O Êxodo dos Tupinambás para Ilha do Maranhão

Euges Lima*

Atualizada em 11/10/2022 às 12h18
(ilustração)

Com o estabelecimento do sistema capitanias hereditárias no Brasil, a capitania do Maranhão ficou dividia em dois lotes. O primeiro, doado a João de Barros, feitor da Cada das Índias. O segundo, doado a Fernão Álvares de Andrade, tesoureiro-mor do Reino. Esses donatários, impossibilitados de ausentarem-se de Portugal, pois eram funcionários do estado, associaram-se ao capitão Aires da Cunha e organizaram a primeira expedição para colonizar a capitania do Maranhão.

Partiram do Tejo em outubro de 1535, sob o comando de Aires da Cunha em frota constituída por dez navios, novecentos homens e cento e treze cavalos, considerada uma das maiores expedições organizadas até então. Porém, já próximo de atingirem as terras do Maranhão, naufragaram nas traiçoeiras águas do canal do Boqueirão, determinando assim, o fracasso da expedição.

Os sobreviventes desse naufrágio recolheram-se até uma ilha, cuja identificação até hoje é motivo de controvérsias. Para alguns historiadores, seria a ilha do Medo, já para outros, ilha das Vacas, Santana ou mesmo São Luís, onde fundaram a povoação de Nossa Senhora de Nazaré, que não obteve sucesso, durando até 1538.

Dos portugueses que a habitavam, alguns conseguiram retornar para Portugal em navios piratas, outros se passaram para o continente. Aires da Cunha não retornou mais para Portugal, supõe-se que tenha morrido no naufrágio ou em combate com os silvícolas. Diante do malogro da expedição e desgostoso pela perda de dois filhos que também estavam na expedição, João de Barros abandonou a Capitania.
Relatos dos náufragos sobreviventes dessa expedição levam a crer que o Maranhão era habitado, naquele tempo, por “gentio tapuia”, índios de língua e cultura não tupi, que se mostravam hostis às intenções dos sobreviventes.

Dezenove anos após a fracassada tentativa do Aires da Cunha de tentar colonizar o Maranhão, outra tentativa também por mar ocorrera – a de Luís de Melo e Silva – filho do Alcaide-mor de Elvas, que solicitou a doação da abandonada donataria e conseguindo permissão para explorá-la, partiu de Lisboa em 1554, com três navios e doze caravelas. Mais uma vez os portugueses iram chegar à inexplorada capitania do Maranhão, entretanto, a expedição de Luís de Melo não teve fim diferente da primeira, naufragando nas proximidades do litoral maranhense, mas ao contrário de Aires da Cunha, conseguiu salvar-se e retornar para Portugal.

Após esse período, possivelmente a partir da década de 1560, os índios Tapuias foram forçados a sair da Ilha do Maranhão por um enorme contingente de aguerridos Tupinambás, vindos da costa leste.
À proporção que transcorria o século XVI, agravava-se a situação dos Tupinambás, aliados históricos dos franceses. Relatos de índios sobreviventes indicam que estes empreenderam uma grande migração, fugindo dos colonizadores portugueses que avançavam sobre suas terras no recôncavo baiano, em Sergipe e Pernambuco.

Segundo Claude d’Abbeville, autor de “História das Missões dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranhão (1614)” os Tupinambás do Maranhão seriam originários de uma região situada próxima ao Trópico de Capricórnio, numa terra chamada de Caieté, que significa “Floresta Grande”, devido haver inúmeras árvores de grande porte.

Para não se sujeitarem ao jugo português que haviam se apoderado do lugar, preferiram abandonar suas terras, embrenhando-se floresta adentro. “Não se julgando seguros, visto seus inimigos persegui-los por todas as apartes e por todos os meios até a morte, (ABBEVILLE, 2002)” atravessaram desertos e campos até chegarem próximo da linha equinocial.

Seguiram alguns para a Ilha Grande do Maranhão, jugando-se lugar forte e
Seguro, feito assim por Deus desde o princípio do mundo para livrá-los da
Perseguição de seus inimigos [...]. Tiveram estes o nome de Maranhã euguare, ‘habitantes do Maranhão (ABBEVILLE, 2002).

Embora a leva dos Tupinambás vindo de regiões como o Rio Francisco, Pernambuco e Paraíba em direção ao norte do Brasil pode ser considerada como resultado da fuga desses povos da perseguição empreendida pela colonização portuguesa há outra explicação, de cunho religioso, como sendo as migrações motivadas pela busca de uma “Terra sem Mal”, fator central da escatologia mística desses povos.

A ideia de migração para uma região livre de qualquer mal estava presente na religiosidade dos Tupinambás. Os próprios líderes religiosos, os chamados pajé-guaçu, que além da função de se comunicarem com os espíritos, tinham também a função de estimular e guiar o povo Tupinambá em suas migrações em busca desse possível “paraíso terrestre”. Nesse sentido, os Tupinambás não apenas estavam fugindo das invasões e escravidão promovidas pelos perós (portugueses) naquela região, mas também à procura de uma salvação físico-espiritual.

Professor, historiador e vice-presidente do IHGM / eugeslima@gmail.com

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