos tombos. Depois, cada vez mais habilidade e, então, uma medalha.

Podemos até nos indagar: o que fez essa menina ir tão longe, além do óbvio talento que normalmente teria? Ela teve oportunidades, incentivo e uma família que a apoiou e cuidou dela, dando-lhe a sustentação emocional para lidar com o sucesso, a exposição e o destaque. Família é e sempre será nossa base, nossa plataforma de lançamento e porto seguro para onde poderemos voltar sempre. Bem-aventurados aqueles que têm boas famílias como seus ancoradouros. E não me refiro à capacidade financeira, mas a princípios universais que a todos nós regem.

Rayssa agora é uma celebridade mundial condecorada. Garotos e garotas podem olhar para ela e tê-la como referencial de persistência, determinação e ousadia. O esporte que ela abraçou será mais disseminado, valorizado e atrairá outros que, com certeza, estarão distantes dos peculiares (des)caminhos, não raro promíscuos, que sonhos, que são próprios dessas quadras da vida. atormentam a infância e a juventude e roubam.

Como professor, sou ferrenho defensor da educação, o caminho que conduz ao céu da realização pessoal. Sou também ardoroso entusiasta do esporte, capaz de diferenciar aqueles que um dia inscreveram seus nomes num dia de glória que será lembrado pela história da humanidade. Sou uma voz maranhense que agradece pelo sorriso que precisamos para sobrevoar estes dias pandêmicos, sem asas coladas com cera, certos de que a realidade é capaz de superar os limites do mito de Ícaro.

* Médico Nefrologista, Reitor da UFMA, Titular da Academia Nacional de Medicina, Academia de Letras do MA e da Academia Maranhense de Medicina

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